Uma das imagens que guardo dos anos de brasa da troika é a da
conversa entre o ex-ministro das Finanças Vitor Gaspar e o alemão Wolfgang Schäuble, em fevereiro de 2012. Ali vimos tudo. Mais do que o então
“curvado” Gaspar(o alemão está numa cadeira de rodas), vimos sobretudo como na Europa nada se fazia sem o acordo de Schäuble. O poder não estava em Bruxelas. Nem na Comissão Europeia. Nem no Eurogrupo.
O poder estava na Alemanha de Schäuble. O que ficou ainda mais claro com a Grécia de Tsipras/Varoufakis.
Agora, referindo-se ao caso português, e ao encontro com Mário Centeno, o alemão quis usar a palavra
“confiança”. Mas não deixou de falar também em
“manter a palavra”: "Antes dele [António Costa] ser Presidente da Câmara de Lisboa, fomos os dois ministros e eu recordo uma relação de
confiança muito boa. Ele enviou-me os seus cumprimentos através do meu novo colega [Mário Centeno]. E se o meu colega
mantiver a sua palavra [na primeira tradução aparecia
“cumprir aquilo que disse”], ele também vai receber os meus cumprimentos", disse o ministro de Merkel
numa declaração que deu azo a várias interpretações (e traduções).
Ao referir-se à importância de
manter a palavra houve quem entendesse que o alemão estava a falar das
garantias deixadas por Centeno no Eurogrupo. Mas também houve quem dissesse que o alemão estava simplesmente a dizer que se Centeno
cumprisse a palavra os cumprimentos iam ser entregues a Costa. Enfim…lost in translation!?
Em Bruxelas, Mário Centeno -
“Mário” como foi tratado por Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo - deixou duas certezas: o esboço do Orçamento para 2016 será entregue no
início de janeiro. E o défice de
3% para este ano
“é muito importante para o país” – e decisivo para que Portugal deixe o
procedimento por défice excessivo -, mas com a ressalva de que o Governo ainda está a “apurar a informação” e que
não pode afirmar nenhum “número em definitivo”.Se internamente a questão do défice se tornou parte de um dispensável (e repetitivo) jogo político entre o Governo que entra e o que sai, na frente externa, Schäuble e as instituições europeias querem
ver para crer e “esperam que Portugal
cumpra as suas obrigações do Pacto de Estabilidade” (
a crise do euro não está esquecida, como lembrava no sábado o
Ricardo Costa). Numa lógica “
rei morto, rei posto”, mais do que os protagonistas que vão implementar as políticas, para Bruxelas o que verdadeiramente importa é que as contas batam certo. Para o “poder europeu” é preciso “
dar continuidade às políticas económicas de sucesso”, leia-se ao caminho seguido até aqui (e que nos levou à saída limpa,
“resultado pequeno” para Mário Centeno). Mas lembre-se que os
2,7% de défice previstos por Passos já foram à vida. E que pelo quarto ano consecutivo o seu Governo falhou as metas orçamentais por si definidas.
A tarefa também não será fácil para António Costa.
O PM caminhará sobre gelo fino, e num dificílimo equilíbrio entre Bruxelas e o exigente caderno de encargos das esquerdas (que até já reclamam o
fim das portagens da Via do Infante). E, ironicamente, as palavras de Schäuble chegam na mesma altura em que
Jerónimo de Sousa carrega na pressão. Se no fim-de-semana já tinha avisado o PS que
“não faria favores a ninguém”, ontem veio deixar claro que o
Governo de Costa não é uma “coligação de esquerdas”, mas do PS.
Treze dias depois da tomada de posse, ficou evidente que na
quadratura de António Costa, além de Jerónimo e Catarina, Schäuble também tem lugar marcado.
E o alemão já mostrou que consegue ser muito pouco “BFF”.Por falar em quadratura,
Pacheco Pereira (que hoje apresenta no Forte de Peniche,
o quarto volume de Álvaro Cunhal, Uma Biografia Política) foi ontem
“convidado” a abandonar o PSD pelo deputado social-democrata Duarte Marques:
“António Costa é menos raivoso contra o PSD do que Pacheco Pereira”. Marques, que falava na
SIC Notícias, mostrava-se chocado com o
suposto apoio de Pereira à candidatura de Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, às presidenciais. A polémica surge depois do
Expresso ter noticiado no sábado que Pacheco Pereira será um dos oradores de um Fórum organizado pela candidatura de Matias. O historiador e comentador já veio entretanto esclarecer na
Antena 1 que
“uma coisa é participar em sessões programadas, outra diferente é apoiar essas candidaturas”. E pelo meio deixou elogios a Marcelo Rebelo de Sousa.
Aproveito a deixa para lhe dizer que no próximo fim-de-semana o
Expresso publica, na sua edição em papel,
uma importante entrevista com Marcelo Rebelo de Sousa. O Correio da Manhã revela hoje uma
sondagem que o dá
a vencer à 1ªvolta (54,6%). O estudo mostra que Marcelo vai buscar votos a todo o eleitorado da direita à esquerda, com exceção do PCP.
FRASES“Pessoa que não seja conhecida terá acesso à Presidente”,
Maria de Belém ao Jornal de Negócios.
“São os recordes que vêm ter comigo”,
Cristiano Ronaldodepois de se tornar o primeiro jogador a marcar 11 golos numa fase de grupos da Champions.