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POR LUÍSA MEIRELES
Redatora Principal
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17 de Fevereiro de 2016 |
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O meu nome é dor
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Perdoe-me o leitor, mas há dias em que as notícias nos submergem. Desde há dois dias, a notícia da mãe desesperadaque entrou no Tejo com as filhas (19 meses, quatro anos) enche o coração de dor. Havia um mundo de dor dentro daquela mãe, deprimida e vítima de violência doméstica, mas a dor que ficou é ainda maior. "Suicídio piedoso" chamam-lhe os especialistas, que designativo infeliz. Que dor tamanha é esta que leva uma mãe a levar tal destino aos filhos? O seu grito "Procure as minhas meninas" ecoará longos anos aos ouvidos de quem a socorreu. Leio que a PSP tinha montado um plano de segurança para proteger a mulher e as filhas desde que ela tinha apresentado queixa, em novembro passado, mas chegou tarde, ou de nada valeu. A mãe perdeu as filhas e ela perdeu-se para e no mundo. Não sei. Só sei que hoje, como ontem, e para o futuro que consigo vislumbrar, o seu nome é dor. É tempo de inspirar, pois. E começar. Porque hoje também é dia de falar de negócios. Puros e duros. E o nome é TAP. Ontem, a Ryanair anunciou (e aqui) o que ameaçara: ficar com as rotas do Porto que a TAP cancelou: Bruxelas, Milão, Barcelona, Madrid entre outras. Rui Moreira não perdeu tempo em afirmar que, se a companhia low cost o decidiu, "não é com certeza para perder dinheiro". Ou seja, o que para uns é prejuízo, para outros é oportunidade de negócio. Apesar de já ter a retaguarda coberta, o presidente da Câmara do Porto - que sobre isto não poupa as palavras - tem à mesma encontro marcado para hoje com o primeiro-ministro, que agora encarna o Estado que retomou o controlo estratégico da companhia de bandeira. Há quatro dias, sobre este mesmo assunto, António Costa garantia em entrevista ao Expresso que " as operações no Porto eram um objetivo estratégico" (vá fazendo correr o cursor que chega lá). Estamos todos curiosos em saber o que resultará de tal encontro, sobretudo depois do ministro da pasta, Pedro Marques, voltar a afirmar que não vai interferir nas decisões sobre as rotas mas que o Porto vai ganhar com outras voos. Também há hoje reunião cimeira das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e o assunto estará na agenda. Lisboa promete solidariedade. Ainda sobre a TAP, mas na vertente capital, ficou finalmente esclarecido que a entrada dos chineses na companhia (via Azul) já tinha sido decidida pelo anterior Governo. E, se bem me lembro, também a abertura de um voo direto entre Lisboa e Pequim esteve até na agenda de um encontro especial de Pires de Lima com empresários chineses quando o então ministro da Economia de Passos Coelho visitou a China com o Presidente Cavaco Silva em 2014. Uma polémica vazia de sentido, afinal. Bem, isto apesar de Pequim ainda ter de aprovar esse investimento. Para todos os efeitos, o tema TAP ainda vai dar muito que falar - e ainda esta semana será entre o governo e o sindicatos. O "amigo secreto", chama-lhe o Tiago Freire (Diário Económico, mas só para assinantes).
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OUTRAS NOTÍCIASOntem foi dia de antecipar o tempo. António Costa foi a Queluz encontrar-se com o Presidente eleito, que é ali que ele tem o seu gabinete, até ir para Belém. Os temas? Pôr Marcelo Rebelo de Sousa ao par de assuntos do Estado e definir regras de trabalho em comum foi o objetivo oficial do encontro, que todavia deve ter sido mais do que isso.O Primeiro-ministro promete mais reuniões antes da tomada de posse, e o Presidente eleito também já recebeu outras figuras (o governador do Banco de Portugal e o ministro das Finanças, entre outros). Curiosamente, este encontro com Marcelo (e onde, como se viu, também se falou do Orçamento de Estado) ocorre na véspera do outro encontro, mas com o Presidente em exercício, que terá lugar esta tarde. "Não há desconsideração", afirmou Costa. Ainda falando do Presidente eleito, que está a preparar a sua entrada em Belém, realce para a opinião de António Guterres, o seu putativo adversário-que-nunca-quis-ser, que diz "ter esperança que ele seja um Presidente isento (será seu conselheiro de Estado, além do mais). Guterres irá esta quinta-feira falar como convidado às jornadas parlamentares do PSD. Guterres esteve na Assembleia da República ontem, onde foi ouvido a propósito da situação dos refugiados e afirmou que a Alemanha é a válvula de escape do sistema europeu, não poupando as críticas aos 28. "A Europa como sociedade não é sustentável sem os movimentos migratórios", disse o ex-Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados O tema também esteve na baila em Bruxelas, onde o ministro Santos Silva criticou mesmo a resposta "muito fraca" da UE e anunciou que Portugal recebeu dezenas de refugiados, quando "a disponibilidade é para milhares”. Do Orçamento de Estado começa agora a falar-se na Assembleia da República. Depois de PSD se mostrar indisponívelpara "dar a mão aos socialistas na aprovação das contas do Estado" (José Matos Correia), embora com matizes (Luís Montenegro), eis que o faz a esquerda: PCP já anunciou pelo menos quatro propostas (propinas congeladas, manuais gratuitos, mais subsídio social de desemprego e menos IMI) e o Bloco de Esquerda faz o mesmo (deduções de educação no IRS). A ver o que sai finalmente aprovado neste OE, onde parece que as reposições salariais vão custar menos e cujas contas, para além do mais, voltaram a ser revistas. Portugal volta aos leilões no mercado hoje mesmo e esse será um bom indicador da situação. A emissão de Bilhetes do Tesouro tem um montante indicativo global entre mil e 1.250 milhões de euros. De contas do Estado também se fala, quando se fala de empregos no Estado que, segundo os dados oficiais, aumentaram no ano passado (ano de eleições, como todos recordamos) pela primeira vez desde 2011. Foram mais 2509 trabalhadores (num total de 658.565), uma percentagem diminuta, portanto (0,4%), mas que fez inverter a tendência. As reformas na função pública, por outro lado, caíram drasticamente em 2015 (59% face a 2014), segundo o Público. O que subiu também foram as contas do turismo (mas do lado bom, o da receita): 2015 foi um ano recorde de ocupação do turismo, diz o INE. Portugal já tem agora tantos turistas como habitantes: 10 milhões (diz o jornal I). Em contrapartida, o volume de contratos de obras públicas ficou em mínimos históricos (27 milhões de euros), embora os concursos e empreitadas já tenham aumentado em janeiro. Um boa notícia, útil para o contribuinte: fisco cria novo site para reconfirmar faturas. E outra má, desagradável para os portugueses: a má alimentação já se nota nos novos casos de cancro. Neste conjunto de noticias domésticas, não é possível deixar de mencionar o que se está a passar com o julgamento por violência doméstica de Manuel Carrilho (o professor) a Bárbara (apenas Bárbara). É assim que a juíza Joana Ferrer Andrade se lhes dirige, nuns termos que estão a dar polémica. O Expresso foi saber até onde pode ir um juiz, e o jornal I (sem link, infelizmente), hoje, revela novos dados sobre esta juiza, no mínimo, peculiar, que é fascinada pela Alemanha e... por gatos. Em tempo: não, não me esqueci. Ontem foi dia de grande jogo, o Benfica-Zenit, que tem essa particularidade de ser treinado por um português, André Villas-Boas. Parece que o jogo não teve grandes oportunidades, ouço dizer, que nestes assuntos sou pouco versada, porém atenta. Por isso recorro, como de costume, a quem sabe: a Mariana Cabral, "what else"? Ela tem um texto esplêndido, onde explica tudinho, incluindo o título: "Jonas, o empata-empates".
Lá foraO tema-rei da semana é o " Brexit", para quem não sabe, a abreviatura de Britain (Grã-Bretanha) e exit (saída), que nasce por analogia com o termo Grexit (significando a saída da Grécia do euro). A saída do Reino Unido da União Europeia foi e é uma bandeira do partido mais à direita do espectro político inglês (UKIP), mas foi recuperado pelo Governo conservador, cujo primeiro-ministro, David Cameron, prometeu fazer um referendo sobre o tema e que poderá ser já a 23 de junho. O assunto será debatido esta quinta e sexta-feira no Conselho Europeu, em Bruxelas, e promete não ter hora marcada para terminar. Mas o tempo urge: as últimas sondagens dão o "não" a subir e quanto mais tempo se perder, mais difícil será recuperar. Portugal tem uma posição sobre o assunto - manter o Reino Unido, embora não a qualquer preço - mas as discussões estão ainda a decorrer. Só hoje à noite estará fixada finalmente a posição do presidente do Conselho Europeu, o polaco Donald Tusk, que desde 2 de fevereiro assumiu um compromisso onde se fazem algumas cedências às reivindicações birtânicas e que o Guardian resumiu desta maneira. Ainda ontem Cameron esteve no Parlamento Europeu, onde recebeu o apoio (contra o Brexit) do seu presidente, o alemão Martin Schulz. Na véspera, porém, o primeiro-ministro britânico não se conseguiu entender com o Presidente francês, François Hollande, nomeadeamente sobre a governação económica, um tema central para todos. Este texto da Fundação Robert Schuman dá-lhe uma ideia do que está em jogo. O tema transcende largamente o Reino Unido - em boa verdade, joga-se nele toda a União Europeia, pelo menos tal como a conhecemos. Em Espanha, entretanto, continua o imbróglio de Governo. Dia 2 de março, o líder do Partido Socialista Pedro Sanchez vai tentar a investidura, mas parece que será em acordo com o Ciudadanos(El Mundo). Se preferir a versão do El Pais, ei-la. O Podemos de Pablo Iglezias pede demais e, sobretudo, pede o impossível, um referendo na Catalunha. Mas não é garantido que Sanchez o consiga. Se conseguir, não será um "acordo à portuguesa", já que o C's é centro-direita. A seguir com atenção. Não será de somenos no campo internacional olhar para o que se está a preparar na Síria, agora que a Arábia Saudita anunciou que está disposta a entrar no terreno, não só a partir de bombardeamentos do ar como em terra. Esta notícia é particularmente inquietante: "350.000 soldados na Arábia Saudita estão prontos para invadir a Síria". Por enquanto é um exercício com tropas de vários países árabes, mas vai durar 18 dias. Chama-se "Trovão do Norte". No sábado, o Independent já tinha avançado a disposição saudita. Tudo junto, provocou séria celeuma na chamada conferência de Munique, onde o primeiro-ministro russo acusou o Ocidente de criar uma nova guerra fria, o que Federica Mogherini nega. Mas o problema é mais vasto e sério, como alerta a Economist. Finalmente, uma notícia económica: o petróleo voltou a cairdevido à falta de acordo para cortar produção. E se quer uma notícia curiosa, repare como o mundo se tornou pequeno para as marcas mundias. Este trabalho mostra bem como tão poucos dominam o mundo. A diversidade é, afinal, uma ilusão. FRASES"Parece que a TAP é um objeto voador não identificado", Rui Moreira, no Diário Económico "Temo pela construção europeia", António Guterres, na Assembleia da República "A nossa determinação é maior do que qualquer melancolia. Hoje, ao terminar os meus mandatos, reafirmo a mesma convicção", Presdiente da República, Aníbal Cavaco Silva, na Sociedade Histórica de Independência Nacional "Está toda a gente a querer fazer desaparecer Cavaco Silva, a fazer de conta que já não existe", Joaquim Aguiar, ao DN "Os portugueses ainda vão ter saudades dos tempos em que o Governo protegia os rendimentos mais baixos e onerava os mais altos", Luís Montenegro, no Público "Também eu, à minha pequena e humilde escala, não vim trazer paz, mas a espada", Joana Ferrer Andrade, juíza do processo Bárbara Guimarães versus Manuel Carrilho
O QUE ANDO A LER Aconteceu-me poucas vezes começar a ler e, a partir do primeiro parágrafo, não conseguir parar até ao fim. Estranha? Cito: "Os antílopes têm uma visão dez vezes melhor do que a nosssa, disseste-me. Foi no início ou quase. O que significa que numa noite clara eles conseguem ver os anéis de Saturno". O livro é da americana Jenny Offill e chama-se "Departamento de Especulações" (Relógio d'Água, 2015) e é... o quê? Um romance? Anotações dispersas e emotivas de uma mulher (a esposa) que fala do casamento e das suas dificuldades de uma maneira como nunca vi, onde mistura bebés com cólicas com Keats, Kafka e Einstein e mais um conjunto de cartas de amor a alguém que se chama marido? "Os budistas dizem que há 121 estados de consciência. Desses, só três envolvem angústia ou sofrimento. A maior parte de nós passa o tempo a circular entre esses três estados". James Woods, da "The New Yorker" diz que é um romance "maravilhosamente complicado de definir, porque aponta simultaneamente para várias direções, brilhando com diferentes tons de emoção". Quem sou eu para o contradizer? Melhor, para concordar. Tente.
E tenha um bom dia!
O Expresso estará por cá, dando-lhe as notícias que precisa de saber a qualquer hora. E às 18h, o condensado do melhor do dia no Diário.
Amanhã, é a vez do Martim Silva.
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