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segunda-feira, 11 de abril de 2016

OBSERVADOR - 11 DE ABRIL DE 2016


Macroscópio – Crescimento: o que fazer quando nenhum remédio parece funcionar?

Para: antoniofonseca1940@hotmail.com

Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!

 
O FMI divulga amanhã as suas previsões de crescimento para a economia à escala global e a discussão já está na rua. Já se sabe que os números não serão entusiasmantes, pelo que a discussão continua a mobilizar os colunistas da imprensa especializada, mas não só: o que fazer para conseguir um crescimento mais vigoroso? O que fazer para evitar a deflação? Ninguém parece saber responder – ou, se preferirem, ainda ninguém parece ter encontrado o remédio para ultrapassar o estado de quase anomia de muitas economias, especialmente as mais desenvolvidas, especial as da Europa e, nesta, as da Europa do Sul.
 
Politicamente a discussão está a aumentar de tom na Europa onde a Alemanha se opõe de forma cada vez mais aberta às políticas do Banco Central Europeu. No final da semana passado o ministro das Finanças de Berlim, Wolfgang Schaeuble, considerou mesmo que essas políticas estão a ter graves consequências políticas na Alemanha: “I said to Mario Draghi… be very proud: you can attribute 50% of the results of a party that seems to be new and successful in Germany to the design of this [monetary] policy”, de acordo com o relato da Reuters, Schaeuble vs Draghi. De acordo com essa análise este subida de grau na acrimónia pública tem uma razão: “What is behind this rhetorical escalation? It appears to be tied to growing concerns in Berlin about the knock-on effects of rock-bottom interest rates on pensioners. (…) The fear is that the AfD could seize on the issue of pensions to build on their recent gains. Suddenly, it seems, ECB policy has become a major political risk for the governing parties.”
 
Traduzindo por miúdos: taxas de juro muito baixas ou mesmo negativas afectam as poupanças de todos os que aforraram para velhice, e isso sente-se mais num país demograficamente envelhecido e uma taxa de poupança alta, como é o caso da Alemanha.
 
Mas se esta é a aparente razão política, o que dizem os economistas? Hoje, no Wall Street Journal, Ludger Schuknecht, economista-chefe do Ministério das Finanças alemão, argumentava que The World Doesn’t Need More Stimulus. Num texto que procura antecipar a divulgação das previsões do FMI, aquele responsável procura provar que o medo da falta de crescimento é exagerado: “Global growth is averaging slightly above 3% a year, just as it has been over the past three decades. For the G-20 nations, this is called moderate growth. It implies a doubling of global per capita income in little more than a generation. That’s hardly a disappointment.” No mesmo artigo também lamentava os efeitos que as política de estímulo estão a ter, ao contribuírem para aliviar a pressão a favor de mais reformas económicas: “Monetary policy is super stimulative in advanced economies, low commodity prices further support demand, and the fiscal stance is also neutral if not expansionary on average. The resulting ultralow financing costs for governments are buying time for reforms, although they also have the unfortunate consequence of slowing the reform process by reducing the sense of urgency.”
 
Na mesma Alemanha há quem pense de forma diversa, como seis economistas que publicaram ontem, no site do think tank Bruegel um texto intitulado Mere criticism of the ECB is no solutionEis a sua principal conclusão: “Instead of the ECB doing less, European policy-makers must do more. They need to act more decisively to set Europe back upon a growth path. Policy-makers, including in Germany, can no longer shirk their responsibility for the current economic situation in large parts of Europe. That calls for growth-friendly fiscal policy, structural reforms to open up new markets and consolidation and restructuring of the financial sector. We in Germany, above all, must look in the mirror, because we need the majority of these reforms just as urgently as our European neighbours do.”
 
Uma parte do problema é que poucos sabem de ciência certa o que se deve “fazer mais” agora que o BCE já disparou todas as bazookas que anunciou que iria utilizar. Disparou e continua a disparar, sobre a forma de quatitative easing, fornecendo liquidez aos mercados. É isso que constata Nouriel Roubini em O que se segue nas políticas monetárias não convencionais?, num texto do Project Syndicate publicado no Jornal de Negócios. O economista que ficou famoso por ter previsto a crise de 2007/2008, lamentava que “a economia política da maioria das reformas estruturais – devido ao seu custo inicial e aos seus benefícios tardios – implica que essas reformas progridam muito lentamente”, o que tem contribuído para que uma situação em que “gostemos ou não, os bancos centrais tornaram-se – e assim continua a ser – os únicos a poderem actuar quando se trata de dar apoio à procura agregada, aumentar o desempenho e prevenir a deflação”. O que tem feito com que “as políticas monetárias não convencionais – que já vigoram há quase uma década – acabaram por se tornar convencionais”, sendo agora necessárias ainda mais políticas menos convencionais.
 
Entre essas políticas não convencionais uma das que mais se tem discutido é a do chamado “dinheiro de helicóptero”, uma ideia que o Observador já apresentou de forma desenvolvida num Especial de Edgar Caetano, Atirar dinheiro de um helicóptero será a solução? Na última semana Luís-Aguiar Conraria voltou ao tema em E se chovesse dinheiro?, onde, depois de constatar que oquantitave easing não está a funcionar como se esperava – “o dinheiro é injectado nos bancos, mas, por alguma razão, não chega ao resto economia” – regressa à ideia do tal Helicopter Money proposta por Milton Friedman, e que deveria corresponder a colocar directamente dinheiro no bolso das pessoas – “Vamos agora imaginar que um dia um helicóptero sobrevoa uma comunidade e deixa cair mil dólares”. Só que, na sua perspectiva, se isso vier a acontecer não deve passar pelo filtro dos governos ou de Bruxelas, pois “porque, muito provavelmente, seria capturado pelos grupos de interesse mais activos”. Assim: “Como poderia o BCE distribuir dinheiro pelos cidadãos europeus? John Muellbauer, professor em Oxford, propôs que se entregasse 500€ a cada pessoa que tivesse número de contribuinte ou que se recorresse aos cadernos eleitorais. Isto, claro, com a garantia de não o pedir de volta. Ou seja, tratar-se-ia de uma dádiva e não um empréstimo, pelo que corresponderia a um aumento permanente da moeda em circulação.”
 
Este tema, assim como aquilo que os bancos centrais ainda podem fazer, é complexo, e quem desejar aprofundá-lo um pouco pode passar os olhos pela coluna Free Lunch do Financial Times:Central banks cannot escape the searchlights.
 
Já sobre o tópico com que abri esta newsletter, o da tensão crescente enter Berlim e Frankfurt, um bom apanhado do que se está a passar é o da Spiegel que, em Mario Bothers: Germany Takes Aim at the European Central Bank, nos conta como“Business and political leaders in Germany are increasingly frustrated with the monetary policies of European Central Bank head Mario Draghi. Recently, the confrontation has threatened to become damaging to the euro zone.”
 
Enquanto isto, em Portugal vamos desconversando
 
Como referimos no último Macroscópio, o da passada sexta-feira, a ida de Mario Draghi ao primeiro Conselho de Estado de Marcelo Rebelo de Sousa ficou marcada por uma intervenção que, para alguns, poderá ter representado um verdadeiro balde de água fria. Isso mesmo notava André Azevedo Alves no Observador este sábado, em O sério aviso de Draghi à “geringonça”. Em concreto, “Contrariamente ao clima de alheamento generalizado que se parece ter instalado no país com o estado de graça da “geringonça”, o que fica da passagem de Draghi pelo Conselho de Estado é um sério aviso relativamente à situação crítica da economia e das finanças públicas portuguesas. A estabilização conseguida nos últimos anos está longe de ser um dado adquirido e o BCE não pode garantir tudo, em especial quando confrontado com governos irresponsáveis.”
 
João Marques de Almeida foi porventura ainda um pouco mais longe na sua leitura dessa reunião, em Marcelo deu uma valente canelada a Costa, também publicado no Observador. Eis o seu ponto de vista: “Como é óbvio, Rebelo de Sousa conhece muito bem o pensamento de Draghi e as doutrinas do BCE. Como afirmaram os aliados anti-europeus do governo, o BCE fazia parte da “troika” e apoiou todas as políticas que este governo rejeita e que o PS criticou nos últimos quarto anos. Por isso, o Presidente certamente saberia que Draghi iria dizer o que disse. Convidar o presidente do BCE para deixar avisos ao PM e elogiar o legado do anterior governo e, simultaneamente, afirmando que a iniciativa visava ajudar o país, é Maquiavel no seu melhor.”
 
E António Costa, como foi que reagiu? Argumentando que não era com ele, ou mesmo que não era com Portugal. Numa entrevista ao Diário de Notícias, argumentou assim: “Cada país precisa das suas próprias reformas. Grande parte das mencionadas pelo presidente Draghi dizem certamente respeito a países que não Portugal. Por cá nunca houve um problema de legislação do trabalho.”
 
Temos assim que Draghi terá vindo a Lisboa falar ao Conselho de Estado sobre reformas que não dizem respeito a Portugal. Por isso, temos também suficiente por hoje. Tenham bom descanso, reencontramo-nos amanhã.

 
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