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14 de Outubro de 2015 | ||
Todos em suspenso do que aí vem
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Prepare-se:
é tempo de apertar o cinto. Vamos atravessar um período de turbulência,
que esperamos seja breve (mas não garantimos). Endireite as costas do
assento, respire fundo e mantenha-se calmo. Mas não desespere. Estes são tempos estranhos. Tempos históricos? O tempo o dirá, mas como diz Tiago Freire no Diário Económico de hoje, "a 4 de outubro o mundo era uma coisa, dez dias depois, o mundo está ao contrário". O normal cidadão português começa a sentir-se desorientado com a torrente de notícias que lhe está a cair em cima. Com todos à espera de uma reunião decisiva entre a coligação e o Partido Socialista - desta vez no Largo do Rato - para uma discussão sobre as premissas de um compromisso para um novo Governo, saíu... nada. Roubo a expressão ao meu diretor para a descrever, quando ao fim de mais de duas horas os líderes partidários surgiram nas televisões: "do vazio total... ao rigorosamente nada". As primeiras palavras foram as usadas por António Costa, na semana passada, ao sair da sede do PSD, as segundas pronunciou-as ontem Pedro Passos Coelho na sede do PS. Foi a vez deste dizer: reunião inconclusiva, "não avançamos absolutamente nada". António Costa, por sua vez, reafirmou a sua insatisfação com o documento apresentado pela coligação (documento facilitador do compromisso, chamaram-lhe) onde esta, supostamente, teria satisfeito os eventuais requisitos que o líder do PS poderia colocar. Os socialistas queriam ver mais sobre o estado das finanças públicas e o impacto das promessas da coligação, e Costa até enumerou os elementos que faltavam. Quanto ao documento que foi analisado na reunião, as cedências eram afinal poucas, apesar da abertura declarada ser total e ir ao ponto de admitir António Costa no Governo ou outro qualquer socialista. O isco não passou, e os rostos, antes mesmo de os líderes da coligação falarem, disseram tudo. Costa ainda adiantou, todavia, que não deixará o país cair no pântano e que haverá mais um esforço de diálogo, encarregando-se de enviar uma contra-proposta. Por esta altura, na São Caetano à Lapa, hão de estar a interrogar-se: para quê? Afinal o que é que o PS quer? Passos não podia ser mais claro: "há ou não vontade política para se chegar a um entendimento?". A questão principal é mesmo essa e Passos espera agora o que dirá o Presidente da República, enquanto vai avisando que se o PS chegra a ser Governo, não contem com ele para qualquer acordo. À coligação não escapou com certeza que o PS, numa jogada dupla de xadrez, ao mesmo tempo que preparava a reunião no Rato, já tinha outras a decorrer, "longe dos holofotes dos jornalistas". Foram as tais "reuniões técnicas" para aprofundar as convergências entre o PC e o PS, que se realizaram afinal no Parlamento. Um sítio óbvio, certo? Mas, por enquanto, parece que não foram tão bem sucedidas como parece, mas dos pormenores pouco se sabe. O Observador traça aqui um cenário possível do que querem uns e outros. O mesmo tipo de reunião técnica, mas com o BE, realizar-se-á hoje. Portugal segue pois entre o perplexo, a inquietação e a excitação, o desenrolar inédito dos acontecimentos que pode conduzir a que uma formação política, tendo ganho as eleições, poder afinal não vir a governar. A coisa é comum em outros mundos, mas não no português. António Costa começa a dar sinais para onde se orienta, embora, titula o Público de hoje, "Sem acordo à direita ou à esquerdar, PS deixa passar governo de coligação". A ler. É a concretização da promessa que fez na noite eleitoral, de que não não fará maiorias do contra, ou seja, só ajudará a derrubar o Governo se tiver outro em alternativa. À cautela, deu ontem duas entrevistas a órgãos internacionais, uma à France Press, outra à Reuters, onde garante que "o PS não é o Syriza" e que "o PS está em melhores condições para formar governo que a direita". É o costume, nestes casos, para sossegar os mercados, preocupados com a estabilidade acima de tudo (e nós também, já agora). Ah, e vai reunir-se hoje com os embaixadores da União Europeia, tentando esclarecer a Europa. António Vitorino falava ontem de um "verdadeiro terramoto político" sobre a hipótese de um Governo à esquerda - coisa nunca vista no Portugal depois do 25 de Novembro (a propósito, vai fazer 40 anos dentro de um mês) - e que o próprio Costa tinha declarado, minutos antes, ser um muro que pode cair. Não é o de Berlim, mas o de Novembro. A "inovação constitucional" do Presidente, ao exigir um Governo de maioria ao vencedor, somada à "inovação do PC", que se dispôs a viabilizar um Governo socialista, resultaram neste quadro. Santana Lopes quer o Presidente a nomear Passos Coelho primeiro-ministro, mesmo que este não passe no Parlamento, depois de ter afirmado que seria a "suprema ironia" se Cavaco Silva, depois disto tudo, saísse de Belém dando posse a um Governo de esquerda. Nada disto é pacífico, nem mesmo entre os socialistas, onde se prepara um referendo e se prevê borrasca gorda. Eurico Brilhante Dias, um segurista que foi eleito por Castelo Branco, dizia na televisão que temia uma aventura e que preferia ver "uma casa comum da esqueda num outro cenário, o da vitória do seu partido". Carlos Zorrinho, hoje, no Público, alerta para coisa semelhante. Espera-se agora a metralha pesada de Francisco Assis, que é entrevistado esta noite na RTP. Exemplar para o que pode vir a acontecer no Partido Socialista, onde se prepara um referendo interno, ao que se sabe. Sobre o momento que vivemos, há opiniões para tudo, como sempre: Manuel Villaverde Cabral fala da Esquerda Unida, João Vieira Pereira das "Oito verdades que Costa não está a ver" e até a historiadora Fátima Bonifácio parte para o ataque de carácter. Em outro ângulo, o Daniel Oliveira aborda as questões da legitimidade e o Ricardo Costa as do "Arco da governação", que mudou, pois claro. O Rui Tavares, no Público, também dá "Ideias para fazer". E o José Vítor Malheiros diz "Entrou uma luz pela porta da esquerda". É caso para dizer, como Francisco Louçã: "Que ninguém se afogue no Rubicão"! Claro que as negociações para o Governo não deixaram de ofuscar a formalização da candidatura de Maria de Belém .. a Belém. Disse simplesmente que se candidatava para disputar a vitória, numa cerimónia cheia de senadores socialistas. |
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Ainda falando de acontecimentos em Portugal: já se sabia que o Regulador aprovou a venda da TAP, mas não a qualquer preço. A ANAC quer saber quem manda no consórcio Gateway e quer garantias de que é o português Humberto Pedrosa quem vai mandar na empresa.
E ainda: então não é que há um novo surto da Doença dos Legionários no Grande Porto? A bactéria foi identificada em seis torres de arrefecimento de edifícios já encerrados e desinfetados, mas o diretor geral da Saúde, Francisco George, garantiu que que "esta situação é totalmente diferente daquela que se verificou em Vila Franca de Xira" no ano passado, onde em muito poucos dias surgiu "uma epidemia explosiva com 402 casos confirmados", com registo de 14 óbitos. O surto no Porto já decorre desde sexta-feira e conta com 14 casos, mas é possível que ocorram mais.
Lá fora, coisa séria é a Síria e o que lá se está a passar. Há um certo jogo dual entre a Rússia e os Estados Unidos, sendo certo que a primeira anda a bombardear alvos que ajudam o Presidente Al-Assad e os Estados Unidos os insurgentes, mas o Presidente russo diz que o Ocidente tem "papas na cabeça" e acusa os EUA de não partilharem dados sobre os alvos do Estado islâmico. Onde se intercruzam os bombardeamentos? O New York Times explica e mostra uns gráficos esclarecedores e adianta que há um semi-conflito entre os dois países. É duvidoso. Dado tudo o que já aconteceu no Médio Oriente desde que os EUA invadiram o Afeganistão, em 2001 e depois o Iraque, em 2003 (e desta vez sem mandato inernacional) se calhar é caso para perguntar: o Ocidente quer mesmo derrubar Assad e mergulhar ainda mais no caos a região? O José Milhazes tem uma ideia pelo menos do que a Rússia quer.
No Brasil, as contradições da política interna não vão afinal, para já, conduzir a um impedimento da Presidenta Dilma Rousseff, como ela gosta de ser chamada. Com as contas do Governo chumbadas pelo Tribunal de Contas e remetidas para o Congresso, Dilma tenta reunir apoios e acusa os opositores de "golpe escancarado". A oposição não quer ver o vice, Michel Temer, a substitui-la no cargo e isso pode para já ajudar Dilma.
A Volkswagen, que continua a semear anúncios pedindo desculpa aos consumidores, por ter quebrado a peça mais importante, a confiança, está mesmo em dificuldades. Agora, diz que vai cortar €1000 milhões por ano nos investimentos. É difícil a "nossa" Auto-Europa escapar.
Na Alemanha, as coisas também não vão de feição com a chanceler Angela Merkel, cujos aliados conservadores ameaçam retirarar-lhe o apoio por causa da crise dos refugiados. A Der Spiegel conta.
E, já agora, porque a desigualdade é um dos maiores problemas da atualidade, que tal aprofundar o tema e ler este ótimo artigo do britânico Guardian, onde se lê apenas isto: "1% da população mundial concentra metade da riqueza mundial". Algo vai mal no Reino que não é só da Dinamarca.
E porque sou sempre interessada por estes temas (sim, não é apenas a Cristina Peres que se preocupa com isso), veja o que acontece quando se faz o photoshop dos homens (ou das mulheres) nas fotografias políticas. A Elle Magazine fez esse exercício e o vídeo que resultou é bastante ilustrativo. Mas o leitor já sabia que são raras as mulheres nos governos e outros órgãos de inffluência, não sabia? Agora encontra aqui uma prova bem humorada sobre... humm... acha que falar em misogenia é um termo muito forte? A nossa Manuela Goucha Soares também aborda o tema em Portugal, mas numa perspetiva histórica. Noutro registo, deixo-lhe aqui esta notícia. Dizem que é o fim de um ciclo, mas para mim é mais o de um mito: a Playboy vai deixar de publicar nus. Caro leitor, não é uma viragem a sério. A realidade é que a revista quer entrar na China, onde os costumes são mais apertados.
E só para rematar. Houve um desgraçado de um caçador australiano que viveu a epopeia de um militar das operações especiais: foi obrigado a comer formigas para sobreviver durante seis dias Arrh, ao que a fome obriga! A vida prova que, mesmo não treinados, somos capazes de tudo.
Uma derradeira amenidade: então não é que a RTP está a promover o jogo do FC Porto na Champions com imagens de jogadores do Benfica? Sacrilégio? Não, motivação especial. O Adriano Nobre conta-lhe porque é que isso acontece.
FRASES
"António Costa não tem honra nem palavra". Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais, jornal I
"Não creio que que Costa esteja a fazer bluff. Está a jogar muito bem", António Capucho. Diário de Notícias
"É possível estar perdedor e estar feliz por ver as coisas mudarem no bom sentido". Rui Tavares, jornal Público
O QUE ANDO A LER
Por razões que não têm nada a ver com a situação política atual, mas por causa de um outro trabalho que tenho em mãos, encetei um livro que tem tudo a ver com a atualidade: "1975, o ano que terminou em Novembro", prefaciado pelo próprio general António Ramalho Eanes (Temas e Debates), por António Luís Marinho e Mário Carneiro. Foi a 25 desse mês que, para todos os efeitos, se estabeleceu um muro, o do tal arco da governação que agora Costa diz que quer acabar. É bom revisitar agora esse incrível e alucinante ano em que tudo acontecia, em que as notícias saltavam debaixo das pedras da calçada. Literalmente e todos os dias. Era o paraíso dos jornalistas, seguramente não o do país.
E despeço-me assim. Ansiosa pelas novas notícias que o dia nos trará. É bom ver um país em movimento (é isso, sou jornalista). Cheque no online do Expresso sempre que quiser e, ao fim do dia, o Expresso Diário. E amanhã, cá estará o Martim Silva para o seu Curto. Com ou sem espuma?
Tenha um bom dia!