segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

DIA INTERNACIONAL DA EDUCAÇÃO - 24 DE JANEIRO DE 2022

 

Educação básica

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

educação básica ou ensino básico é o nível de ensino correspondente aos primeiros anos de educação escolar ou formal. Esta denominação corresponde, consoante o sistema educativo que o ministra, a um conjunto específico de anos de escolaridade, correspondendo, na generalidade dos casos, aos primeiros seis a nove anos.

De acordo com a Classificação Internacional Normalizada da Educação (ISCED), a educação básica inclui:

  1. Primeiro estágio ou educação primária: correspondente à aprendizagem básica da leitura, da escrita e das operações matemáticas simples;
  2. Segundo estágio ou ensino secundário inferior: correspondente à consolidação da leitura e da escrita e às aprendizagens básicas na área da língua materna, história e compreensão do meio social e natural envolvente.

Alguns sistemas educativos, em particular os de países em desenvolvimento, incluem na educação básica a educação pré-escolar e os programas de ensino de segunda oportunidade destinados à alfabetização de adultos, dando ao educando que não frequentou o ensino regular a oportunidade de concluí-lo, com objetivo de uma educação para todos e promover melhora do desenvolvimento social.

Num contexto mais genérico, "educação básica" designa o conjunto de atividades educativas, formais, não formais e informais, destinadas a satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem, em geral correspondentes aos primeiros estágios do processo de alfabetização.

Objetivos da educação básica

A oferta da educação básica universal é considerada como uma das principais prioridades para iniciar o processo de mudança social e de desenvolvimento sustentado dos países em vias de desenvolvimento, sendo por isso o objectivo do programa Educação para Todos (Education For All) patrocinado pela UNESCO.

Múltiplos estudos provam que a expansão da educação básica se repercute diretamente na melhoria dos padrões de saúde pública, na demografia e na economia. Outros benefícios da escolarização, embora mais difíceis de medir, são a melhoria da governança e da estabilidade política, resultando em geral, mas nem sempre, na criação de condições propícias ao desenvolvimento de democracias representativas e na melhoria acentuada do respeito pelos direitos humanos.

Os efeitos sobre a saúde pública incluem a redução da taxa de infeção pelo vírus causador da SIDA, melhoria das taxas de vacinação e ganhos acentuados na prevenção e no tratamento das doenças. Em associação com esses efeitos está em geral uma melhoria nas condições de higiene e ganhos acentuados em matéria de nutrição.

Outro efeito demonstrado, em geral associado com as mudanças demográficas induzidas, é a redução das taxas de mortalidade infantil e de morbilidade maternal. Está também demonstrado que o aumento da literacia conduz à aceleração da transição demográfica, ao aumento da esperança de vida e a um melhor uso dos mecanismos de controlo da natalidade, reduzindo as gravidezes indesejadas e a pobreza entre as crianças. Também se demonstrou o seu efeito na redução da desigualdade de género, traduzindo-se em geral em grandes ganhos em matéria dos direitos das mulheres e na sua taxa de participação no mercado de trabalho.

Do ponto de vista económico, a melhoria na literacia resulta no aumento da produtividade das sociedades, com o consequente aumento do poder de compra e na procura de serviços.

Os efeitos sobre a governança e a democraticidade das sociedades parece resultar do aumento da capacidade de compreensão dos mecanismos de resolução não violenta de conflitos, da facilitação do acesso a informação confiável e da melhoria da autoconfiança e da compreensão das diferenças entre grupos sociais.

Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada no seio da UNICEF e da Assembleia Geral das Nações Unidas em 1989, estabelece a educação básica como um dos direitos inalienáveis das crianças, estabelecendo os padrões mínimos a que deve obedecer.

Brasil

No Brasil, a educação básica compreende a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, e tem duração ideal de dezoito anos. É durante este período de vida escolar que toma-se posse dos conhecimentos mínimos necessários para uma cidadania completa. Serve também para tomada de consciência sobre o futuro profissional e área do conhecimento que melhor se adapte.

No Brasil a educação básica encontra-se dividida nas seguintes etapas:

Educação infantilIdades
Creche0 a 3 anos
Pré-escola4 a 5 anos
Ensino fundamental[nota 1]Idades
anos iniciais - 1º ano ao 5º ano
1º ano6 anos
2º ano7 anos
3º ano8 anos
4º ano9 anos
5º ano10 anos
anos finais - 6º ano ao 9º ano
6º ano11 anos
7º ano12 anos
8º ano13 anos
9º ano14 anos
Ensino médioIdades
1ª ano15 anos
2ª ano16 anos
3ª ano17 anos

Número de estudantes

Em 2014, o Brasil possuía 49 771 371 de estudantes matriculados na Educação Básica, nas redes públicas e privadas de ensino, contra 56 174 997 em 2004. Historicamente, este número tem apresentado queda relativamente constante, em especial por conta da queda na taxa de fecundidade, que hoje é de 1,72 filho por mulher contra 2,39 em 2000, ou seja, pela gradual diminuição do número de crianças em idade escolar. Entre os anos 2000 e 2014, a educação infantil obteve, no entanto, um incremento de 2,52 milhões de matrículas, parcialmente justificada por uma mudança cultural dos pais em relação a essa etapa de ensino bem como pelo crescimento do número de casais em que ambos os cônjuges trabalham e, portanto, não podem cuidar de seus filhos durante o dia.[2][3][4]

Portugal

Em Portugal, a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) estabelece nos seus artigos 6.º a 8.º que o ensino básico é universal e gratuito, com uma duração de nove anos escolares, sendo obrigatória a frequência para as crianças entre os 6 e os 15 anos de idade.

Constitui a primeira parte da educação escolar, à qual se seguem o ensino secundário e o superior.[5]

As escolas públicas onde é realizado o ensino básico, têm a designação genérica de escola básica, existindo várias tipologias, de acordo com os níveis de estudos aí ministrados.

Objetivos do ensino básico

A LBSE estabelece os seguintes objectivos para aquele nível de ensino:

  • Assegurar uma formação geral comum a todos os portugueses que lhes garanta a descoberta e o desenvolvimento dos seus interesses e aptidões, capacidade de raciocínio, memória e espírito crítico, criatividade, sentido moral e sensibilidade estética, promovendo a realização individual em harmonia com os valores da solidariedade social;
  • Assegurar que nesta formação sejam equilibradamente inter-relacionados o saber e o saber fazer, a teoria e a prática, a cultura escolar e a cultura do quotidiano;
  • Proporcionar o desenvolvimento físico e motor, valorizar as atividades manuais e promover a educação artística, de modo a sensibilizar para as diversas formas de expressão estética, detetando e estimulando aptidões nesses domínios;
  • Proporcionar a aprendizagem de uma primeira língua estrangeira e a iniciação de uma segunda;
  • Proporcionar a aquisição dos conhecimentos basilares que permitam o prosseguimento de estudos ou a inserção do aluno em esquemas de formação profissional, bem como facilitar a aquisição e o desenvolvimento de métodos e instrumentos de trabalho pessoal e em grupo, valorizando a dimensão humana do trabalho;
  • Fomentar a consciência nacional aberta à realidade concreta numa perspectiva de humanismo universalista, de solidariedade e de cooperação internacional;
  • Desenvolver o conhecimento e o apreço pelos valores caraterísticos da identidade, língua, história e cultura portuguesas;
  • Proporcionar aos alunos experiências que favoreçam a sua maturidade cívica e sócio-afectiva, criando neles atitudes e hábitos positivos de relação e cooperação, quer no plano dos seus vínculos de família, quer no da intervenção consciente e responsável na realidade circundante;
  • Proporcionar a aquisição de atitudes autónomas, visando a formação de cidadãos civicamente responsáveis e democraticamente intervenientes na vida comunitária;
  • Assegurar às crianças com necessidades educativas específicas, devidas, designadamente, a deficiências físicas e mentais, condições adequadas ao seu desenvolvimento e pleno aproveitamento das suas capacidades;
  • Fomentar o gosto por uma constante atualização de conhecimentos;
  • Participar no processo de informação e orientação educacionais em colaboração com as famílias;
  • Proporcionar, em liberdade de consciência, a aquisição de noções de educação cívica e moral;
  • Criar condições de promoção do sucesso escolar e educativo a todos os alunos.[5]

Organização do ensino básico

A LBSE dispõe que o ensino básico compreende três ciclos sequenciais, sendo o 1.º de quatro anos, o 2.º de dois anos e o 3.º de três anos, organizados nos seguintes termos:

  • No 1.º ciclo, o ensino é globalizante, da responsabilidade de um professor único, que pode ser coadjuvado em áreas especializadas;
  • No 2.º ciclo, o ensino organiza-se por áreas interdisciplinares de formação básica e desenvolve-se predominantemente em regime de professor por área;
  • No 3.º ciclo, o ensino organiza-se segundo um plano curricular unificado, integrando áreas vocacionais diversificadas, e desenvolve-se em regime de um professor por disciplina ou grupo de disciplinas.[5]

Articulação entre os ciclos do ensino básico

A articulação entre os ciclos obedece a uma sequencialidade progressiva, conferindo a cada ciclo a função de completar, aprofundar e alargar o ciclo anterior, numa perspectiva de unidade global do ensino básico, integrando-se os objectivos específicos de cada ciclo nos objetivos gerais do ensino básico, de acordo com o desenvolvimento etário correspondente, tendo em atenção as seguintes particularidades:

  • Para o 1.º ciclo, o desenvolvimento da linguagem oral e a iniciação e progressivo domínio da leitura e da escrita, das noções essenciais da aritmética e do cálculo, do meio físico e social e das expressões plástica, dramática, musical e motora;
  • Para o 2.º ciclo, a formação humanística, artística, física e desportiva, científica e tecnológica e a educação moral e cívica, visando habilitar os alunos a assimilar e interpretar crítica e criativamente a informação, de modo a possibilitar a aquisição de métodos e instrumentos de trabalho e de conhecimento que permitam o prosseguimento da sua formação, numa perspectiva do desenvolvimento de atitudes activas e conscientes perante a comunidade e os seus problemas mais importantes;
  • Para o 3.º ciclo, a aquisição sistemática e diferenciada da cultura moderna, nas suas dimensões humanística, literária, artística, física e desportiva, científica e tecnológica, indispensável ao ingresso na vida activa e ao prosseguimento de estudos, bem como a orientação escolar e profissional que faculte a opção de formação subsequente ou de inserção na vida activa, com respeito pela realização autónoma da pessoa humana.[5]

A lei permite ainda que em escolas especializadas do ensino básico possam ser reforçadas as componentes de ensino artístico ou de educação física e desportiva, sem prejuízo da formação básica.[5]

A conclusão com aproveitamento do ensino básico confere o direito à atribuição de um diploma, sendo certificado o aproveitamento de qualquer ano ou ciclo, quando solicitado.[5]

Correspondência com o ISCED e com os antigos níveis de ensino

Assim, em Portugal o ensino básico, corresponde aos primeiros nove anos de escolaridade, abrangendo a faixa etária dos 6 aos 14/15 anos, e está dividido em três ciclos, correspondentes aos níveis 1 e 2 do ISCED 1997:

O ensino básico na Lei n.º 5/73, de 25 de julho

O conceito de ensino básico foi introduzido pela Lei n.º 5/73, de 25 de Julho, que aprovou as bases a que deveria obedecer a reforma do sistema educativo.[6]

Este diploma legal previa que o ensino básico compreenderia o ensino primário, com a duração de quatro anos, e o ensino preparatório, igualmente com a duração de quatro anos.

Ao ensino básico corresponderia a escolaridade obrigatória.

Na sequência da Revolução de 25 de Abril, a Lei n.º 5/73, de 25 de julho, não chegou a ser objeto de aplicação neste domínio.[7]

Ver também

Notas e referências

Notas

  1.  A Lei 11.274/06[1] ampliou a duração do ensino fundamental para nove anos.

Referências

  1.  Lei Federal Ordinária nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Alterou a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Acesso em 28/03/2012.
  2.  Venturi, Jacir (27 de fevereiro de 2016). «A nossa educação básica transita do bom ao ruim»Jornal Gazeta do Povo. Consultado em 11 de março de 2016
  3.  Sartori, Jeanfrank (2015). Estatísticas da educação particular do Paraná: educação básica e superior. Curitiba: Sinepe/PR
  4.  «Matrículas na Educação Básica do Brasil e suas Regiões - 2004-2014» (PDF). 23 de junho de 2015. Consultado em 11 de março de 2016
  5. ↑ Ir para:a b c d e f g Lei n.º 46/86, de 14 de outubro (Lei de Bases do Sistema Educativo)
  6.  Lei n.º 5/73, de 25 de julho.
  7.  Cf. União Europeia; Directorate-General for Education and Culture; Eurydice. Organização do Sistema Educativo em Portugal: 2006/07 Arquivado em 21 de agosto de 2011, no Wayback Machine., pg. 9.

Ligações externas

ANTÓNIO SÉRGIO - JORNALISTA - MORREU EM 1969 - 24 DE JANEIRO DE 2022

 

António Sérgio

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Disambig grey.svg Nota: Para o radialista português, veja António Sérgio (radialista).
António Sérgio
Nome completoAntónio Sérgio de Sousa Júnior
Nascimento3 de setembro de 1883
DamãoÍndia PortuguesaPortugal
Morte24 de janeiro de 1969 (85 anos)
LisboaPortugal
NacionalidadePortugal Portuguesa
CônjugeLuísa Sérgio
OcupaçãoFilósofo, historiador, pedagogo, político
Magnum opusContos gregos

António Sérgio de Sousa Júnior[1] (Damão3 de setembro de 1883 – Lisboa24 de janeiro de 1969) foi um pensador, pedagogo e político português. Existe uma escola secundária com o seu nome em Vila Nova de Gaia.

Biografia

António Sérgio nasceu na Índia Portuguesa e viveu parte da infância em África. Já em Lisboa, seguindo uma linhagem de familiares militares, estudou no Colégio Militar[1] e depois na Escola Politécnica e na Escola Naval. Cedo sentiu grande interesse pela poesia e pela filosofia, devendo-se o seu precoce pendor racionalista à leitura da Ética de Espinosa, ao estudo da geometria analítica e ao interesse pela obra de Antero de Quental.

Iniciando uma carreira de oficial da Marinha, fez várias viagens que o levaram a Cabo Verde e a Macau. Abandonou a Marinha com a implantação da República em 1910, por ter jurado fidelidade ao rei deposto.

Casou com Luísa Epifâneo da Silva (que assinou escritos pedagógicos como Luísa Sérgio), com quem teve uma grande camaradagem intelectual. As suas duas primeiras obras publicadas foram um volume de Rimas e uma obra filosófica sobre Antero de Quental onde reagiu contra o naturalismo positivista.

Em 1912 concorreu para lente assistente da secção de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, num concurso a que também se apresentaram Leonardo Coimbra e Matos Romão, que haveria de ser nomeado.

Após estudos de pós-graduação no Instituto Jean-Jacques Rousseau (1914-16), grande centro mundial do movimento da Escola Nova, onde estudou com a sua mulher, e onde privou com Édouard Claparède e com Adolphe Ferrière, participou no mais consequente projeto de reforma do Ensino Português elaborado durante a Primeira República (Projecto Camoesas).

A sua vida aventurosa fê-lo viver em diversos lugares (Lisboa, Rio de Janeiro, Londres, Genebra, Paris, Santiago de Compostela, Madrid) o que favoreceu o seu assumido cosmopolitismo.

Durante o consulado sidonista (1918-19), lança a revista Pela Grei [2] (1918-1919), para a qual convoca diversos especialistas para apresentar um programa de Fomento Nacional (tendo a parte económica sido bastante trabalhada por Ezequiel de Campos); nos anos de 1920 integra a direção da Seara Nova (junto com Raul Proença e Jaime Cortesão) e é nesse quadro que vem a integrar o governo de Álvaro de Castro (1923), assumindo a pasta da Educação, com o principal propósito de criar uma Junta de Ampliação de Estudos, organismo autónomo que enviaria sistematicamente bolseiros ao estrangeiro para estudar, e que financiaria institutos de investigação e escolas modernas (o projeto foi executado, sem a componente pedagógica e sem o espírito democrático que inspirava Sérgio, em 1929, com a criação da Junta de Educação Nacional, antepassado do Instituto de Alta Cultura, do INIC e da FCT).

Com o fim da Primeira República, vê-se obrigado ao exílio, residindo em Paris de 1926 até 1933.

De volta ao solo pátrio, tornou-se um dos principais nomes do movimento cooperativista e do socialismo democrático; entre os seus companheiros de luta contaram-se Alves CorreiaMário Azevedo GomesJosé RégioBento de Jesus Caraça (com quem travou uma polémica sobre a interpretação de Platão, cerca de 1945, onde a tensão entre marxismo e proudhonismo e idealismo racionalista está implícita), Manuel Antunes e muitos outros vultos da cultura portuguesa. A importância das suas ligações políticas nota-se perfeitamente nessa época. Sérgio fez parte do Movimento de Unidade Democrática, juntamente com nomes como Alves Redol, o General Norton de Matos, Ruy Luís Gomes e Bento de Jesus Caraça (oposicionistas e excecionais matemáticos), Irene Lisboa, Fernando Lopes Graça, Ferreira de Castro, Abel Salazar, Miguel Torga, Maria Lamas, Pulido Valente, Vitorino Magalhães Godinho, Mário Dionísio e Francisco Salgado Zenha (à data ainda estudante) e muitos outros. Veja-se http://ruyluisgomes.blogspot.pt/, reprodução do jornal República, de 11 de novembro de 1945, artigo «Movimento de Unidade Democrática».

Apoiou a candidatura de Humberto Delgado e desenvolveu ampla campanha em prol da cultura.

A partir de 1959, abandonou a intervenção cívica ativa e a pena de escritor, vindo a falecer em 1969.

O seu nome perdura na toponímia portuguesa, em nomes de arruamentos. Em Campo Maior (Portugal) existe inclusivamente um busto de António Sérgio na Avenida que também tem o seu nome.

Foi agraciado, a título póstumo, com os graus de Grande-Oficial da Ordem da Liberdade (30 de junho de 1980) e de Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (3 de agosto de 1983).[3]

Pensamento

António Sérgio, muito influenciado pelo socialismo de Proudhon por via de Antero, não considerava a questão república/monarquia importante por julgar a questão social (melhoria das condições de vida das classes trabalhadoras) mais fundamental que a revolução política.

A sua ação e pensamento, inicialmente inspirados por figuras como Alexandre HerculanoOliveira Martins e Antero de Quental, foi marcadamente voltada para a reforma das mentalidades, para a compreensão histórico-sociológica de Portugal e para a problemática da educação; defendeu o modelo da escola-município, baseado no ideal de self-government e de educação cívica.

O seu pensamento inscreve-se numa constelação de pensadores cosmopolitas de pendor voluntarista seus contemporâneos, defensores da democracia e de ideais socialistas, entre os quais se contam John DeweyGuglielmo FerreroRamsay MacDonald e Georg Kerschensteiner.

A sua interpretação da história de Portugal, que foi amadurecendo em textos publicados entre 1913 e 1924, valorizou os fatores sócio-económicos (as duas políticas nacionais: transporte e fixação) e de psicologia social (dicotomia ideal-típica entre particularismo e comunarismo, originária da corrente sociológica francesa do grupo de La Science Sociale, onde se destacaram Edmond Desmolins, autor de À quoi tient la supériorité des anglo-saxons, e Léon Poinsard, que veio estudar Portugal a convite de D. Manuel II, de que resultou a obra Le Portugal Inconnu, publicada em 1909); António Sérgio criticou as histórias românticas que enalteciam os feitos guerreiros e a aventura norte-africana de D. Sebastião, esquecendo a pesada herança do nosso colonialismo.

Durante a década de 1910, a sua intervenção foi enquadrada pelo movimento cultural da Renascença Portuguesa (onde pontificavam Teixeira de Pascoaes e Jaime Cortesão), movimento que Sérgio sempre considerou de natureza plural, por isso se opondo à ideia de que o saudosismo de Pascoaes, cujo valor restringia ao plano estético, poderia servir de farol para a solução do problema nacional; pelo contrário denunciou a mania da purificação e o parasitismo que nos inquinava desde os Descobrimentos, enaltecendo o papel dos estrangeirados reformistas e dos que se inspiravam de corrente liberais cosmopolitas (Luís António VerneyRibeiro Sanches e depois Alexandre HerculanoAlmeida GarrettMouzinho de AlbuquerqueAntero de Quental, Oliveira Martins).

No plano político, Sérgio considerou prioritária a constituição de uma opinião pública e de uma elite, recrutada sobre a base social mais ampla, a qual fiscalizaria os representantes eleitos - esta seria uma condição fundamental para uma democracia efetiva, a qual, na aceção filosófica, equivaleria ao regime em que todo o ser humano estivesse investido da dignidade que resulta de o considerar sempre como fim em si e nunca como meio (Kant); por isso teorizou sobre a noção de elite, para o que se inspirou em ProudhonGabriel Tarde e Paul de Roussiers.

Durante a residência em Paris de 1926 até 1933, tornou-se amigo de Paul Langevin, frequentando os cenáculos racionalistas onde Léon Brunschvicg era figura maior. Continuou entretanto a publicar os seus Ensaios, onde os temas literários, históricos e filosóficos eram dominantes, sempre apresentados numa perspetiva pedagógica e crítica (que se manteve fiel às intuições maiores dos seus anos de formação) e a lutar pelo retorno de Portugal à democracia.

Nos anos de 1950 rodeou-se de um grupo de jovens estudantes de ciências (entre os quais se contou João Luís Andrade e Silva, discípulo de Louis de Broglie, que a voltar de Paris iniciou de modo consequente o ensino superior da História das ideias científicas), para os quais escreveu as Cartas de Problemática.

Para os seus detratores (bergsonistasnacionalistas de feição romântica ou integralista, marxistas-leninistas), o seu pensamento foi essencialmente polémico e datado; não obstante, o seu pensamento continuou a despertar vocações em gente das ciências sociais e exatas, que não se reclamando seus discípulos sentem ser decisiva a sua inspiração.

"O desenvolvimento do capitalismo português, na sua unidade fundamental e na diversidade das suas orientações, não determinou entre nós um alto desenvolvimento das forças produtivas. O sistema escolar português não ultrapassou, por isso mesmo, os limites dos estreitos interesses económicos e culturais da burguesia. Nunca se alcançou a democratização real da Educação e da Instrução."[4]

António Sérgio e a cultura

É importante uma referência ao seu conceito de cultura. "Homem culto (…) significará um indivíduo de juízo crítico, afinado, objectivo, universalista, liberto das limitações de nacionalidade e de classe (…)."[5] (…) e somos filósofos na proporção exata em que nos libertamos dos limites que nos inculcam a raça, a nacionalidade, o sítio, o instante, o culto, o temperamento, a classe, o sexo, a moda, a profissão".[6]

Neste campo, a sua atividade foi imensa: fundou a revista Pela Grei(1918-1919); colaborou na revista Águia, com homens como Teixeira de Pascoaes ou Fernando Pessoa;[7] escreveu também na revista Seara Nova, a partir de 1923, onde se encontraram personagens como Aquilino RibeiroRaul Brandão ou Azeredo Perdigão (mais tarde dirigente da Fundação Calouste Gulbenkian); colaborou nas revistas Homens Livres [8] (1923) e Lusitânia[9] (1924-1927) e no semanário Mundo Literário [10] (1946-1948); foi diretor da "Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira"; escreveu uma imensa obra teórica em grande parte reunida nos Ensaios;[11] lançou em Portugal a ideia do Cooperativismo, que se viria a revelar a sua obra mais duradoura, nomeadamente ao nível das cooperativas de habitação; fundou a Junta Propulsora dos Estudos; difundiu o método Montessori; criou o ensino para deficientes e o cinema educativo, tendo ainda tempo para fundar o Instituto Português do Cancro.

Foi amigo pessoal de Adolphe FerrièreÉdouard Claparède e Paul Langevin - orientador do doutoramento de Louis de Broglie (Prémio Nobel da Física em 1929); foi professor, nomeadamente da Universidade de Santiago de Compostela (em 1933), tendo, por tudo isto, influenciado personagens como o seu amigo Barahona Fernandes - um dos mais distintos psiquiatras portugueses -, o arquiteto Raul Lino, o pedagogo Rui Grácio ou Mário Soares. Pode-se considerá-lo como um "Educador de Gerações". Pretendia combater o ensino meramente baseado na memória e treinar as crianças no exercício da democracia, vendo a escola como «modelo» para a sociedade. Entendia o ensino como fator de ressurgimento nacional e criador de uma elite humanista, sendo a cultura vista como produto da Democracia por oposição ao autoritarismo.

A ação política de António Sérgio

António Sérgio deve ser visto como político.

Henrique de Barros e Fernando Ferreira da Costa, foram amigos de Sérgio, e, como ele, opositores do regime de Salazar. Para ambos, Sérgio queria algo original: um socialismo associativista, libertador ou mesmo libertário, a criar de dentro para fora, pacificamente, pela extensão gradual mas ilimitada do princípio cooperativo. Homem cultíssimo e de grande curiosidade mental, leitor permanente e crítico, conhecia bem as obras de Marx e não ignorava a vida e as ações deste, mas "nunca foi marxista nem revelou tendência para o ser, como é geralmente sabido e já aqui começámos, logo por fazer notar."[12]

Acrescentam ainda:

"tendo chegado nos seus últimos anos de vida, recolhido em casa, à estranha conclusão de que a sua obra falhara, ressalvava contudo o seu combate pelo Cooperativismo como a única coisa que daquela se aproveitava e assim legaria ao seu país. Isto mesmo declarou ele a diversos amigos, que o visitavam na sua acolhedora casa da Travessa do Moinho de Vento, à Lapa, entre eles a nós próprios, ao afirmar a convicção em que estava, naquela passagem da década dos 50 para a dos 60, de que a sua obra resultara estéril, essa obra sem par entre nós de filósofo, ensaísta, doutrinador político, agitador social fecundo, fomentador de novas ideias, professor vocacionado, crítico literário arguto e inconformista, Historiador original sempre com os olhos postos no futuro, prosador admirável e dúctil, Poeta talentoso, Dramaturgo interessante, jornalista que aliava a acessibilidade do texto à elevação dos conceitos."[13]

[14]

A luta política de Sérgio contra o regime não parou e só esmorecia quando as circunstâncias eram por de mais impeditivas da expressão do pensamento.[15] Tendo acabado por se convencer, após o seu regresso ao país em 1933 e até ao insucesso da candidatura Norton de Matos, de que o sistema nunca se liberalizaria a ponto de procurar quem o continuasse ou lhe sucedesse recorrendo a eleições honestas, o pensador voltou a ser conspirador ativo e passou de novo a privilegiar uma solução de índole militar.

" Esteve intensamente envolvido na preparação e na execução da candidatura presidencial de Humberto Delgado, mas já então mais convencido de que esta redundaria num golpe militar em vez de umas tranquilas eleições democráticas. (…)"[16]

Para Henrique de Barros e Fernando Ferreira da Costa,

"Quem um dia conseguir fazer a história meticulosa da resistência militar ao antigo regime, após a grande guerra, com as suas muitas conjuras e raras sublevações, comprovadora de que as Forças Armadas, embora continuassem a ser o suporte principal do status quo, nunca estiveram coesas na defesa deste, como não haviam estado antes da guerra mundial, há-de certamente deparar a cada passo com a figura «intrometida» de António Sérgio. (…) Foi Sérgio quem, após com ele se ter relacionado com finalidades conspiratórias, lançou o nome de Humberto Delgado, recém mas veementemente convertido à Democracia, para candidato oposicionista apto a vencer as eleições presidenciais de 1958. Com o seu temperamento dadivoso e combativo, foi também ele, Sérgio, um dos que mais intensamente se empenharam na luta pela aceitação desta candidatura por todas as forças oposicionistas, como veio a acontecer após a desistência de Arlindo Vicente, e um dos que mais se envolveram na ingrata campanha que o «general sem medo» conduziu e que acabou por o levar, poucos anos depois, à horrorosa tragédia que os portugueses jamais deverão esquecer."[17]
Em 1993, José Freire Antunes, na obra Salazar Caetano cartas secretas 1932-1968 voltou a afirmar o papel de António Sérgio nas dificuldades do salazarismo, dizendo que o Presidente da República de então, Craveiro Lopes, exigiu a Salazar a demissão de Santos Costa, grande apoiante do chefe do governo - tendo Salazar cedido, depois de se sentir ameaçado por Craveiro Lopes, que o poderia ter demitido. "A campanha eleitoral de Delgado «à americana» mobilizou multidões, convulsionando literalmente um país a que Salazar incutira a habitualidade bloqueadora das emoções."[18] Era completamente diferente a acção do Partido Comunista da dos social-democratas, como Sérgio. António Sérgio viria a declarar que as eleições tinham sido uma "farsa indecorosa". Humberto Delgado disse em público, em relação a Salazar, caso eleito Presidente da República: "obviamente demito-o". Mas em 1965, Humberto Delgado foi assassinado e Portugal mergulhou cada vez mais nas guerras de África - desde 1961 - em AngolaMoçambique e Guiné-Bissau. Em 1968 Salazar foi substituído por Marcelo Caetano e em 1974 as Forças Armadas, finalmente, derrubaram o regime que elas mesmas tinham começado, em 1926.[19]

Vemos hoje o que foi a vida de Sérgio pela seguinte síntese:

"Sérgio foi preso em 1910, 1933, 1935, 1948 e 1958. E a propósito das últimas quatro vezes pensou (e depois escreveu) que foi na prisão que encontrou a verdadeira «união nacional» - de oposição à ditadura militar, primeiramente, e, depois, a Salazar, ao Estado Novo, ao fascismo."[20]

O essencial da atividade política de Sérgio é sempre enquadrável com o seu aspeto teórico - a ligação à Democracia, à Liberdade, como via para a Educação e Cultura.

Notas e referências

  1. ↑ Ir para:a b «Título ainda não informado (favor adicionar)». Meninos da Luz – Quem é Quem II. Lisboa: Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar. 2008. ISBN 989-8024-00-3
  2.  Álvaro de Matos (18 de outubro de 2012). «Ficha histórica: Pela Grei (1918-1919)» (PDF)Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 17 de março de 2015
  3.  «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "António Sérgio". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 11 de julho de 2019
  4.  Fernandes, Rogério, O Pensamento Pedagógico em Portugal, Lisboa, ICALP, 1978, pp 93–94.
  5.  "Para a definição da aspiração comum dos povos luso-descendentes", Ensaios tomo VI, Lisboa, Sá da Costa, p. 17.
  6.  "Resposta a um inquérito" Vértice, nº30-35, maio de 1946,p. 172.
  7.  Barros, Henrique de e Costa, Fernando Ferreira da, António Sérgio: uma nobre utopia, Lisboa, 1983, Edições O Jornal.
  8.  Rita Correia (6 de fevereiro de 2018). «Ficha histórica:Homens livres (1923)» (PDF)Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 13 de março de 2018
  9.  Rita Correia (5 de Novembro de 2013). «Ficha histórica: Lusitania : revista de estudos portugueses (1924-1927)» (pdf)Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 3 de Dezembro de 2014
  10.  Helena Roldão (27 de janeiro de 2014). «Ficha histórica: Mundo literário : semanário de crítica e informação literária, científica e artística (1946-1948).» (pdf)Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 3 de Novembro de 2014
  11.  Sérgio, António, Ensaios, tomo I pp13–43 (op. cit.)
  12.  Barros Henrique de e Costa, Fernando Ferreira da, António Sérgio:uma nobre utopia, Lisboa, 1983, Edições O Jornal, pp. 33–34.
  13.  Sérgio, António,"Sobre o espírito do Cooperativismo", Ateneu Cooperativo, Lisboa, 1958, pp. 37-38.
  14.  Barros, Henrique de e Costa Fernando Ferreira da, António Sérgio: uma nobre utopia, Lisboa, 1983, Edições O Jornal, p. 34.
  15.  Uma das suas mais faladas tomadas políticas de oposição ao regime terá sido a de encabeçar a mensagem dirigida ao Presidente da República, a 10 de julho de 1956, reclamando o cumprimento, efetivo do artigo 8º da Constituição então vigente, a qual garantia teoricamente o exercício dos direitos cívicos. Valeu-lhe esta atitude vários ataques na Emissora Nacional, na Assembleia Nacional, na imprensa, que profundamente o magoaram e o levaram às réplicas veementes que constituem a XLIX Carta da terceira série de Cartas do terceiro homem.
  16.  Barros, H. e Costa, F. F., op. cit., p. 74.
  17.  Tratam os autores deste texto, do assassinato de Humberto Delgado e da sua secretária, em Espanha, pela polícia política portuguesa.
  18.  Antunes, José Freire, Salazar Caetano cartas secretas 1932-1968, Edição José Freire Antunes e Círculo de Leitores, Lisboa, novembro de 1993, pp. 76-78.
  19.  Baptista, Jacinto, Disse chamar-se António Sérgio de Sousa … auto da prisão, inquirição e desterro do autor dos Ensaios em 1935, Lisboa, Caminho, 1992, pp. 44-45.
  20.  Baptista, Jacinto, op. cit., p. 62.

Bibliografia

  • Antunes, José Freire, Salazar Caetano cartas secretas 1932-1968, Lisboa, Edição José Freire Antunes e Círculo de Leitores, novembro de 1993.
  • Baptista, Jacinto, Disse chamar-se António Sérgio de Sousa … auto da prisão, inquirição e desterro do autor dos Ensaios em 1935, Lisboa, Caminho, 1992.
  • Barros, Henrique de e Costa, Fernando Ferreira da, António Sérgio: uma nobre utopia, Lisboa, 1983, Edições O Jornal.
  • Carvalho, Rómulo, História do Ensino em Portugal, Lisboa, F.C.Gulbenkian.
  • "Estatuto do Ensino Secundário", 18 de Dezembro de 1931.
  • Fernandes, Rogério, O Pensamento Pedagógico em Portugal, Lisboa, ICALP, 1978.
  • Jornal República, artigo «Movimento de Unidade Democrática», de 11 de novembro de 1945, reproduzido em http://ruyluisgomes.blogspot.pt/
  • Lei de 29 de março de 1911.
  • Mota, Carlos Alberto M. Gomes, António Sérgio Pedagogo e Político, Porto, Cadernos do Caos, 2000. (Na Internet em http://www.carlosmota.info/docs/AntSerg.pdf)
  • Príncipe, João, Razão e Ciência em António Sérgio, Lisboa, Imprensa Nacional,2004.
  • Príncipe, João, Quatro Novos estudos sobre António Sérgio, com um posfácio de Hermínio Martins, Vale de Cambra, Caleidoscópio, 2012.
  • Reforma da Instrução Primária - 24 de Dezembro de 1901.
  • Sá, Vítor de, A Historiografia Sociológica de António Sérgio, Lisboa, ICALP, 1979.
  • Salazar, Oliveira, "Princípios fundamentais da revolução política", discurso de 30 de julho de 1930.
  • Sérgio, António, Ensaios, tomo I, Lisboa, Sá da Costa.
  • Sérgio, António, "Antero de Quental e António Vieira perante a civilização cristã dos seus próprios tempos",Biblioteca Fenianos, 1948.
  • Sérgio, António, "Resposta a um inquérito" Vértice, nº30-35, maio de 1946.
  • Sérgio, António, "Sobre o espírito do Cooperativismo", Ateneu Cooperativo, Lisboa, 1958.
  • Sérgio, António, "Para a definição da aspiração comum dos povos luso-descendentes", Ensaios tomo VI.
  • Vilhena, Magalhães, António Sérgio e a crise do Idealismo Burguês, Lisboa, Seara Nova, 1964.

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