|
|
VÍTOR MATOS
EDITOR DE POLÍTICA
|
|
|
O espectro que ronda a Europa
|
|
|
|
|
|
Bom dia!
A semana começa com notícias que nos devem fazer pensar (e preocupar) e que antecipam a possibilidade de haver um antes e um depois de maio de 2019. A extrema-direita continua a ganhar terreno, e desta vez foi na Suécia. Este espectro que ronda a Europa poderá ser determinante para a formação do próximo Parlamento Europeu - depois das eleições a meio do próximo ano - que poderá ser o mais anti-europeu de sempre, com forças de vários países que vão dos nacionalistas, a neo-fascistas e xenófobos que defendem o fim da União ou a saída dos respetivos países da aliança que ajudou a estabelecer o período mais duradouro de paz no continente. Na tão social-democrata Suécia, os Democratas Suecos, o partido de extrema-direita e anti-imigração, foi a terceira força mais votada este domingo com 17,6% dos votos (resultados provisórios), bem acima dos 12,9% que tinham conquistado em 2014 (mesmo assim, abaixo dos 25% que as sondagens previam, como explica o britânico The Guardian).
O partido mais votado (como acontece no país desde 1917), liderado pelo atual primeiro-ministro Stefan Löfven, foi o Social Democrata, mas com o resultado mais baixo de sempre: 28,4%. Os Moderados, de centro-direita, tiveram 19,8%. Os suecos vão agora ter semanas de negociações para a formação de um Governo, porque os dois blocos de esquerda e de direita (sem contar com a extrema-direita) estão empatados, com a diferença de um deputado, o que torna os populistas no fiel da balança caso não haja outros entendimentos: o bloco de partidos de centro esquerda teve 40,6% dos votos e o centro-direita obteve 40,2%. O primeiro-ministro já pôs de parte qualquer entendimento com os Democratas Suecos e disse que as forças partidárias do mainstream têm agora a “responsabilidade moral” de formar um Governo.
Pode ler aqui a análise do The Guardian, assim como a cobertura que o jornal fez em direto da noite eleitoral de ontem. O Político.eu destaca a incerteza que saiu das urnas suecas, e o El País coloca a questão que atravessa aquela sociedade nórdica: integração ou xenofobia? Em português, as informações atualizadas estão aqui no Expresso. O editor de internacional, Pedro Cordeiro, faz aqui uma análise aos resultados, onde diz que as “eleições exigem boa dose de ginástica sueca”. Álvaro Vasconcelos, ex-diretor do Instituto de Estudos de Segurança da União Europeia, diz no Público que os partidos democráticos não respondem à “grande inquietação da classe média”.
Por cá, este fim-de-semana também houve noite eleitoral, mas os contornos são diferentes, apesar do dramatismo dos últimos meses. Quando o tema é a bola, e sobretudo desde que descobrimos essa personagem tão interessante que se chama Bruno de Carvalho, nunca sabemos como acaba a história e não temos naturalmente a certeza sequer se a história acabará. Terminou (por agora) esta temporada lamentável de destruição de uma instituição. O Sporting tem uma nova direção: Frederico Varandas, o antigo diretor clínico do clube, ganhou as eleições mais participadas de sempre em Alvalade (22.400 votantes), e é de esperar uma atitude muito diferente, pelo menos para já, tendo em conta o que o novo presidente leonino disse à Sporting TV e que a Tribuna Expresso reproduziu: "Não vou misturar o Sporting com a minha vida pessoal. É a missão mais importante da minha vida, não tenho a menor dúvida de que estou preparado. Há mais uma oportunidade de abrirmos uma nova página e liderarmos o futebol português - em princípios éticos, e também desportivamente."
Prometer resultados faz parte do caderno de encargos. Com tudo aquilo que sabemos, é difícil acreditar num dirigente desportivo quando fala em ética. É um bocado como na política, mas pior. Na última Quadratura do Círculo, na SIC, José Pacheco Pereira - que detesta o mundo do futebol - comparou os grandes clubes à máfia e à cultura das organizações mafiosas. Há muito tempo que o futebol não é futebol: é negócio, muito dinheiro e influência social que tem criado um submundo que se aproxima da descrição exagerada do comentador. Não sabemos no que dará Frederico Varandas, mas esperemos que seja um bom princípio. Como fenómeno social de massas, com uma influência desproporcionada na sociedade, era melhor que o futebol fosse sobre bola. Mas não é.
Com a crise do Sporting em vias de acalmar, temos o Benfica com um processo muito complicado na justiça que o Ricardo Costacomentou no Expresso deste sábado: “A primeira coisa que qualquer português, mas em particular os benfiquistas, devem perceber no fim de uma semana agitada e polémica, é queisto não tem nada que ver com futebol”. Se esta frase tivesse “sportinguistas” pelo meio servia para o mesmo fim. A crise do Sporting nada teve a ver com desporto.
Frederico Varandas venceu as eleições com 42,3% dos votos, seguido por João Benedito com 36,8%. José Maria Ricciardi teve apenas 14,5%, Dias Ferreira resumiu-se a 2,3%, Fernando Tavares Pereira recebeu 0,9% dos votos e Rui Jorge Rego teve apenas 0,5%. Perante esta fragmentação de candidaturas, o vencedor começou por dizer, no seu discurso de vitória: “Começámos a vencer o adversário mais terrível, o Sporting fraturado”. Mas como o Pedro Candeias - editor de desporto - explicou na Tribuna Expresso, houve mais sócios a votar em Benedito (9.735) e não em Varandas (8.717), que na verdade venceu. Porquê? Porque nestes casos a lógica da democracia é diferente e cada sócio não vale apenas um voto: os mais antigos têm mais votos do que os mais recentes. O Observador explica quem foram os vencedores e os derrotados.
Termina assim mais um consulado (desta vez provisório e transitório) de Sousa Sintra à frente do Sporting, que segurou o clube na fase pós-Bruno de Carvalho. Se ainda não teve oportunidade, pode ler aqui a entrevista do empresário ao Expresso deste fim de semana, em que o dirigente leonino diz que “em três meses” não fez outra coisa senão pensar no clube: “Só faltou trazer para aqui a cama. Abandonei a minha vida toda pelo serviço ao Sporting”.
|
|
OUTRAS NOTÍCIAS
A política nacional aqueceu este domingo com a linguagem metafórica muito criativa dos líderes. No encerramento da tradicional Universidade de Verão do PSD, Rui Rio atacou o Governo de forma violenta por causa do furto do material militar em Tancos - disse que o Executivo “foi incapaz e não tem respostas para dar” - , mas apontou à investigação judicial: o país tem de exigir ao Ministério Público respostas para que “faça rapidamente a investigação e diga o que se passou”. As metáforas que usou é que motivaram depois a reação do PS. Uma com os “gatunos” que chegaram à guerra mas a guerra “estava fechada”. E outra: “"Afinal, em Portugal consegue-se roubar material militar da mesma forma que se consegue entrar num jardim para roubar umas galinhas." Depois do comunista Jerónimo de Sousa ter dito sobre o Orçamento que o Governo não pode “contar com o ovo do dito cujo da galinha”, a imagem usada pelo líder do PSD motivou a resposta do ministro da Defesa, que esta quarta-feira será ouvido no Parlamento sobre o assunto. Azeredo Lopes reagiu dizendo que em “política, como noutras esferas da vida, não devia valer tudo”. A secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes também veio a público atacar Rio e acusá-lo de ter demonstrado “ter escolhido o caminho mais fácil, o caminho derrotista, do bota-abaixo, de dizer que está tudo mal”.
Embora tenha suscitado a reação do Governo, o que é positivo para quem tem sido acusado de ser demasiado brando, a performance de Rui Rio continua a ser criticada pelo seu companheiro de partido (e antecessor) Luís Marques Mendes. No seu comentário dominical na SIC, o social-democrata acusou o atual líder de ser “incendiário”, por ter concentrado as suas críticas nos adversário internos e não no primeiro-ministro. “Ao longo de oito meses de liderança, alguém se lembra de uma causa ou proposta política do PSD? Não, só de críticas internas. Alguém se lembra do que Rio disse há uma semana no Pontal? Não, só de críticas internas”, apontou ontem à noite Marques Mendes. Pode ver aqui texto e vídeo.
No discurso de encerramento da Festa do Avante!, Jerónimo de Sousa discursou quase uma hora perante a militância comunista para destacar os avanços” conseguidos na legislatura (e que se devem mais à pressão do PCP do que à vontade do PS, segundo Jerónimo). E apontou as críticas habituais ao Governo do PS. Fica implícito que, não contando o Governo com o ovo no dito cujo no Orçamento, também não é caso para esperar o contrário. “O secretário-geral do PS afirmou há dias que não há governo de esquerda sem o PS. O que os portugueses sabem é que sempre que o PS foi governo o que houve foi política de direita”, afirmou o líder comunista para sublinhar a necessidade de o PCP condicionar os socialistas à esquerda.
Se não esteve com atenção à política no fim-de-semana, pode ler aqui o texto da Mariana Lima Cunha sobre a rentrée do CDS: “Acreditem em mim, acreditem comigo!”: Cristas em campanha a todo o vapor”. Até jogou matraquillhos com Nuno Melo.
Sobre o tema quente do fim deste verão, o Bloco de Esquerda critica a “tentativa de partidarização” sobre PGR e recusa “campanhas”. Catarina Martins diz que o BE não se pronunciará sobre se Joana Marques Vidal deve ser ou não reconduzida.
Nos dias em que se soube os resultados das entradas na universidade - metade das instituições do interior conseguiram mais alunose quatro cursos do técnico tiveram média superior a 18 valores - também ficámos a saber que três mestrados portugueses em gestão estão entre os melhores do mundo.
Ainda sobre educação: os problemas commanuais gratuitos em Lisboa vão estar resolvidos até ao arranque do ano letivo.
A polémica sobre o artigo anónimo de um membro da equipa de Trump no The New York Times continua a ter desenvolvimentos nos Estados Unidos: “Pence e os planos de afastar Trump do poder: “Não. Nunca. Porque faria isso?” Já o próprio Donald Trump congratulou-se “com ausência de mísseis em desfile militar norte-coreano”.
Em Angola, o momento não foi apenas um testemunho de passagem. José Eduardo dos Santos cedeu a liderança do MPLA ao Presidente João Lourenço este fim-de-semana. Pode ler aqui “o canto do cisne de José Eduardo dos Santos”, por Gustavo Costa, o correspondente do Expresso em Luanda.
Já que estamos a falar de internacional, se é um frequent flyer, fique a saber que Easyjet, Transavia, Brussels Arlines e várias outras companhias low-cost contactadas pelo Expresso asseguram que não vão passar a cobrar a bagagem de cabina, ao contrário do que fez a Ryanair.
No desporto, destaque para o ténis. Seguiu a polémica com Serena Williams e o árbitro português? O Diogo Pombo oferece-lhe, na Tribuna, o retrato de Naomi Osaka, que venceu o US Open e bateu a estrela norte-americana: “A nova e comedida estrela, nascida na terra do sol nascente”. No torneio masculino, Novac Djokovic ganhou a Martin del Potro.
Destaque também para Miguel Oliveira, que ficou em 2º lugar no Grande Prémio de Moto 2 em São Marino e continua na luta pela liderança do mundial.
Não se esqueça que Portugal joga hoje para a Liga das Nações, contra a poderosa Itália, às 19h45, no Estádio da Luz. Ronaldo não está, mas a selecção deu boa conta de si no jogo da semana passado contra a Croácia.
No Público, Daniel Oliveira, diretor-geral da SIC, dá uma entrevista para explicar a contratação do ano no mundo televisivo: "A transversalidade da Cristina Ferreira é muito importante para a SIC”
AS MANCHETES DO DIA
Público: “Europa lança taxas sobre navios para tirar lixo do fundo do mar”.
Correio da Manhã: “Estado gasta 1.100 milhões fora da lei”
i: “Rio irrita ministro da Defesa com brincadeira sobre galinhas…”
Jornal de Notícias: "Medidas para baixar peso das mochilas ficaram na gaveta”
Negócios: “Fisco vai cobrar dívidas à Ordem dos Advogados”
O QUE ANDO A LER
Como uma vida aparentemente banal pode ser tão interessante... Mais do que o interesse de uma vida, o que importa verdadeiramente é a arte do escritor a descrevê-la. A máxima serve tanto para verdadeiras biografias como para as ficcionadas, como a de William Stoner, criada em 1965 por John Williams (1922-1994). “Stoner” é um grande livro. Li-o depressa e com gosto estas férias, aconselhado por um amigo que se apaixonou de tal forma pela história que, de forma algo exagerada, o classifica como um dos melhores livros do último quarto do século XX. O jornal britânico The Guardian considerou-o uma das leituras obrigatórias em 2013. No mesmo ano, a New Yorker descreveu-o como o melhor romance americano de que você nunca ouviu falar.
O livro conta a história de um professor universitário de literatura medieval e renascentista, de origens camponesas, que nos parece a epopeia de um falhado, tão falhada como parecia ser a performance do próprio livro: “Stoner”, apesar de ter vendido apenas dois mil exemplares nos Estados Unidos no ano em que foi lançado, tornou-se um best-seller na Europa cinquenta anos depois, quando uma editora francesa reparou nele e o traduziu sem adivinhar o sucesso tardio que viria a ter.
Parece uma vida banal, a do homem que morre logo no primeiro parágrafo da primeira página, deixando nos outros uma marca de quase indiferença, embora nenhuma vida seja banal. Se pensarmos um pouco, acaba por ser também um livro sobre o ciclo da vida e do esquecimento. Nascemos, vivemos, morremos, e depois somos esquecidos ou lembrados por uns anos até que aqueles que nos conheceram e nos recordam também morrem e no fim fica um nome numa lápide, ou, no caso de Stoner, uma inscrição na biblioteca da faculdade. Fica o esquecimento. Ou um livro, no caso dele fica um livro, pelo menos ele acreditava que o seu livro permanecia. Não vou revelar a história, mas a narrativa contempla de certa forma o sonho americano da mobilidade social, um casamento estragado, uma paternidade falhada, e aspetos como as guerras e ódios académicos nas faculdades (como aqueles que todos nós conhecemos das nossas faculdades).
Num epílogo ao romance, com data de 2002, publicado na 6ª edição da D. Quixote, o escritor irlandês John McGahern cita uma rara entrevista de John Williams, dada já no final da sua vida, em que este fala de “Stoner”: “Penso que ele é um verdadeiro herói. Muitas pessoas que leram o romance acham que Stoner levou uma vida muito triste e má. Eu julgo que ele teve uma vida ótima. Teve, certamente, uma vida melhor do que a maior parte das pessoas. Fez o que gostava de fazer, tinha uma certa noção do que fazia e da importância do seu trabalho. Foi testemunha de valores que são importantes. O mais importante no livro, para mim, é a noção que Stoner tem do que é um emprego. Lecionar é para ele um emprego, um emprego no sentido melhor e mais honrado do termo. O emprego deu-lhe um tipo especial de identidade e fez dele quem era”. Bom, mas o melhor é mesmo lê-lo.
Deixo apenas mais uma sugestão de leitura: estahistória contada na The New Yorker, sobre uma família de gangsters de Amesterdão, que dará em breve uma série televisiva. A reportagem de Patrick Radden Reefe começa por descrever apenas os olhos azuis de Astrid Holleeder, a irmã de Willem Holleeder, o criminoso mais famoso da Holanda, que na juventude começou a carreira mafiosa com o rapto do patrão da cerveja Heineken nos anos 80 - pelo qual chegou a ser preso, mas que o deixou rico e à família, uma vez que nunca devolveu os milhões recebidos pelo resgate. Muito sangue e mortos depois, Wim está preso e Astrid vive escondida e com medo, mascara-se para ir à rua e fala em tribunal sem que se lhe veja a cara, de modo a não poder ser identificada. É a principal testemunha de acusação do irmão, cujas conversas gravou para o poder incriminar. Ela sabe ou está convencida de que os sicários que ele tem cá fora a vão matar assim que tiverem oportunidade. Uma grande história, mas sobretudo uma enorme reportagem.
Tenha um bom dia e uma ótima semana!
|
|
|
Sem comentários:
Enviar um comentário