Seis dias. Foi este o prazo,
seis dias úteis, que a União Europeia deu hoje à Grécia para esta apresentar uma lista completa de reformas. Só assim esta poderá ser analisada até à reunião do Eurogrupo de dia 24 de Abril. Isto no dia em que Atenas cumpriu o primeiro pagamento de uma maratona de obrigações que enfrentará nas próximas semanas:
entregou ao FMI 448 milhões de euros, como estava previsto. Mas as dificuldades de financiamento no curto prazo mantêm-se, aumentando o número dos artigos sobre a hipótese de uma saída ordenada da Grécia – o “grexit” – ou uma saída acidental, por incumprimento de obrigações – o “grexident”.
Talvez por isso, ficámos também hoje a saber que o governo finlandês
já tem um memorando a preparar saída da Grécia da zona euro. Isto porque o ministro das finanças, Antti Rinne, entende que os políticos têm de estar preparados para a possibilidade de haver uma falência da Grécia até junho, pois se a Grécia insistir na ideia que não vai pagar os seus compromissos, então, isso pode levar a que com, a “aprovação silenciosa de outros países”, se inicie um proces so de expulsão da zona euro.
Porventura mais importante do que esta fuga de informação vinda da Europa do Norte, foi a tomada de posição editorial do Wall Street Journal, um dos jornais económicos mais importantes do mundo e concorrente do Financial Times. O editorial chama-se, significativamente,
The Case for Letting Greece Go. O seu argumento central também é claro:
“The risk now is political contagion from rewarding non-reform.” Vejamos como os editorialistas do WSJ sustentam esse argumento:
Greece’s main contagion threat now would be if it is bailed out again without reform. Athens wants creditors to reward Greek voters for electing a government committed to dismantling the reforms Greece needs. If creditors allow Athens to increase government spending while reversing labor-market liberalization and privatizations, they’ll encourage anti-reform movements elsewhere.Mais adiante, a concluir, reforçam assim a sua posição:
The strongest argument against allowing Greece to leave the euro is that it would dent the bloc’s appearance of permanence, making the euro more like a currency peg that members could leave at will. But we doubt other countries will want to follow Greece’s example once they see the damage to Greeks. They might even take the warning as incentive to do more to fix their economies. What’s not sustainable is allowing euro members to bully their way into deals in which they reap the rewards of a currency union without living by its rules. Mas como se não fosse suficiente esta posição editorial do WSJ, também pudemos encontrar no Financial Times de hoje um artigo de opinião a defender uma posição semelhante. Reza Moghadam, um antigo responsável do FMI para tida a Europa, defendeu a ideia de que
Stalemate can be replaced with sanity in eurozone dealings with Greece. Como? “
If Athens cannot deliver critical reforms, it better leave the eurozone”. É certo que este texto não defende a saída da Grécia, antes uma nova abordagem às negociações entre “as instituições antes designadas por troika” e o governo de Atenas. Essa abordagem na sua opinião deveria ser a seguinte: “
Now that Yanis Varoufakis has assured Christine Lagarde, IMF managing director, that Greece will honour its April repayment to the IMF, a short window of oppor tunity to instigate the necessary new approach. It could be based on three components: actual implementation of a few core actions to test the new government; short-term financing to remove the threat of default in the next three months; and a new programme to provide a blueprint for reform and financing for the next two to three years. If Greece cannot deliver such a limited but critical set of reforms, it had better prepare to leave the eurozone.”
Tudo isto se passou ao mesmo tempo que Alexis Tsipras se deslocou a Moscovo, o que enervou muito as capitais europeias, mas de onde o líder grego regressaria sem qualquer financiamento útil,
apenas com um acordo na área da economia e energia. Atenas acabou a garantir que não pediu ajuda financeira e Tsipras até disse que "a Gr&e acute;cia não é um pedinte”. Mas o fantasma de uma deriva que colocasse um país da União Europeia claramente do lado de Putin e do seu regime não desapareceu.
Sobre este tema há dois textos que vale a pena ler no Telegraph: um editorial –
Greece should not fall into Vladimir Putin's clutches – e uma crónica de Ambrose Evans-Pritchard –
Europe's manhandling of Greece is a strategic gift to Russia's Vladimir Putin. Comecemos pelo editorial, cujo argumento central é o seguinte:
Yet any hopes Mr Tsipras entertains that Russia can help alleviate his country’s crippling debt crisis are unlikely to be ar fruit. For a start, Russia has enough economic problems of its own without adding to its woes by bailing out the profligate Greeks. More to the point, Greece is too dependent on Western institutions such as Nato and the EU for its security and economic well-being to renounce completely its modern European destiny. (…). Rather than being alarmed by this, the EU should see it as nothing more than a diversionary tactic designed to deflect attention from the heart of issue, namely the lamentable lack of progress the Greek government is making in reforming its stricken economy. Quanto a Ambrose Evans-Pritchard, o seu texto é mais longo e descritivo (também mais ácido) e, depois de referir que “
The EMU authorities have signalled that they may be willing to disburse some funds once the IMF has been paid, preserving the formal niceties of the EU-IMF Troika. But as The Telegraph reported last week, Syr iza fears a trap. "They are trying to put us in a position where we either have to default to our own people or sign up to a deal that is politically toxic for us," said one official.”, acaba a sugerir que os gregos se virem contra o Banco Central Europeu:
If they have to default, they would rather pick their fight with EU creditors and above all the ECB, enemy number one after it took the pre-emptive political decision of cutting off a key lifeline for Greek banks within days of the Greek election. Continuando ainda na Grécia, demos a palavra aos gregos, neste caso a Alexis Papachelas, que escreve no mais importante jornal helénico, o Ekathimerini. Em
Fatal misunderstandings, este seu director executivo e famoso jornalista de investigação escreve que “
Watching the negotiations, you get the sense that Greek officials are fully convinced that, first of all, Commission President Jean-Claude Juncker will take care of it in the end through a fairly mild formula, and secondly, that at the end of the day German Chancellor Angela Merkel will back down and accept a compromise solution that will be politically acceptable to the Greek government majority. If these assumptions stand, then the government may genuinely believe that there is still some way to go before the cliff’s edge. If not, this might be a case of the kind of misunderstandings that will provide fodder for PhDs in the future”.
Afastemo-nos agora um pouco da Grécia, para sugerir alguns textos que, de uma forma ou outra, ajudam a pensar sobre a actual crise europeia:
- Francesc de Carreras, professor de Direito Constitucional, escreve no El Pais sobre Populismo contra democracia, que considera que “No son dos sistemas de gobierno distintos, sino dos formas de Estado diferentes. El éxito inicial de Podemos se asienta en criterios fáciles: contraponer los malos a los buenos. Su objetivo es ocupar el Estado”. É um artigo longo e bem argumentado: “La democracia no es sólo el poder del pueblo sino, además, un sistema orgánico de controles mutuos. Las decisiones políticas no son producto de una sola voluntad sino de un proceso en el que actúan voluntades diversas con funciones —legislativas, ejecutivas y jurisdiccionales— muy distintas. Para la democracia el Estado es un engranaje complejo, un instrumento cuyo único objetivo es que las personas sean libres e iguales. Para el populismo, el Estado es un instru mento que conoce previamente cuáles son los intereses del pueblo y, por tanto, no necesita debates ni controles para garantizarlos.” Vale a pena gastar alguns minutos a lê-lo.
- Bernard-Henri Lévy, o filósofo francês conhecido pelo seu lado iconoclasta, escreve no Huffington Post In Defense of Angela Merkel. Depois de recordar muitas das manifestações de germanofobia que se têm multiplicado um pouco por toda a Europa, chega ao essencial: The problem with this Germanophobia is not simply that it is stupid. It is not that it is yet another symptom of the decomposition, under our eyes, of the noble European project. No, the problem is, contrary to what the sorcerer's apprentices who stoke it would have us believe, that it is a sign not of the oppos ition of those apprentices but rather of their allegiance and even their contribution to the true fascism that lies on the horizon.
- Klaus Zimmermann, que dirige o Instituto para o Estudo do Trabalho em Bona, na Alemanha, fala-nos no Wall Street Journal sobre What France Can Learn From Italy. Comparando as medidas já tomadas pelos dois governos de esquerda, o de Renzi e o de Valls, o autor defende que os italianos estão a andar mais depressa e com mais coragem. Dá disso um exemplo: “In February, Prime Minister Matteo Renzi’s government approved two decrees enacting the core of the labor-market reform. One improves the rules for firing employees on a permanent contract, giving them a right to severance pay but removing the previous right to court-ordered reinstatement. This c aps the cost of firing a worker, which should make employers more willing to hire than they were when each new employee could become an employee for life. The government also has reduced the time a worker can receive unemployment benefits, to 18 months from 2017 onwards. Coupled with tax incentives introduced last year for companies that hire on regular as opposed to part-time contracts, it is now more enticing to hire in Italy than it has been in years.”
Antes de acabar este Macroscópio, deixem-me recomendar-vos dois textos completamente diferentes, um porque é especialmente acutilante, o outro… para descomprimir.
O texto acutilante a que me refiro é uma espécie de
post-scriptumdo Macroscópio de ontem, sobre a névoa que rodeia a candidatura de Sampaio da Nóvoa. Trata-se da crónica de João Raborda da Gama no Diário de Not&iac ute;cias de hoje,
Sampaio da Nóvoa Presidente. Pequena passagem: "
Em finais de junho de 2007, Saldanha Sanches apresentou-se a provas de agregação na Universidade de Lisboa. A composição do júri não deixava dúvidas sobre o que se ia julgar, não era o seu currículo académico nem as suas obras, ambos irrepreensíveis - era a sua liberdade. Talvez devesse ter ficado em casa, ir passar uma semana à Suíça, tão agradável no início do verão. Mas Saldanha Sanches não fugia. Chumbaram-no. De forma vil. Nos júris académicos, como nos países, há um presidente, alguém cimeiro que normalmente não deve intervir, só apenas em casos-limite, par a impedir a injustiça. Alguém que tem de ter coragem para repor a ordem justa das coisas, sempre que esta falte. Uma espinha dorsal e moral sobressalente, de reserva. O júri que reprovou José Luís Saldanha Sanches tinha António Sampaio da Nóvoa como presidente." (Houve
reacções e desenvolvimentos ao longo do dia.)
Quanto ao texto para descontrair é sobre bebés e cachorros e procura saber porque nos deixamos encantar tão facilmente por eles. Saiu do WSJ e chama-se
Why We Melt at Puppy Pictures. Só lendo, mas deixo-vos este aperitivo: “
It turns out that our brains aren’t great at differentiating between our own cute babies and those of animals. Stephen Hamann of Emory University has shown that viewing baby animals activates the same neural reward circuitry as looking at human babies.” Agora vão ver (ou ler) sobre como isso acontece...
E por hoje é tudo. Amanhã encontramo-nos de novo ao fim da tarde. Bom descanso e boas leituras.