General Valerii Zaluzhnyi (Yuliia Ovsiannikova / Ukrinform/Future Publishing via Getty Images)
General Valerii Zaluzhnyi (Yuliia Ovsiannikova / Ukrinform/Future Publishing via Getty Images)© TVI Notícias

“Irrita-me”, diz Valerii Zaluzhnyi sobre as críticas que surgem acerca do ritmo a que a contraofensiva ucraniana está a decorrer. Sobre os seus ombros existe a responsabilidade de orquestrar esta gigantesca operação, a tão antecipada contraofensiva ucraniana, que se estende a mais de mil de quilómetros armadilhados e defendidos em posições pré-preparadas pelo exército russo. “Isto não é um espetáculo em que o mundo está a assistir e a fazer apostas. Todos os dias, cada metro é conquistado com sangue”, afirma.

Mais do que nunca, o general reforça que a Ucrânia precisa de munições, mas também, cada vez mais, de aviões de combate capazes de dar superioridade aérea à Ucrânia. O envio de F-16 não é segredo nenhum, mas a sua chegada, na melhor das hipóteses, só será concretizada no outono. Enquanto isso, Zaluzhnyi admite que as suas tropas no terreno são vulneráveis à frota de Su-35 da Rússia, que são mais modernos e capazes que os antigos aviões soviéticos que a Ucrânia tem ao seu dispor.

“Os F-16 são necessários. Porque não há outra maneira. Porque o inimigo está a utilizar uma geração diferente de aviação”, insiste, em declarações ao The Washington Post.

Na entrevista ao jornal norte-americano, Zaluzhnyi diz que a Ucrânia não precisa de 120 aviões, uma pequena quantidade seria suficiente para obter vantagem aérea num determinado local. “Aviões russos estão a devastar as nossas posições”, sublinha, mas “um número muito limitado seria suficiente” para apoiar vários eixos de ataque.

O principal problema, admite, continua a ser o número de munições de artilharia. A Ucrânia continua a utilizar mais munições do que as que recebe e que o ocidente é capaz de produzir, mas, ainda assim, em algumas regiões da frente a Rússia dispara dez vezes mais munições que Kiev. “Sem serem completamente fornecidos, estes planos não são viáveis, de todo”, defende.

Valerii Zaluzhnyi confessa que transmite todas as suas preocupações ao homólogo norte-americano, Mark Milley, com quem conversa longas horas todas as semanas. É alguém que ele aprendeu a admirar e que passou a considerar um amigo. Para o líder das forças armadas ucranianas, é fácil explicar a sua situação a outro militar, em particular um que é capaz de o livrar "de algumas preocupações”. Ainda esta quarta-feira, os dois líderes falaram e Milley ficou a saber quantas munições os ucranianos precisam.

“Temos um acordo: 24 horas por dia, 7 dias por semana, estamos em contato. Então, às vezes posso ligar-lhe e dizer: 'Se eu não conseguir cem mil projéteis numa semana, mil pessoas morrerão. Coloque-se no meu lugar'”, conta o homem responsável pela reconquista do território ocupado pela Rússia.

Mas não é Mark Milley quem decide se a Ucrânia recebe as munições e os aviões que tão desesperadamente precisa. Essa decisão é política. No entanto, enquanto ela não é tomada, “muitas pessoas morrem todos os dias” e Zaluzhnyi sublinha-o, “muitas, só porque uma decisão ainda não foi tomada”.

Este é um dilema difícil de resolver. A indústria militar europeia desmilitarizou-se ao longo de décadas e voltar a colocar em funcionamento e abrir novas linhas de fabrico é algo que ainda vai demorar vários anos a estar concluído. Existem vários países que colocaram as suas fábricas a produzir 24 horas por dia, mas o número de munições produzidas ainda é muito inferior à capacidade de produção russa. Nos Estados Unidos o cenário não é muito mais animador, com os números mais recentes a colocarem a produção em 24 mil unidades por mês, o que corresponde a três dias de combate na Ucrânia.

Ao contrário de muitos analistas, o general ucraniano não dá excessiva importância à rebelião do grupo Wagner que ocorreu no passado fim de semana. O militar explica que os mercenários já não estavam na linha da frente e as defesas do exército regular russo não se tornaram mais fracas em nenhum setor. “Tenho várias preocupações e a Wagner é apenas uma delas”, diz, antevendo um cenário em que os experientes soldados possam abrir uma nova frente de combate acima de Kiev.

No entanto, esse não é o cenário que mais o preocupa. Durante os últimos dias, os serviços secretos ucranianos têm alertado para a possibilidade de a central nuclear de Zaporizhzhia, a maior da Europa, ter sido armadilhada pelo exército russo e muitos se questionam sobre a possibilidade de um “ato terrorista” que liberte radiação na região.

“Isso não me impede de modo algum. Estamos a fazer o nosso trabalho. Todos esses sinais vêm de fora por algum motivo: ‘Tenham medo de um ataque nuclear’. Bem, então devemos desistir?”, questiona Zaluzhnyi.