quarta-feira, 20 de abril de 2016

EXPRESSO - 20 DE ABRIL DE 2016


Um desabafo e… peixes verdes

Para: antoniofonseca1940@hotmail.com


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Expresso
Bom dia, já leu o Expresso CurtoBom dia, este é o seu Expresso Curto 
Luísa Meireles
POR LUÍSA MEIRELES
Redatora Principal
 
20 de Abril de 2016
 
Um desabafo e… peixes verdes
 
Permitam-me primeiro um desabafo, à laia de confissão: não gosto da ditadura do “politicamente correto”, sobretudo quando aplicado às causas que não o merecem de todo. E acredito pouco numa linguagem neutra, pela simples razão que não o somos. Ninguém é. Acredito nas virtudes da aprendizagem, da educação e da evolução, mas francamente, não compreendo: como é que eu, mulher, trabalhadora, devedora e credora de direitos e deveres, me sinto mais incluída na sociedade se passar a ter um cartão de cidadania, em vez do atual cartão de cidadão? Atingirei o tal teto de vidro por causa disso? Tenho dúvidas. A discriminação sexista – e que existe, feia, forte e bruta - não passa por aqui, esconde-se em outros detalhes.

Espantado o leitor? Tem razão. Não é tema. Mas fiquei sobressaltada quando ontem li esta pequena noticia sobre a possibilidade do Governo admitir mudar o nome do dito. Com uma espécie de tempestade das grossas a gerar-se sobre as nossas cabeças, isto não é assunto e não acredito que a grande maioria dos portugueses o veja como tal. Sejamos sérios. Questionado sobre a proposta bloquista, o ministro-adjunto admite pensar para o futuro e sem encargos com a substituição dos cartões. Espero que haja bom senso. Há um bloco de medidas que o Governo pretende implantar em termos de igualdade e seguramente que esta não pode ser a principal.

Tema sim é o dos peixes verdes que habitam os olhos de Isabel dos Santos, para glosar o texto que o meu colega Nicolau Santos aqui escreveu ontem: o problema gigante que começa a esboçar-se depois do súbito anúncio, no sábado, de que, afinal, já não havia acordo entreIsabel dos Santos e o Caixabank no BPI, a OPA lançada por aquele sobre este, tudo agravado pela tomada de posição da filha do Presidente angolano sobre o “diploma BPI”, que considerou “sem precedentes e parcial”. “Uma lei à medida”, chamava-lhe Santana Lopes, “uma lei fotografia”, dizia por sua vez António Vitorino no programa de comentário de ambos ontem, na SIC. Os termos do comunicado são duríssimos (na íntegra aqui), o BPI não faz por menos, (e também aqui) acusando a empresária angolana de mentir. O Governo ainda não reagiu, mas o Público conta que o diploma causou tensão dentro do Executivo. Só pode estar preocupado, dado o historial das relações entre Portugal e Angola e a interligação profunda entre as duas sociedades, nomeadamente do ponto de vista económico. O João Vieira Pereira comenta.

Soluções? Por enquanto não há, embora haja muitas possibilidades, como reconhecia ainda ontem o Primeiro-ministro em conversa com os jornalistas na festa de aniversário do PS. Ainda há esperança. Consequências? Vamos aguardar. Retaliação à vista? Provavelmente. Dificuldades? Mais que certas. Sob que forma? Esperam-se várias e de vários lados. Vai ser mau para ambos os países? Com certeza. Lembre-se do Mantorras, titulava o Observador, o jogador angolano que foi apanhado a conduzir com uma carta de condução angolana, não válida em Portugal, e gerou uma vaga de detenções de portugueses em Angola pelo mesmo motivo. Não vai ser bonito de ver e não ser bom para nenhuma das partes. É a parte em que os políticos têm de agir com pinças e demonstrar todos os seus talentos.
 

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OUTRAS NOTICIAS
São sempre na mesma onda. Quando o Governo de António Costa tomou posse, quis por a política à frente das finanças e inventou-se até uma palavra: a desfinanciarização do discurso. Tal como estão as coisas, não é possível tão cedo. A política regressou ao palco, é certo, mas é de finanças que se fala ainda e sempre.

Exemplos? Banif. A Comissão de Inquérito segue o seu curso mas não promete grandes resultados. Entre o que o ministro Mário Centeno e o governador do Banco de Portugal disseram ou terão dito e o que quiseram dizer, ficou o “jogo do entala”, como dizia Rui Tavares. Quem entala ou quer entalar quem? Certo é que, depois das inflamadas intervenções do BE e do secretário de Estado Mourinho Félix sobre a falha grave de Carlos Costa e interrogações sobre o que disse ou não disse o ministro, eis que, ontem, o tom baixou de intensidade, como aqui explicam a Alexandra Simões de Abreu e a Isabel Vicente ou o DN aqui e aqui.

Sobre o que verdadeiramente aconteceu com o banco-que-já-era há de ficar sempre uma nebulosa. Entre as regras da Comissão Europeia(leia-se interpretação livre da Direção Geral de Concorrência), o papel do BCE e do Banco de Portugal e ainda do ministro das Finanças (que ainda ontem reafirmou que não disse quaisquer falsidades, como lhe imputava o PSD) há atas barradas a preto, deveres de sigilo e escasso controlo. A seguir.

Depois, a Comissão Europeia veio, mais um vez (e ainda dizem que não há ideologia na Comissão!), colocar baias ao Governo: aumentar o salário mínimo não resulta. António Costa respondeu-lhe ontem: “não estamos condenados a viver num país de baixos salários”. É a resposta taco-a-taco, nas vésperas do Governo aprovar em Conselho de Ministros e apresentar o Programa de Estabilidade, que o Primeiro-ministro refere como um “anexo” ao que considera importante: o Programa Nacional de Reformas, onde se contêm as reformas que quer implantar e a propósito do qual prometeu também surpresas.

Quanto ao Programa de Estabilidade, houve reunião ontem entre os parceiros sobre o assunto. Não há sombra de plano B. Mas o ministro Centeno disse que vai haver abrandamento do crescimentoda economia: 1,8% para o ano. Será também amanhã que será aprovada a descida do IVA para restauração. O BE, entretanto, apresenta hoje um programa económico alternativo, em jeito de contributo... e pressão.

Também amanhã é dia da função pública: o Governo paga a segunda fatia de 25% da reposição dos cortes dos seus salários. EAntónio Mexia vai ganhar 2,6 milhões/ano.

Depois, quanto ao gasóleo, tão logo o Governo anunciou a redução dos preços do gasóleo e de portagens em ex-scuts para transportadores profissionais, veio logo o argumento dos restantes:então e eu? É o que diz o presidente do ACP, Carlos Barbosa, de quem se fala poder vir a ser candidato à Câmara de Lisboa. Quanto à guerrados suinicultores continua. Deu dois manifestantes detidos e um ferido.

E ainda há o aspeto social da crise82 pessoas por dia pedem ajuda à Deco por causa do sobre-endividamento. O gráfico é estarrecedor: a confirmar-se a tendência pode chegar-se ao fim do ano com quase 30 mil pedidos de ajuda, mais do que o registado em 2014 e 2015. Mas então a crise ainda não tinha acabado? Nãããão.

Virando a página do económico, aterramos em Lisboa. Atenção, lisboetas, preparem-se para um longo período de obras (vêm aí eleições, não se esqueçam): as da nova Feira Popular começam até ao fim do ano, as do chamado Eixo Central da cidade já esta semana. Mas a capital vai ficar mais bonita, haja paciência. O presidente da Câmara anunciou-o ontem.

Ah, e não perca esta deliciosa notícia sobre o comunista que o Bloco desviou para as negociações com o PS sobre a pobreza. Chamam-lhe oChalana e sabe a potes do assunto. Apela à sublevação dos pobres.

Lá fora
Ainda o Brasil, que não nos cala o espanto. O Ricardo Costa acha que só quem não acompanha a política deste país se surpreende, mas eu, que não lhe perco o rasto, pasmo. Assombra-me mesmo a impunidade, o descaramento, a desfaçatez, a intolerância, o ódio. É o Brasil diante do abismo sem fundo, como se percebe nesta notícia: o corrupto Eduardo Cunha entregou o impeachment e deve receber a amnistia em troca. E o povão vai deixar?

E, claro, os Estados Unidos, cuja caminhada em direção às presidenciais se jogou ontem nas primárias de Nova Iorque. São as mais disputadas em décadas sem claros vencedores ainda nem entre Republicanos nem Democratas. Nova Iorque é o segundo estado com mais representantes depois da Califórnia, com 291 delegados, dos quais 44 são superdelegados. O Luís Faria explica o que está em causa. O El Mundo diz que para os republicanos ou é Trump ou uma guerra civil. Foi Trump e Hillary, sem margem para dúvidas, diz oNew York Times, que também mostra como está a corrida global. Se quiser ler em português, veja aqui.

Da Rússia, diz o Inteligência Económica que vem aí “Grande malandrice”: Putin anunciou a desclassificação de milhares de documentos entre 1930 e 1989 e parece que vão aparecer muitos "cadáveres políticos" (diz ele). Aguardemos.

Em Espanha, começou a contagem para as eleições do 26-J (26 de junho, à portuguesa), mas os socialistas não dão tudo como perdido e fazem fé ainda numa investidura. Em França, desde 31 de março que há manifestações na Praça da República todos os dias contra a alteração das leis do emprego.

Mais um toque de Europa: o desmantelamento de Schengen, de que tanto se tem falado por causa dos refugiados, custaria à Europa algo como 15 mil milhões de euros por ano. Com tantos problemas para resolver, ainda vamos comprar mais este? E um ultimato: o da Turquia, que promete fazer tábua rasa do acordo com a União Europeia se não forem levantadas as restrições aos vistos até junho.

O autoproclamado Estado Islâmico promete intensificar a estratégia de terror: agora diz que o alvo serão as praias de França, Itália e Espanha, alvos impossíveis de proteger. Um arrepio. A França anunciou o prolongamento do estado de emergência e o Governo português disse que quer tornar o Algarve "o destino turístico mais seguro da Europa". Espero que sim. Em nome de todos nós.

FRASES
"O ajustamento implicou a perda de muitos graus de liberdade no que diz respeito à capacidade de definirmos o caminho a seguir",Miguel Albuquerque, presidente do Governo regional da Madeira, ao Público.

"Se a senhora ministra da Administração Interna disser que a Caixa Geral de Aposentações está a aplicar bem o corte, teremos de partir para a luta", Peixoto Rodrigues, presidente do Sindicato Unificado da Polícia, ao I.

"Visto de Barcelona ou Madrid, o nosso terrritório é um espaço regional no contexto da Península Ibérica"Eduardo Catroga, ex-ministro das Finanças, ao I.

"Portugal não pode ser uma economia-filial"Sandro Mendonça, economista e professor no ISCTE

O QUE ANDO A LER
Dois pequenos livros, em tudo diversos. Explico. O poeta e embaixador Luís Filipe Castro Mendes, o novo ministro da Cultura, deveria reformar-se em breve e, nessa expectativa, escreveu um livro, de poesia, claro: “Outro Ulisses regressa a casa” (Assírio & Alvim). A vida trocou-lhe as voltas. Regressou a casa, sim, mas não para a reforma. Agora que está no cargo, tenho vontade de lhe perguntar: “Quem encontraste hoje que te oferecesse / o puro leite da ternura humana / e não o mel da lisonja ou a indiferença comum?” Chamou-lhe poema de Natal e eu, abusivamente, chamo-lhe de ministro.

O outro foi uma descoberta, um pequeno livro que não aspira a ser mais do que servir para recolha de fundos para uma das mais nobres e desconhecidas causas: o Resgate de crianças escravas no Gana, que a jornalista Alexandra Borges escreveu a meias com a sobrinha. O livro não é novo, mas veio-me parar às mãos por um acaso e lê-lo foi uma revelação. Na pátria de Kofi Anan, há crianças também chamadas kofies, não porque nasceram a uma sexta-feira, como o ex-secretário-geral da ONU, mas porque foram vendidas nesse dia da semana. Valeram 30 euros aos pais, tinham 3 ou 4 anos, não sabem o nome nem a idade. Trabalham para os pescadores do lago Volta 14h por dia, 7 dias por semana. E morrem. É um crime contra a Humanidade e a Alexandra teve a coragem e a persistência de lutar por elas. Fundou uma ONG, Filhos do Coração. Eu não sabia. E o leitor, sabe?

Ding-dong! Tempo de terminar! Tenho um bom dia! É Primavera e, por enquanto, há Sol.

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