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LUÍSA MEIRELES
REDATORA PRINCIPAL
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Rússia, Europa... e a vocação mercurial de Portugal
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Ainda não tinha ouvido colocar as questões assim, mas registei. Portugal tem uma vocação mercurial, evocando Mercúrio, o Deus romano da comunicação. Será pois essa a nossa vocação, a de fazer pontes e promover o diálogo com todos. E para já, o Governo não tenciona sair dessa posição. Para já, repito.
Foi assim que ontem, na SIC, o ministro dos Negócios Estrangeiros falou sobre a crise russa e numa larvar crise portuguesa à sua sombra. Até ontem à noite, 160 diplomatas russos já tinham sido expulsos de 26 países em todo o mundo, mas não de Portugal, que chamou o seu embaixador em Moscovo. Em linguagem diplomática quer dizer suspender relações e um ato de desagrado. Quanto a expulsões, logo se verá.
“Isto é um processo dinâmico”, sublinhou Santos Silva, não sem sublinhar que quem tem de dar explicações é a Rússia e assumir responsabilidades. “É a primeira vez que depois da guerra fria se utilizam armas químicas em solo europeu”, ainda destacou, não fossem achar que no meio disto tudo Portugal está no lado errado da História, para onde já o remetem alguns membros da oposição. É o caso do eurodeputado Paulo Rangel, que encontra a razão para a “estranha ambiguidade” da posição do governo português “numa explicação pequenina – as cedências aos parceiros do PCP e do Bloco de Esquerda”, afirmou na SIC. Não poupou nas críticas.
É certo que o Governo é de maioria de esquerda, mas afinando o ponto, ela parece ter pouco a ver com a maneira como o governo está a lidar com a crise russa – a maior, recorde-se, desde os tempos da guerra fria e da guerra fria, se tivermos em conta que nunca houve uma expulsão de diplomatas desta dimensão. Quanto à relação de forças aqui no retângulo, o PCP dificilmente se identifica hoje com a Rússia de Putin, que se bandeou para o apoio à extrema-direita e, que se saiba, o Bloco de Esquerda está longe de ser poder ser acusado de pró-russo. E o PS, em si, desde quando o é?
Antigos ministros advertem que Portugal não pode “singularizar-se” (Martins da Cruz), fazedores de opinião como Teresa de Sousa (Público) alertam para que “prevenir é melhor que remediar”, enquanto José Manuel Fernandes maldiz a geringonça e Miguel Sousa Tavares acha bem a decisão portuguesa: “faltam provas”. Rui Tavares é perentório, ao responder à sua própria pergunta: Pode um progressista defender Putin? A resposta é: Não!
Reflexões, pois, sobre uma crise que se teme cresça ainda mais, ela tem tudo para acontecer uma escalada. Porque a pergunta é: depois disto vem o quê? Uma guerra? Santos Silva disse que o diálogo entre aliados e parceiros da União Europeia e da NATO tem sido intenso e hoje vai ser outro desses dias. É para hoje que a Rússia prometeu uma resposta retaliatória e, em função disso, aguardam-se novas medidas. O ministro recusou pôr Portugal à margem, esteve de acordo com a UE na medida “coletiva” de chamar o representante desta em Moscovo, participou na decisão da NATO de expulsar sete diplomatas mas quanto à política externa, é o governo que responde por ela, sublinhou. Nada está posto de parte. Imaginam-se as pressões. Lisboa quer ser prudente e não quer alinhar acriticamente. A posição de Santos Silva é acompanhada pelo Bloco, perante o silêncio do PCP, mas não tem dúvidas que o processo está longe do fim.
O pretexto – ou a gota de água da atual crise – foi a alegada tentativa de envenenamento do antigo espião Skripal e da sua filha em Salisbury com uma substância tóxica (A-234), de origem russa. Moscovo nega, mas não há ilusões: nunca se saberá o que se passou ao certo, apenas suposições, por muito fortes que sejam. É o mundo opaco da guerra de espiões, dos interesses militares e da guerra económica. Não tenhamos dúvida de que é disso que se trata lá no alto, bem acima das nossas cabeças. E não nos esqueçamos dos EUA, nem de Trump.
O Presidente da República foi cauteloso e parco.Considerou que o sinal de chamada do embaixador é uma “decisão forte” e um “aviso claro” da parte do Estado português. Hoje mesmo, na Assembleia da República, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus vai responder daqui a pouco pelo assunto na Comissão de Assuntos Europeus. O lado oficial do PSD quer primeiro ouvir as explicações para depois reagir. |
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OUTRAS NOTICIAS
Algumas delas foram dadas por António Costa à Visão, que publica hoje uma entrevista com o primeiro-ministro. Vindo de quem vem, o título (“O Bloco Central empobrece a democracia”) não é exatamente uma novidade, mas lá dentro há outras coisas interessantes – helas! Vai ter que a comprar, caro leitor, se estiver interessado. Não estou aqui propriamente a vendê-la, mas anoto. Sobre incêndios: “Demitir-me, se houver mais? Quando há um problema, a solução não é demitirmo-nos, é estarmos prontos para resolver o problema”. Rui Rio: “está manifestamente a incomodar grande parte do PSD e da chamada direita inorgânica”. Recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa? "Para já, para já, é preciso saber se é candidato". Regionalização? “Não é uma palavra desta legislatura”. Eutanásia? “O meu arreigado otimismo coloca-me dificuldades em aceitar a sua prática como uma boa solução”. Angola? “No seu lugar, talvez fizéssemos o mesmo”, e etc., etc. Fica a dica.
Espanto mesmo é a notícia que, depois do défice-mais-baixo-da-história-da-democracia-que-afinal-não era, as contas públicas afinal acusaram um excedente de 258 milhões de euros em fevereiro. As receitas subiram 4,7%, as despesas só 2,8%. Mas as dívidas em atraso do Estado registaram um novo agravamento ao atingirem os 1.188 milhões de euros no final de janeiro. A culpa? Da Saúde, embora o ritmo de crescimento esteja a abrandar. Já houve mais dinheiro para pagar as dívidas do setor(algumas).
Outra nota económica e alarmante: Novo Banco poderá ter de devolver fundos ao Fundo de Resolução. OS prejuízos que vai apresentar hoje publicamente são historicamente negativos! Fala-se em que o Fundo poderá ter de injetar 3,89 mil milhões de euros!!! Está no Negócios. E também: Banco de Portugal obriga a reforço de capital do Montepio. A Assembleia Geral da mutualista está marcada para hoje. Deve aprovar as contas. Pormenor: as ajudas à banca já custaram 17 mil milhões aos contribuintes.
Uma semana depois da publicação do segundo relatório da Comissão Independente sobre os incêndios de Outubro, o assunto está longe de estar esgotado. Diz o Público que o Governo ainda não tem levantamento das falhas do SIRESP, o PSD quer mais explicações. E falham metas para instalar câmaras nas florestas - Arrábida e serra da Estrela não vão ter videovigilância (está no JN, mas não é aberto ao leitor que navega nos sites sem pagar)
Paridade. CDS não cumpre na lista às europeias. A líder Assunção Cristas anunciou dois homens como cabeça de lista (Nuno Melo e Pedro Mota Soares), deveria ter apresentado pelo menos uma mulher. A presidente do partido já anunciou que vai votar a favor da nova lei. E agora?
Carros, cruzeiros, jantares e champanhe. No total, cerca de 30 milhões de que se apropriaram cinco administradores de colégiosdo grupo GPS e que tinham sido entregues pelo Estado. É o Ministério Público que acusa. Há um ex-secretário de Estado (José Manuel Canavarro) e um antigo diretor regional de Educação. O processo segue.
Inédito. Funcionários do Serviço de Emigrantes e Fronteiras (SEF) em greve, ao mesmo tempo que os imigrantes protestavam. Vão ser três dias ao todo (hoje é o segundo). Estes querem resposta aos pedidos de autorização, aqueles condições para lhas darem e muito particularmente o reconhecimento da sua carreira. As voltas que o mundo dá.
Não é inédito, mas vai tomando forma. Associações de militares e polícias querem negociar o descongelamento de carreiras com o Governo, mas este não dá bola. Ontem foram ao Presidente da República entregar uma “nota informativa”. É o último passo antes de uma ação, quiçá mais... ruidosa, para usar uma palavra neutra.
E um aviso – também de greve: A Ryanair diz que vai fazer greve na altura da Páscoa(quinta, domingo e segunda), quer dizer, o aviso é do sindicato do seu pessoal de voo (SNPVAC) e, para cúmulo – e sem explicação – a TAP cancelou 36 voos só entre segunda e terça-feira. A Páscoa não vai ser fácil nem para os que de dentro querem ir fora, nem para os de fora que querem vir cá dentro. A propósito, vai haver chuva, vento forte, baixa de temperaturas, queda de neve. A onda de mau tempo já tem nome: Irene.
Dívidas. Um sintoma do que está para vir se nada se fizer sobre um amplo apoio aos idosos. Denuncia a Deco que entre os pedidos de ajuda subiram - ou aparecem pela primeira vez - casos relativos a dívidas de famílias chamadas a pagar lares dos seus idosos. É um drama social que, garanto, só terá tendência para aumentar. Com a sociedade a envelhecer e as reformas a diminuir, quem toma conta e como dos seus?
Ah, esquecia-me: amantes de futebol. Os horários da Liga dos Campeões e da Liga Europa também vão deixar de ser às costumadas 19h45 (engarrafamentos, lembra-se?). Agora, os jogos do "play-off", fase de grupos, oitavos-de-final, quartos-de-final, meias-finais e final da Champions League vão começar às 20h, havendo em cada jornada da fase de grupos dois dos jogos de terça e quarta-feira a começar às 17h55. A Tribuna informa.
LÁ FORA Catalunha. Os protestos na luta nas ruas de Barcelona não abrandam depois da detenção de Puigdemont na Alemanha. O próprio já terá assumido que passará largo tempo na prisão, segundo o El País. O líder independentista está bem na sua cela individual na prisão de Neumünster, onde tem direito a três livros e a comunicar livremente. Imprensa é que só em alemão, relata-nos o "El Periódico"..A situação vai ficando cada vez mais complicada, ou talvez não, tendo em vista o que parecem gizar-se novas alianças de governação. A esperança reside agora na ONU, cujo Comité dos Direitos Humanos aceitou tramitar a queixa do antigo presidente da Generalitat contra o Estado espanhol, baseada na denúncia de “violação” dos seus direitos políticos. [E a propósito de Espanha e da Catalunha, talvez não seja dispiciendo ler o que diz Francisco Louçã sobre os “Juízes de gatilho fácil” - só para assinantes].
Rússia. Para além a crise externa, Putin está a braços com outra interna, provocada por um incêndio num centro comercial na cidade siberiana de Kemerovo (desleixo criminoso, chamou-lhe Putin e estava zangado). O povo revoltou-se contra as autoridades. Et pour cause. Morreram 64, 41 dos quais crianças.
Facebook. É mais do que um país e toca a todos. Christopher Wylie, o especialista que revelou o roubo de dados pela Cambridge Analytica disse o que já se suspeitava: que o resultado do referendo sobre o Brexit pode mesmo ter sido falseado. E avançou que há mais uma peça no "puzzle digital" desta trama: uma empresa canadiana, que terá funcionado como "franchise secreta". Chama-se Aggregate IQ. Mark Zuckerberg negou-se a ir ao parlamento britânico, mas deverá ir ao Congresso norte-americano. E, já agora, leia este artigo para perceber por que razão o FB não mudará: é que somos nós o produto!
Coreia do Norte. Afinal, the little rocket mansempre foi à China, num comboio verde escuro, rodeado de medidas de segurança. Era indispensável conversar com o líder chinês, agora que há no ar a "ameaça" de negociações com os Estados Unidos. Xi Jinping será sempre a terceira figura ausente na mesa. As últimas, últimas estão na BBC.
União Europeia. Os corredores ferroviários que doravante cruzarão a Europa (incluindo o nosso "Atlântico", de que tanto se tem falado) têm também uma outra função de mobilidade: facilitar a deslocação de tropas, em caso de conflito. O tema parece-me relevante nos tempos de hoje, estive quase tentada a chamá-lo para as primeiras linhas. A Comissão vai propor hoje uma "plano de ação para a mobilidade militar" e será a comissária para os Transportes, Violeta Bulc, quem o vai apresentar.
FRASES “A regulação laboral em Portugal é olhada não como um ideal, mas como uma ideologia”, Nadim Habib, professor da Nova School of Business and Economics, mestre em Economia pela London School of Economics à Rádio Renascença.
"Não vacinar é negligência, é maltratar crianças", Mário Cordeiro, pediatra, ao I
"O Governo preocupou-se mais com os lesados do BES do que com as vítimas dos incêndios", Duarte Marques, deputado social-democrata, ao I
O QUE ANDO A LER Ou o que acabei de ler e o que comecei. Terminei o “Fogo e Fúria”, o tal que fala sobre a vida na Casa Branca de Donald Trump (Michael Frank, na Actual), o best seller instantâneo que vale mesmo, mas mesmo a pena. Já vários dos meus colegas aqui fizeram referência, coube-me agora a mim. Se eu achava que estava informada, pois não, é ainda pior do que eu podia imaginar. A ler. Urgente. Este é o homem e o centro de poder no país mais poderoso do mundo.
E comecei outro, mudando de estilo e de conforto. Confesso: Natália Correia é para mim um ícone a muitos títulos. Como mulher, como escritora, poeta, política até. Admiro-a, admirava-a. E descobri agora um livro recém-editado que desconhecia por completo (ninguém é perfeito, nem mesmo em relação aos seus ícones!): “Descobri que era europeia - impressões duma viagem à América” (Ponto de Fuga). Um mimo. De espanto, de reflexão e de prosa perfeita, num registo que oscila entre o diário, ensaio, poesia e impressões de viagem. Que bela homenagem aos (já) 25 anos da sua morte.
Caro leitor, a manhã já vai alta para mim. Aqui me despeço. Mas contamos consigo, a qualquer hora, para ler o Expresso. Tenha um Bom dia!
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