Trump sofre "morte por mil cortes" com acumulação de problemas legais
"O que parece estar a acontecer a Trump ao longo do tempo é a morte por mil cortes. Tem visto de forma consistente a erosão da sua popularidade", afirmou o professor, depois de a comissão que investiga o ataque ao Capitólio ter recomendado ao Departamento de Justiça que indicie o ex-presidente por quatro crimes.
"Não quer dizer que ele seja descartável, ainda é uma força no Partido Republicano. Mas já não é aquela força da natureza que era há alguns anos", considerou Holyoke. "O próprio Trump não parece estar a atacar esta recandidatura à presidência com muito gosto".
A recomendação de acusação criminal feita pela comissão não é vinculativa e o analista duvida que venha a ter consequências concretas. "É, provavelmente, sobretudo simbólica", disse. "Não sei se o Departamento de Justiça se vai sentir muito pressionado a seguir estas acusações. Assumo que vão prosseguir com as suas próprias investigações, que podem sempre levar a acusações criminais".
Depois de a comissão do 06 de janeiro ter votado na segunda-feira para enviar ao Departamento de Justiça a recomendação de acusação por quatro crimes alegadamente cometidos por Donald Trump - incitamento à insurreição, conspiração para fraude, obstrução de ato do Congresso e falsas declarações - a divulgação do relatório final dos trabalhos, prevista para quarta-feira, foi adiada para hoje.
O relatório final encerra um ciclo de investigação que se estendeu ao longo de 18 meses, em que foram ouvidas mais de 1.000 testemunhas, realizadas quase uma dúzia de audiências e recolhidos mais de um milhão de documentos com o intuito de obter um registo mais abrangente da insurreição de 06 de janeiro de 2021.
Holyoke não ficou surpreendido com o desfecho do trabalho da comissão, que estava sob pressão para fazer algum tipo de recomendação criminal, após ano e meio de investigação.
"Penso que o que a comissão do 06 de janeiro fez foi mais tentar trazer a público o máximo de informação possível sobre o que aconteceu e quem foi responsável", sublinhou. "Penso que o público é o verdadeiro alvo deste trabalho, e não o Departamento de Justiça".
Ainda assim, a recomendação -- que acontece na mesma semana em que uma comissão de assuntos tributários revelou as declarações de impostos que Trump lutou para manter seladas -- acumula com outros problemas legais, tais como a investigação do procurador especial Jack Smith quanto aos documentos classificados encontrados na mansão do ex-presidente em Mar-a-Lago, Estado da Florida.
"Chegou a um ponto em que há tantos problemas que os Republicanos querem seguir em frente", considerou Holyoke. Muitos Republicanos influentes, considera, gostariam de apoiar outro candidato, como DeSantis, "mas Trump não vai facilitar isso", o que "pode significar uma guerra civil neste partido.
As implicações do que está a acontecer para o partido não são de menosprezar, segundo o politólogo Everett Vieira III, para quem a recomendação de acusação criminal constitui um momento importante na história política dos Estados Unidos.
"Uma coisa destas nunca aconteceu. Seria preciso recuar até à investigação do presidente [Richard] Nixon no Watergate ou ao escândalo Iran-Contra nos anos oitenta, mas isto é ainda maior que isso", disse à Lusa. "Isto tem, potencialmente, ramificações de longo prazo para o Partido Republicano".
Vieira frisou que o Departamento de Justiça liderado por Merrick Garland pode não dar seguimento à recomendação, mas ainda assim é relevante.
"Mesmo que nada aconteça é importante porque fica documentado", afirmou. "É importante que as pessoas saibam que não foi apenas um espetáculo que durou 18 meses, que os membros do Congresso estavam a trabalhar e isto foi o que descobriram", continuou. "Se a comissão não fizesse qualquer recomendação, então teria desperdiçado 18 meses".
No entanto, há o risco de que todo o processo seja visto como "uma palmada na mão" se não houver consequências.
O Partido Republicano terá agora de decidir se vai manter-se ao lado do seu ex-presidente ou apoiar outro candidato. Até agora, figuras partidárias decisivas mantiveram-se relativamente silenciosas sobre o sucedido.
Numa altura em que a temperatura da sua campanha de recandidatura é tépida, Trump reagiu à recomendação em tom de desafio: "O que não me mata torna-me mais forte", disse.
"Muito tem que ver com Trump ser potencialmente considerado `persona non grata`. Os seus candidatos perderam nas [eleições] intercalares [de novembro], não houve uma onda vermelha", analisou Everett Vieira. "Trump não recebeu o impulso que achou que ia ter".
O professor antecipa dois cenários: por um lado, "a liderança Republicana pode ser levada a não ser forte na defesa de Trump e a ponderar apoiar alguém como Ron DeSantis para 2024".
O reverso da medalha será argumentar que é uma `caça às bruxas`. Quando os Republicanos assumirem o controlo da Câmara de Representantes, o líder Kevin McCarthy pode decidir começar um processo de `impeachment` de Biden, fazer investigações aos emails de Hillary Clinton ou aos democratas Adam Schiff e Nancy Pelosi, "para desviar as atenções".
Certo é que "as coisas que estão a acontecer esta semana são importantes porque a partir de janeiro os democratas não terão virtualmente qualquer poder".
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