Tudo indica que hoje, em Nova Iorque,
às 15 horas de Lisboa,
António Guterres
será aclamado secretário-geral das Nações Unidas. Nunca um português
terá chegado tão longe. Nunca nenhum terá tido, nos últimos
séculos, tamanha influência no
mundo. Guterres era, provavelmente,
o mais bem preparado de todos.
Apesar de todas as
dúvidas que o atormentaram enquanto
foi primeiro-ministro de Portugal. Mesmo que a sua eleição para
secretário-geral das Nações Unidas tenha sido
discutida até cortar a meta.
Ontem, depois de ter dominado as
cinco votações anteriores para o mais alto cargo da Organização das Nações Unidas, recebeu
13 votos favoráveis dos 15 membros do
Conselho de Segurança. Com o novo processo de eleição, que pugna pela transparência, ninguém votou pelo desencorajamento. Apenas
dois membros escolheram a indecisão.
Pelo contrário, a mais temida adversária,
Kristalina Georgieva, que surgiu à última hora e se apresentava como a maior rival pelos
apoios que poderia obter, foi inapelavelmente batida, com oito votos de desencorajamento.
António Guterres ganhou e hoje, na derradeira votação, será
o único candidato. O português chegará à liderança das Nações Unidas por
aclamação.
Uma vitória cristalina, como descreve o “Público”.
O que falta para Guterres ser secretário-geral da ONU?
O
Conselho de Segurança da ONU deu uma indicação clara, durante a
sexta votação que ontem teve lugar, sobre quem deve ser o novo secretário-geral e então suceder a
Ban-Ki Moon a partir de
1 de janeiro de 2017. Porém, cabe à
Assembleia Geral, tomar a
decisão final, por maioria simples, hoje, às 15 horas.
Vitali Churkin, embaixador da
Rússia, o país que atualmente preside ao Conselho de Segurança, anunciou ontem publicamente esperar
“que seja indicado por aclamação”. Representando os 15 membros do Conselho de Segurança, acrescentou:
“Desejamos
ao senhor Guterres que tudo corra bem no desempenho das funções como
secretário geral das Nações Unidas, nos próximos cinco anos.”
O novo secretário-geral da ONU será eleito pela Assembleia Geral, depois desta
recomendação do Conselho de Segurança da ONU. Necessita de uma
maioria simples dos 193 países para que a decisão seja ratificada, numa votação que acontece à
porta fechada. Também compete à Assembleia Geral estabelecer a duração do
mandato, que tradicionalmente é de
cinco anos.
Do Técnico para o Mundo
António Manuel de Oliveira Guterres nasceu em Lisboa em
1949. Terminou a licenciatura em
Engenharia Electrotécnica em 1971, sendo considerado um dos
melhores alunos de sempre do Técnico, a mais reputada escola de engenharia portuguesa.
Entrou para o
PS em
1973 e já secretário-geral ganhou as
eleições legislativas de 1995. Presidiu a dois governos, sendo primeiro-ministro entre 1995 e
2001. Depois de uma derrota do PS nas
eleições autárquicas, demitiu-se do cargo, para evitar o
“pântano político”, cedendo o lugar a
Durão Barroso. Barroso também abandonaria também o cargo para ser presidente da
Comissão Europeia.
Em
2005, António Guterres seria nomeado
Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, cargo em que se manteve até
2015. A sua candidatura à
presidência da República, em
2016, seria ventilada inúmeras vezes. Ao não se concretizar, abriu o caminho à vitória de
Marcelo Rebelo de Sousa.
Como ele chegou lá
O
novo processo de eleição do secretário-geral das Nações Unidas pretendia-se
transparente mas foi perturbado pela candidatura, na passada semana,
por proposta da Alemanha, de
Kristalina Georgieva, comissária europeia do Orçamento e Recursos Humanos.
A candidatura de Guterres teria começado
há mais de dois anos, quando
um diplomata norueguês terá indagado da disponibilidade do português para ocupar o cargo. A candidatura só seria formalizada mais tarde mas
desde o passado mês de julho,
António Guterres venceu claramente todas as seis eleições entre os
membros do Conselho de Segurança, eliminando sucessivamente os
candidatos patrocinados por
Jean Claude Juncker, atual presidente da Comissão Europeia, ou pela chanceler
Angela Merkel.
As dúvidas quanto ao sentido de voto da
Rússia, um dos cinco
membros permanentes do Conselho de Segurança, dissolveram-se ontem,
5 de outubro. Um resultado que se apresenta como uma clara vitória da diplomacia portuguesa.
FRASES
“António Guterres era e é, claramente, o melhor para o cargo. Pelas
suas qualidades pessoais, pelo seu currículo na própria ONU, pela
capacidade de visão e de equação dos principais problemas universais”.
Marcelo Rebelo de Sousa, presidente de Portugal
“Foi um grande trabalho da nossa diplomacia, um grande esforço que
todos temos feito, todos os órgãos de soberania, todos os partidos”.
António Costa, primeiro-ministro de Portugal
“António Guterres tem a capacidade de estabelecer pontes. Ele vai
ser um secretário-geral que representa a voz das Nações Unidas como tal,
de todas as nações, de todos os 193 países que fazem parte das Nações
Unidas”,
Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros
“Triunfou uma forma participada, contra manobras de última hora”,
Jorge Sampaio, presidente de Portugal
“Que a sua sensatez e o respeito que a sua voz inspira no mundo possam fazer a diferença”. Cavaco Silva, presidente de Portugal
“É histórico para Portugal, é a primeira vez que um português terá este lugar tão relevante”.
Passos Coelho, líder do PSD
As Nações Unidas mostraram-se imunes a “manobras mais ou menos estranhas”.
Catarina Martins, líder do BE
Uma vitória pessoal e da diplomacia portuguesa que “honra muito Portugal”.
Assunção Cristas, líder do CDS
É necessário contrariar a “linha de instrumentalização” da ONU.
Ângelo Alves, dirigente do PCP
“Uma boa notícia para a ONU e para Espanha”.
Mariano Rajoy, primeiro-ministro de Espanha
“Um bom amigo, um homem de visão, coração e ação. A cooperação entre
a União Europeia e as Nações Unidas vai tornar-se mais forte”.
Federica Mogherini, Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança
Visto de fora
A imprensa internacional destaca a capacidade de diálogo de António
Guterres, o facto de se ter imposto aos candidatos femininos ou a
surpreendente união do Conselho de Segurança das Nações Unidas. O
editorial do
“New York Times”, “uma nova voz para um mundo complicado”, começa logo por dizer que Guterres é
“uma excelente escolha para suceder a Ban-Ki Moon”.
O “Observador” fez um
apanhado do que foi dito “lá fora”. O “DN” recolhe vários depoimentos que
contestam a provável eleição de um homem,
quando seria expectável a nomeação de uma mulher enquanto
secretária-geral da ONU. O “Economist” saúda Guterres até porque
considera os dois mandatos de Ban-Ki Moon um “flop” mas cita o seu
antecessor:
“um homem de princípios mas também um pragmático”.
A BBC pergunta (e responde):
“quem é António Guterres?”
Os trabalhos de Guterres
Enquanto todo o país e (grande parte do) mundo
rejubilam
com a vitória de guerra, já se apontam alguns dos desafios que o novo
secretário-geral das Nações Unidas terá de enfrentar. A guerra na
Síria, a questão dos
refugiados, a
desigualdade, a
Coreia do Norte ou a
Rússia são apenas uma parte dos problemas com que Guterres se irá defrontar.
O “Diário de Notícias” já descobriu dez.
Vencidos
Se Guterres é o grande vencedor,
Kristalina Georgieva e
Angela Merkel
são os maiores perdedores desta eleição. A chanceler defendeu, à última
hora e com o apoio de países como a Hungria a candidatura Kristalina.
Ambas perderam e o seu futuro parece cada vez mais comprometido. Georgieva terá que abandonar o seu cargo de comissária europeia?
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