sexta-feira, 14 de outubro de 2016

EXPRESSO

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699



14 Out 2016


José Cardoso
POR José Cardoso
Editor Adjunto

 
Austeridade em versão low cost. Sondagem (e também fala de impostos). Tailândia com um ano de luto? Surpresa de outubro

Boa tarde,

Quer uma boa definição do Orçamento do Estado para 2017? É uma espécie de fim da austeridade em versão low cost. A expressão é do João Silvestre, que assim titula o artigo-chapéu da série de artigos em que a redação do Expresso “descasca”, sector a sector, o que prevêm as contas do Estado para o próximo ano. Para uma análise mais política, leia o que escreveu o Pedro Santos Guerreiro no artigo com que abrimos o Expresso Diário desta sexta-feira, que intitulou “eles não enlouqueceram”.

(E, já, agora, a crónica do Nicolau Santos, sobre uma coisa de que não tem dúvidas: “O garrote fiscal”)

E sabe o que pensam os portugueses sobre o aumento dos impostos sobre o álcool e o tabaco, ou o novo imposto sobre as “bebidas açucaradas”? No Expresso Diário desta sexta-feira publicamos a mais recente sondagem da Eurosondagem para o Expresso e a SIC. Fique a saber que a maioria é a favor. E pode verificar também quais são as intenções de voto e como está o sobe e desce da popularidade dos políticos.

Morreu o ex-deputado socialista e antigo ministro da Juventude e Desporto José Lello. Além do perfil deste político, o seu ex-colega de Governo Miranda Calha fala deste seu amigo, num depoimento recolhido pela Raquel Albuquerque.

Sabe o que é, nos Estados Unidos, a October Surprise (ou Surpresa de Outubro)? Pois quiseram fazer uma à candidata democrata à Casa Branca, Hillary Clinton, mas ainda não foi desta que conseguiram dar cabo dela. O Luís M. Faria explica tudo bem explicadinho.

E sabe porque é que a Tailândia decretou um ano de luto pela morte do Rei? Também nesta edição, a Manuela Goucha Soares explica o porquê da decisão (e não só).

E sabe o que acontece quando o poder não tem dinheiro? Fomos aos Arquivos Expresso e nesta edição (re)publicamos um artigo do historiador Rui Ramos publicado originalmente na Revista em que responde à pergunta, analisando todas as crises (financeiras, económicas, políticas e sociais) de Portugal desde o século XIX.

Na opinião, o Henrique Monteiro escreve sobre “Bob Dylan e a destruição do cânone”, o Henrique Raposo sobre a Colômbia e “A medida Mandela“ e o Daniel Oliveira sobre o “Forte de Peniche e a amnésia da democracia”.

Fazemos ainda a habitual apresentação dos principais temas da Revista E que chega este sábado às bancas (e em cuja capa está o código que lhe permitirá ler gratuitamente o Expresso Diário durante toda a próxima semana) e as também habituais sugestões culturais para o fim de semana, que lhe desejo excelente, com

Boas leituras, sem amnésias nem October Surprises


Ler o EXPRESSO DIÁRIO


Uma espécie de fim da austeridade em versão low cost
OE 2017 Medidas mais emblemáticas do Orçamento foram desenhadas de forma a (parecer) cumprir o prometido sem comprometer demasiado as contas. A sobretaxa afinal não acaba e as pensões aumentam os 10 euros exigidos pelos partidos de esquerda mas só no verão “ELES NÃO ENLOUQUECERAM” A análise de Pedro Santos Guerreiro


SONDAGEMPortugueses favoráveis a que se taxe o que faz mal à saúde
SONDAGEMPortugueses favoráveis a que se taxe o que faz mal à saúde


1944-2016José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
1944-2016José Manuel Lello Ribeiro de Almeida


Nicolau Santos

O garrote fiscal
 

Daniel Oliveira

Forte de Peniche e a amnésia da democracia
 

Henrique Raposo

A medida Mandela
 

Henrique Monteiro

Bob Dylan e a destruição do cânone
 


MUNDO

Um rei morre, a função pública faz um ano de luto: Tailândia, um país diferente


AMÉRICA

A October Surprise que não conseguiu dar cabo de Hillary


EMPRESAS

Amorim demite-se da Galp


ALGO ESTRANHO ACONTECE

O homem que ia deitar dinheiro pela janela


SUGESTÕES

Jane: um dos 9 acontecimentos deste fim de semana


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FUTURISMO

OBSERVADOR - MACROSC


Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!


É verdade. Aqui e além, neste ou naquele ano, o nome de Bob Dylan já fora ventilado como podendo ser o escolhido para o Nobel da Literatura. Mas a verdade é que quando esta quinta-feira a Academia Sueca anunciou a sua escolha – com uma semana de atraso, eventual sinal de que o processo de selecção não foi pacífico – muitos não esconderam a sua surpresa. E logo a seguir as opiniões dividiram-se, sendo certo que, como é tradicional nestas alturas, foram mais os que saltaram de contentes do que aqueles que se atreveram a discordar do nome escolhido para o Nobel de 2016. E alguns dos que o fizeram foram de imediato objecto de represálias – como sucedeu à escritora Alice Vieira, que viu a sua página na Wikipédia vandalizada.

Lendo o que foi publicado entre nós e na imprensa internacional, verifica-se que o debate seguiu duas linhas de fractura principais. Por um lado, se a obra de um criador de canções é ou não literatura e se, como tal, era ou não merecedora de um Nobel. Por outro lado, mesmo entre os que admitiam que a obra de Dylan mereceria um Nobel, não faltaram os que consideraram que a missão da Academia, e daquele prémio, não é a de consagrar uma celebridade como o cantor norte-americano.

Em Portugal talvez a primeira e mais entusiástica reacção a esta nomeação tenha sido a de Miguel Esteves Cardoso, no Público: Bob Nobel, nem menos. Para ele, não há dúvidas: “Bob Dylan merece o Prémio Nobel da Literatura. Bob Dylan escreve ensaios, ficção e poesia há mais de meio século. Inventou um mundo cheio de personagens, histórias e encantamentos, denúncias, crenças e fantasmas.” Mais: “Dantes toda a literatura se dividia em categoriazinhas de merda – canções, contos, ensaios, reportagens, ficções, peças teatrais, poesia. O júri do Nobel tem feito o enorme favor de voltar a confundir tudo.”

Já Bruno Vieira Amaral, aqui no Observador, foi claramente ambivalente em Bob Dylan não merecia: “Quase caí da cadeira. “strodmondstalet eigvarna”????? Estes gajos só podem estar a gozar. Mas pronto. Quanto ao vencedor, acho bem. Também acho um bocado mal. Enfim, ainda não sei. Foi, sem dúvida, uma escolha corajosa.” Mais adiante justificava assim o título da sua crónica: “Atribuir o prémio a Bob Dylan é um desperdício, uma espécie de parênteses em que a Academia preferiu celebrar-se a si própria e à sua veia provocatória, naquele género de provocação passivo-agressiva em que o galardoado é um mero instrumento de agressão. Portanto, mais do que lhe atribuir o prémio, a academia atirou-lho à cabeça. E o grande Bob Dylan não merecia.

Já Telmo Rodrigues, autor das teses "Bob Dylan: Música com Poesia" e "For a Lark: The Poetry of Songs", escreve, também no Observador, que o novo Nobel da Literatura, "um dos escritores mais importantes das últimas décadas". Em Bob Dylan está do lado certo da história nota que, por exemplo, “Se algum cantor merecia o prémio, Dylan era certamente o mais merecedor. Mas para quem gosta de Dylan, e acha que o prémio é justo, este não significa nada mais do que umas semanas de incómodo: pessoas que não gostam de Dylan farão piadas sobre o Nobel da Literatura não escrever livros ou sobre outros possíveis candidatos (e, conforme a qualidade humorística de quem se pronunciar, seguir-se-ão um conjunto de nomes distintos) que nos farão encolher os ombros e franzir o sobrolho. Depois regressará tudo ao normal: continuaremos a ouvir Dylan com a reverência que sabemos que merece e conservaremos a mágoa por não conseguirmos convencer mais pessoas de que este é um dos escritores mais importantes das últimas décadas.”

Já entre as reacções recolhidas pelo Expresso Diário (acesso pago), uma das mais curiosas, até pela sinceridade na surpresa, é a de Carlos Tê, em Músicas de Dylan tocam em coisas muito mais universais que muita literatura cons séria. Aí confessa que,Depois de algum tempo a digerir a informação, acho que a entrega do prémio tem a ver com uma espécie de legitimação da canção enquanto género respeitável e digno de figurar no panteão da Academia”. Mais: isso remete para “uma tradição oral que atravessou séculos de gente que não sabia ler, mas sabia cantar. Era uma das poucas forma de expressão, e que nos anos 60 encontra em Dylan um grande cultor, (…) também no patamar artístico quase de filigrana e dignidade poética que as canções atingiram.”

Para além das opiniões mais favoráveis ou mais críticas, foi muito interessante ver como alguns órgãos de informação recuperaram trabalhos sobre Bob Dylan ou apresentaram um pouco da sua obra, com especial foco nas letras das suas canções. Alguns destaques:
  • 10 poemas clássicos de Bob Dylan, uma selecção do Observador. A começar pelo clássico dos clássicos, de 1963: How many roads must a man walk down/Before you call him a man?/How many seas must a white dove sail/Before she sleeps in the sand?/Yes, and how many times must the cannon balls fly/Before they’re forever banned?...
  • Estou contente, triste, para cima, em baixo, dentro, fora, lá no céu e cá nas profundezas da terra”, um texto de Pedro Mexia no Expresso, originalmente publicado no passado mês de Setembro, em torno da ideia de que a entrevista pessoal é um género jornalístico que serve de algum modo para perguntar “quem é você?”, só que isso não se podia perguntar a Dylan.
  • O acidente de moto que salvou a vida de Bob Dylan, a recordação por João Cândido da Silva, no Observador, de um episódio de Julho de 1966. Aí se recorda, “Like a rolling stone, With no direction home. O mais famoso acidente de moto na história da música popular anglo-saxónica tinha fornecido a Dylan a porta de saída de que andava à procura para conseguir escapar a um modo de vida que ele próprio cantou.
  • A importância vital da cultura popular, de Nuno Pacheco no Público, onde se nota que, “Sem sugerir que os escritores, pela musicalidade das suas palavras, possam candidatar-se aos Grammy, há que reconhecer que o Nobel atribuído a Bob Dylan tem o mérito de sublinhar a importância vital da chamada cultura popular na fixação de uma identidade transversal a todas as fronteiras.”



Ao contrário de Portugal, onde raros são os que assumem abertamente as suas posições, sobretudo quando suspeitam que elas são minoritárias, nos Estados Unidos, pátria de Bob Dylan, não faltou quem se manifestasse abertamente contra a atribuição deste prémio. E é por aí que começamos, com um texto da Mens’s Lournal, The Case Against Bob Dylan's Nobel Prize Win. Escrito por Nate Brown, um actor e realizador norte-americano, defende que esta escolha não faz sentido: “Dylan’s recognition with the greatest global prize in literature strikes me as somewhat pointless. It’s not that I think he’s unworthy, exactly; it’s just that the opportunity cost of giving Dylan the prize is too high.” Esse preço é o de não ter aproveitado a oportunidade para chamar a atenção que um grande escritor menos conhecido, menos publicado, mas não menos talentoso: “Think of last year’s laureate: would any of us have been truly aware of Svetlana Alexievich’s brilliant and brutal oral histories of the Afghan war and the nuclear disaster at Chernobyl had she not won the Nobel Prize? Would we have such easy access to translations of Wisława Szymborska, Mario Vargas Llosa, or Herta Müller?

Na Slate o crítico Stephen Metcalf foi também bastante frontal: Bob Dylan Is a Genius of Almost Unparalleled Influence, but He Shouldn’t Have Gotten the Nobel. Na sua opinião, “The distinctive thing about literature is that it involves reading silently to oneself. Silence and solitude are inextricably a part of reading, and reading is the exclusive vehicle for literature.”

Já Jim Fusilli, crítico do Wall Street Journal, defende exactamente o contrário em Yes, Bob Dylan Deserves the Nobel Prize: “The Nobel Prize in Literature confirms his status as something more than a songwriter of a kind with those who preceded him. For those who follow him closely, savoring his witticisms, poignant observations and the unexpected word at precisely the right time, the acknowledgment is long overdue, with all respect to Messrs. Murakami, Roth, Sondheim and others. Sentence by sentence and verse by verse, Mr. Dylan’s body of work is worthy of maximum celebration.”

Colocados frente a frente estes contrários, vejamos ainda mais alguns textos que me chamaram a atenção:
  • Is Bob Dylan Literature?, um trabalho mais longo do Wall Street Journal que faz um apanhado de opiniões mais favoráveis e outras mais críticas. Mas dominam as opiniões a favor: “Citing Beat writers including Jack Kerouac and Allen Ginsberg (who was a friend of Mr. Dylan’s), Mr. Heylin says, “Something like ‘Hard Rain’s A-Gonna Fall’ could not exist without the Beats,” he said. “It’s to do with the line structure and the rat-a-tat-tat of imagery.”
  • Bob Dylan, Master of Change, de Greil Marcus no New York Times: “Mr. Dylan has put his words out into the world in vessels with too many dimensions to be broken down into elements: as songs. Think of a song as thrillingly alive with the furies of creation, discovery and experiment, with the resolution of each verse reaching a pitch of such insistence, humor and force that the next has to push further or die.”
  • Si Lorca pudo, Bob Dylan también, no El Español: “Hay muchas canciones que se pueden leer y poemas que se pueden cantar. ¡Nuestras cantigas y jarchas son canciones!”, suelta [el poeta, dramaturgo y músico] Álvaro Tato. ¿Eso quiere decir que el caso de Lorca y su Cancionero gitano es similar al de Bob Dylan? “¡Por supuesto! Lorca es el ejemplo moderno más claro de lo que estamos hablando. Nadie como Lorca ha logrado el equilibrio exquisito entre música y poesía. Lorca cantaba y bailaba, iba con la Argentinita, era un arte mucho más flexible…”

Para fechar, e fazê-lo de forma algo desafiadora, vou até ao site Quartz e a um texto que,no título e a propósito deste prémio, quase que diz tudo: The day we knew that people don’t care about books anymore. Para além de, também ele, abordar a controvérsia (reúne um conjunto de reacções no Twitter bastante fortes), acaba por colocar a questão incómoda:
In the US, the vast majority of Americans are still reading books, or at least starting them (finishing them is another story). But books appear to be losing their luster among young people. A survey of studies by Common Sense Media found that American teenagers are reading less for pleasure. As literary critic David Denby noted about teenage reading habits in the New Yorker, “reading anything serious has become a chore, like doing the laundry or prepping a meal for a kid brother. Or, if it’s not a chore, it’s just an activity, like swimming or shopping, an activity like any other. It’s not something that runs through the rest of their lives.”



Por mim, espero que pelo menos tenham lido esta newsletter até ao fim. E possam ler ainda mais a partir dela e das suas sugestões. Talvez com a ajuda da música de Bob Dylan, talvez dando mais atenção às suas palavras, a tais que lhe valeram o prémio.

Tenham um bom fim-de-semana.

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