A semana passada assistimos à divulgação pelo Instituto Nacional de
Estatísticas de um conjunto de indicadores sobre a evolução da economia
portuguesa no primeiro trimestre deste ano que só podem ser considerados
preocupantes. A saber:
as exportações diminuíram 3,9%;
a taxa de desemprego subiu para 12,4%; e por fim
o Produto Interno Bruto cresceu apenas 0,1% em cadeia, e 0,8% em termos homólogos.
Estes números têm um especial significado porque são os primeiros
depois da tomada de posse do actual, os primeiros onde se pode aferir o
efeito das suas políticas. O tema passou pelo
debate quinzenal da passada sexta-feira, mas importa ir um pouco mais longe e procurar as primeiras análises entretanto publicadas.
Antes de irmos aos textos saídos depois da divulgação destes
indicadores, comecemos por uma referência a um texto que, de alguma
forma, antecipava politicamente os maus resultados:
Foi para isto que se fez o 26 de Novembro?, de João Miguel Tavares no Público. Nele recorda-se o que prometia o chamado “tempo novo”: “
Concentrem-se
nas contas de Primeiro Ciclo que António Costa não se cansava de nos
vender: 1) o Estado gasta mais, 2) o Estado coloca mais dinheiro no
bolso dos portugueses, 3) os portugueses compram mais, 4) o país produz
mais, 5) o PIB aumenta, 6) o desemprego cai, 7) o Estado cobra mais
impostos, 8) todos ficamos mais felizes, porque aquilo que se recebe
compensa (os célebres multiplicadores) aquilo que se investe. Este
projecto de keynesianismo para totós era tudo o que António Costa tinha
para nos prometer – mas prometia com grande empenho, e muitas vezes.”
Esta é a referência de partida: vinha aí mais crescimento e menos
desemprego. Aconteceu o oposto, pelo menos no primeiro trimestre. Os
resultados foram tão fracos que o economista Ricardo Santos, num texto
de análise aos números do PIB que escreveu a pedido Observador,
De volta ao ano 2000?, notou que “
Para
que o crescimento de 1,8% esperado no Programa de Estabilidade seja
atingido, a taxa de crescimento trimestral do PIB teria de ser em média
0,9% em cadeia nos próximos três trimestres – algo que aconteceu pela
última vez em…2000, o mesmo ano em que o PIB cresceu 3,8%, e Portugal
chegou às meias finais do Europeu de futebol, depois da famosa
reviravolta contra a Inglaterra e de derrotar a Alemanha!”
Outro economista, Pedro Pita Barros, também se mostrou preocupado no seu blogue Momentos Económicos. Em
PIB, recuperação económica e políticas
chamou a atenção para os principais factores do arrefecimento da
economia terem sido as exportações e a falta de investimento. O que o
leva a considerar que “
Esta evolução torna-se preocupante. Apesar da
versão oficial da estratégia de crescimento apontar para o estímulo ao
consumo privado (apostando em que a falta de crescimento se deve a falta
de procura), todos os sinais desde 2000 apontam para que Portugal tenha
sobretudo um problema de longo prazo no crescimento da produtividade e
dos sectores onde tal poderá suceder. Apenas com esse crescimento da
produtividade se terá crescimento económico sustentável.” A seguir discute como se pode conseguir mais produtividade. Sendo que “
a
menor dinâmica do investimento é mau sinal para essa renovação [do
tecido económico]. E a menor dinâmica das exportações é mau sinal para
“sinalizar” que investimentos serão mais produtivos para o
desenvolvimento da economia portuguesa.”
Continuando nos blogues mas passando agora para O Insurgente, referência para um texto de Jorge Costa,
O OE já nasceu em coma profundo; entretanto morreu e sexta-feira foi a enterrar (R.I.P.)
onde se fazem umas contas para concluir que os números agora conhecidos
apontam para um crescimento que situará algures entre um cenário mais
pessimista – “
O crescimento anual em 2016 será de 0,9%, precisamente metade do que prevê o orçamento.”
– e outro mais em linha com as previsões do Governo, introduzindo
apenas as correcções decorrentes do efeito do fraco crescimento dos dois
últimos trimestres – “
O crescimento anual em 2016 será de 1,2%, isto é, precisamente dois terços do que prevê o orçamento.”
Como a consequência de menos crescimento é que, para alcançar o mesmo
défice, é necessária mais austeridade, ficamos à espera de saber quando
se assumirá que as coisas estão mesmo a correr mal.
Este era, de resto, o ponto de partida de
Facto: isto não está a correr bem (mas calma), um texto de David Dinis no Diário de Notícias. “
O
primeiro trimestre já se foi, os próximos têm de ser mesmo muito bons
para que António Costa possa reclamar vitória. E pode acontecer que só
saibamos se a estratégia da esquerda está a falhar quando for,
provavelmente, tarde demais para travar.
Veja bem: só em agosto teremos dados fiáveis sobre o semestre
completo. E se for preciso tomar medidas em setembro para corrigir a
rota (cumprir o défice, reduzir a dívida), só medidas de grande dimensão
terão resultados efetivos.” A questão, depois, é saber se António Costa está mesmo interessado em cumprir as metas do défice, acrescenta o cronista.
Mas voltemos à análise de economistas, agora para citar Francisco
Veloso, da Universidade Católica, que no Jornal de Negócios escreveu
Incerteza política, investimento adiado e crescimento anémico.
Na sua opinião a falta de investimento deve-se muito a várias
incertezas políticas, sendo que não se prevê que estas possam via a
desaparecer facilmente. Em concreto: “
O principal problema é que a
incerteza está a crescer. Existe incerteza sobre potenciais penalizações
da Comissão Europeia pelo incumprimento das metas de redução de défice
em 2015, e sobre exigências para que o Governo aplique medidas
adicionais de redução de despesa (vulgo austeridade) ainda este ano, o
que implicaria uma contração adicional do nosso crescimento. E, como é
já evidente, o orçamento de 2017 será de forte austeridade. Estes
processos irão ter um impacto incerto no equilíbrio das forças políticas
que suportam o Governo e na sua própria estabilidade. (…)
Independentemente do que se vier a materializar, é fácil compreender que
se irá manter uma elevada incerteza ao longo deste ano, e
consequentemente o investimento irá continuar em declínio. E não se
vislumbra a dissipação desta incerteza. Ou seja, nuvens bastante negras
estão agora no nosso horizonte de crescimento, para 2016 e também para
anos futuros.”
Fecho este apanhado de hoje com a referência ao texto que eu próprio
escrevi hoje no Observador, onde parto dos resultados da economia para
fazer um balanço deste Governo –
Seis meses de geringonça, modo de usar. É um texto dividido em quatro pontos –
A economia, sempre a economia; Expectativas mínimas, clientelas máximas; A degenerescência do PS; e, por fim,
A fome de poder e o cimento do poder – onde noto, depois de citar os números da “semana horribilis” das estatísticas: “
A
percepção deste desastre anunciado já obrigou a geringonça a adaptar o
seu discurso e a baixar as expectativas. Agora tudo se resume a
“recuperar rendimentos dos portugueses”, uma lenga-lenga que Catarina
Martins está sempre a repetir e que agora é retomado na moção de António
Costa ao Congresso do PS.” Mas esta mudança de discurso é apenas o
início de um processo a que já assistimos noutros países europeus, como
recordo a concluir, que “
nada disto nos devia surpreender depois de
ter assistido ao que assistimos na Grécia, onde o radicalíssimo Syriza
acabou a aplicar mais austeridade que os governos anteriores com a
agravante de, no entretanto, ter dado cabo dos poucos sinais de
recuperação que a economia começava a dar. Apesar das suas origens
distintas, Costa é muito mais parecido com Tsipras do que parece, pelo
que é bom não ter ilusões: tal como o líder radical grego aplicará as
medidas que Bruxelas, mais tarde ou mais cedo, o obrigar a aplicar,
subirá os impostos que tiver de subir, e ao mesmo tempo invectivará
Bruxelas as vezes que isso for politicamente conveniente.”
Registe-se que este texto é um adaptação do texto que escrevi para a edição especial –
em papel e de grande formato!
– que assinalará o 2º aniversário do Observador e que estará nas bancas
no próximo dia 19 de Maio. Hoje as rotativas já estavam a andar:
Temos mais surpresas, naturalmente online, mas por hoje é tudo. Tenham bom descanso e boas leituras.