Já temos novo titular da pasta da Administração Interna, tendo a escolha de Pedro Passos Coelho recaido numa professora de Direito de Coimbra, Anabela Azevedo. É alguém que, como lhe contámos no Observador,. que quer as mulheres a mandar e que vai manter os secretários de Estado de Macedo. Curiosamente anova ministra bem recebida à esquerda, até porque esta continua a pressionar para que saiam outros ministros.
Como o nome foi conhecido a meio do dia, ainda não há comentários mais desenvolvidos, pelo que optei por vos deixar hoje uma selecção de textos sobre temas variados, mas a merecer atenção.
Começo pelo tema de ontem, a demissão de Miguel Macedo, para vos sugerir mais um texto de Maria João Avillez, com a verve a que nos habituou aqui no Observador: Cara, há. E coroa?. Eis um pouco do seu raciocínio:
Sucede que sendo óptimo “ser bom na adversidade”, não chega. E a partir de certo momento, nem interessa. Há que virar uma página e começar outro capitulo: independentemente das condições do país ainda afligirem o Governo; independentemente de ser preciso ter cuidado com as contas e com o resto; independentemente dos amanhãs que teimam em não se anunciar radiosos; independentemente de tudo, é preciso articular as exigências orçamentais ditadas pela nossa modesta realidade, com outra coisa. Outro discurso, uma história diferente, algum futuro. Uma espécie de outro lado. Tivemos a cara, falta a coroa.
Outro lado? Sim. Outro lado é – por exemplo – sabermos como prosperar, com justiça, como sociedade democrática, aberta e concorrencial , num mundo globalizado.
Enquanto ficamos a pensar como chegar lá, a esse outro lado, a esse saber se, como escreveu Oliveira Martins nos idos de 1892, “há ou não há recursos bastantes, intelectuais, morais, sobretudo económicos, para subsistir como povo autónomo dentro das fronteiras portuguesas”, podemos meditar sobre o futuro dos partidos à luz do que já sobre eles se dizia precisamenbte no tempo desse mesmo Oliveira Martins. É essa viagem que Maria de Fátima Bonifácio nos propõe em “E depois dos partidos?” Não é uma meditação muito optimista:
Como a História mostra, os regimes também acabam pelo descrédito e ruína dos partidos. E ainda pelo eclipse de valores tão elementares como a honestidade, a honra e a decência (demonstrados no caso excepcional de Miguel Macedo). O niilismo que alastrou depois da carnificina da Iª. Guerra Mundial abriu caminho aos fascismos de vária ordem que imperaram numa Europa outrora liberal e democrática, mas cujos valores foram cilindrados pela bestialidade de um conflito visto como uma atrocidade irracional. Não é precisa tão grande tragédia para gerar a descrença. Sobram razões para Portugal se sentir desmoralizado. E depois dos partidos, o que virá?
Paulo Rangel, no Público, em Para um inventário da incerteza política, também mostrou estar preocupado. Olha para Europa, para os seus problemas, mas olha sobretudo para Espanha, onde vê cresceu uma inquietante crise constitucional, uma crise que abala o regime democrático em todas as suas dimensões. O seu diagnóstico é poderoso:
A crise catalã é talvez o detonador mais visível da incerteza na Península, mas não é decerto o único. O vulcão dos escândalos políticos em Espanha não cessa de entrar em actividade (…) A formalização política do movimento dos indignados, de algum modo hipostasiada na ascensão do Podemos e do seu profeta Pablo Iglesias, não vem a ser menos preocupante. Com a sua confessa simpatia pelo “socialismo bolivariano” da Venezuela, do Equador e da Bolívia, está tudo dito quanto às suas credenciais democráticas. Com as suas promessas de distribuição omnímoda de prestações sociais, sem qualquer explicação sobre o respectivo financiamento, está tudo dito quanto ao lugar geométrico da sua demagogia. O Podemos, enquanto movimento de dissolução dos pilares da democracia liberal, não é menos pernicioso nem menos perigoso que muitos daqueles movimentos de direita radical. A Espanha vive um momento constitucional, político e partidário delicadíssimo, que, de uma maneira ou de outra, terá sempre consequências sobre Portugal.
O fenómeno do Podemos, o partido radical e anti-sistema que já aparecer a liderar algumas sondagens, deverá, mais tarde ou mais cedo, de merecer a nossa atenção. Prometo dedicar-lhe alguma atenção num próximo Macroscópio, mas deixo-vos, para já, uma sugestão: leiam esta peça sobre uma entrevista do seu líder, Pablo Iglesias, entrevista essa que podem ver na íntegra aqui. É reveladora sobre o que propõe, ou não propõe, um partido que derivou do movimento dos indignados, com tudo o que isso significa.
Regressemos em Portugal, para assinalar o início da sessões da comissão parlamentar de inquérito ao caso BES. De entre os vários textos que reflectem sobre a audição de ontem de Carlos Costa, destaco apenas dois. O primeiro é o editorial de António Costa no Diário Económico, “Estamos condenados às fraudes bancárias? “ É um texto que termina como uma inquietação: “Estamos condenados a viver com o risco de novos casos BES? Depois de ouvir Carlos Costa durante horas, no mínimo, desconfio da capacidade da supervisão para evitá-los. O Governador revelou um sentimento de impotência e os novos poderes não parecem ser suficientes para resolver isto”. O outro texto é da directora do Jornal de Negócios, em “Jogos de gatos e ratos no caso BES”, que mostra um cepticismo de aguma forma semelhante: “O primeiro dia da comissão parlamentar de inquérito ao caso BES revela um Banco de Portugal pesado por regras que parecem construídas para não actuar. A habilidade que teve de usar para forçar a demissão de Ricardo Salgado mostra bem como o supervisor tem poderes muito limitados.”
Mudo de novo de tema para recomendar um trabalho especial do Observador onde se revela onde será o gabinete de Cavaco Silva quando deixar a Presidência da República. É um trabalho onde se recorda para onde foram trabalhar os anteriores Presidentes (Eanes, Soares e Sampaio) e se descreve o Convento em Alcântara agora escolhido pelo actual titular de Belém. Também se diz quanto custam (e custaram) as obras de adaptação: “O Convento vai sofrer obras de reabilitação e a parte do gabinete será suportada pelo Orçamento da Presidência da República. O concurso da obra foi lançado em pleno mês de agosto, sexta-feira dia 8, e já foi entretanto “adjudicada [a obra], em concurso público, por 386 mil euros + IVA”. A obra teve o ‘ok’ do Tribunal de Contas. Há dez anos, o restauro da Casa do Regalo para servir de gabinete para Jorge Sampaio custou 746 mil euros.”
Dou agora um salto para fora de portas, para lhes sugerir mais dois textos. Um é um apelo lancinante de Asia Bibi, uma paquistanesa cristã condenada à morte por blasfémia. Morte por enforcamento. A mensagem, ditada pelo marido Ashiq Masih ao diário francês Le Figaro, é poderosa. Pequeno extracto:
Notre famille a toujours été heureuse ici, nous n’avons jamais rencontré de problème avec qui que ce soit. Nous sommes chrétiens et nous respectons l’Islam. Nos voisins sont musulmans, et nous vivions avec eux dans notre petit village. Mais depuis quelques années la situation a changé à cause de quelques personnes, et nous avons peur. Aujourd’hui beaucoup de nos amis musulmans ne comprennent pas pourquoi la justice pakistanaise impose tant de souffrances à notre famille.
A outra sugestão vai para um dos editoriais de hoje do Wall Street Journal, “Japan’s Keynesian Recession”. Recomendo-o porque à notícia de que o Japão tinha entrado em recessão apesar dos estímulos económicos seguiu-se, hoje, a notícia de que haveráeleições antecipadas. Aquele jornal económico faz uma análise das políticas públicas seguidas pelo governo de Tóquio para concluir que “the familiar advice to spend more and raise taxes fails again”. Uma discussão com elementos que, como se vê, nos são familiares.
E por hoje é tudo, despeço-me com desejos de bom descanso e boas leituras.
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