Agustina Bessa-Luís, nome literário de Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa GOSE • GCSE (Amarante, Vila Meã, 15 de outubro de 1922 — Porto, 3 de junho de 2019) foi uma escritora portuguesa.[1][2]
Biografia
Infância e juventude
Segunda e ultimogénita filha[3] do empresário Artur Teixeira Bessa (1882-1964), duma família rural de Entre Douro e Minho, e de sua mulher Laura Jurado Ferreira (1899-?), que era filha de pai Português, Lourenço Guedes Ferreira, Engenheiro dos Caminhos de Ferro, e de mãe Espanhola, sua mulher Lourença Agustina Jurado Franco, nascida em Zamora.[4]
Regressado a Portugal, o pai de Agustina, que já no Brasil se dedicara à exploração de casas de espectáculo e de jogo, tornou-se gerente do Casino da Póvoa. As contingências da sua vida levaram a família a viver em vários lugares do Norte e do Douro — Gaia, Porto, Póvoa de Varzim, Águas Santas, Outeiro Maior, Vila do Conde e Godim, naquela que era a casa de família da sua mãe. A relação com a região duriense, durante largas temporadas da sua infância e adolescência, marcaria de forma indelével a obra da escritora.[4]
Desde muito jovem que Agustina se interessou por livros, descobrindo na biblioteca do avô materno, os clássicos da literatura espanhola, francesa e inglesa, marcantes na sua formação literária. Em 1932 vai para o Porto estudar, onde passa parte da adolescência, mudando-se para Coimbra em 1945. A partir de 1950 fixa definitivamente a sua residência no Porto.
Casou a 25 de julho de 1945, na cidade do Porto, com o estudante de Direito Alberto Luís, que conheceu através de um anúncio no jornal "O Primeiro de Janeiro", publicado pela escritora, no qual procurava uma pessoa culta com quem se corresponder. Do seu casamento teve uma única filha, Mónica Bessa-Luís Baldaque, museóloga, pintora e autora de vários livros. Do casamento de sua filha, nasceram um filho chamado Alberto e duas filhas chamadas Leonor e Lourença Agustina.
Actividade literária
Estreou-se como uma brilhante romancista em 1949, ao publicar a novela Mundo Fechado, mas seria o romance A Sibila, publicado em 1954 que constituiu um enorme sucesso e lhe trouxe imediato reconhecimento geral. E é com A Sibila que atinge a total maturidade do seu processo criativo.
É conhecido o seu interesse pela vida e obra de um dos grandes expoentes da escola romântica, Camilo Castelo Branco, cuja herança se faz sentir quer a nível temático (inúmeras obras de Agustina se relacionam com a sociedade de Entre Douro e Minho), quer a nível da técnica narrativa (explorou ficcionalmente a própria vida de Camilo). Essa filiação associa Agustina à corrente neo-romântica, como defende Eduardo Lourenço.[5]
Vários dos seus romances foram adaptados ao cinema pelo realizador Manoel de Oliveira, com quem manteve uma relação de amizade e de colaboração próxima. Exemplos desta parceria são Fanny Owen (Francisca, 1981), Vale Abraão (filme homónimo, 1993), As Terras do Risco (O Convento, 1995) ou A Mãe de um Rio (Inquietude, 1998). Foi também autora de peças de teatro e guiões para televisão, tendo o seu romance As Fúrias sido adaptado para teatro e encenado por Filipe La Féria, (Teatro Nacional D. Maria II, 1995).
A sua criação era extremamente fértil e variada. Escreveu até o momento mais de cinquenta obras, entre romances, contos, peça de teatro|peças de teatro, biografias romanceadas, crónicas de viagem, ensaios e livros infantis. Foi traduzida para alemão, castelhano, dinamarquês, francês, grego, italiano e romeno. A Sibila já atingiu a vigésima quinta edição, sendo de leitura opcional no Ensino Secundário.
Em 2005, participou no programa da RTP Ela por Ela, série de 13 episódios sobre provérbios e aforismos, em conversa com Maria João Seixas, realizado por Fernando Lopes.
Em julho de 2006, pouco depois de terminar a sua última obra, A Ronda da Noite, deixou de escrever e retirou-se da vida pública, devido a razões de saúde,[6][7] tendo sofrido um acidente vascular cerebral.[8][9][10]
Morte
Morreu a 3 de junho de 2019, em sua casa, no Porto, vítima de doença prolongada.[11]
Atividades institucionais
Além da atividade literária, envolveu-se em diversos projetos. Foi membro do Conselho Diretivo da Comunitá Europea degli Scrittori (Roma) (1961-1962). Colaborou em várias publicações periódicas, tendo sido entre 1986 e 1987 diretora do diário O Primeiro de Janeiro (Porto). Entre 1990 e 1993 assumiu a direção do Teatro Nacional D. Maria II (Lisboa) e foi membro da Alta Autoridade para a Comunicação Social. Foi ainda membro da Academie Européenne des Sciences, des Arts et des Lettres (Paris), da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa (Classe de Letras).
Distinções e prémios
Foi distinguida com o grau de Grande-Oficial da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico, Literário e Artístico, a 9 de abril de 1981, tendo sido elevada ao grau de Grã-Cruz da mesma Ordem a 26 de janeiro de 2006.[12]
Em 2005, foi-lhe atribuído o título de Doutora Honoris Causa pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Em 2004, aos 81 anos, recebeu o mais importante prémio literário da língua portuguesa, o Prémio Camões. Na ata do júri da XVI edição do Prémio, pode ler-se que "o júri tomou em consideração que a obra de Agustina Bessa-Luís traduz a criação de um universo romanesco de riqueza incomparável que é servido pelas suas excepcionais qualidades de prosadora, assim contribuindo para o enriquecimento do património literário e cultural da língua comum".
Recebeu ainda:
Condecorações oficiais[12]
Obra
Escreveu livros de diversos tipos, na sua maioria romances. Com a novela Mundo Fechado estreou-se como romancista. Contudo, foi com o romance A Sibila que ganhou o reconhecimento e a atenção da crítica literária. A sua escrita opõe-se a qualquer tentativa de contextualização, em termos de correntes, na história da literatura portuguesa. A escritora surgiu no panorama literário português numa altura em que a oposição entre o neorrealismo e o modernismo do movimento da Presença atingia o seu auge. Dedicou-se quase inteiramente à criação literária e, desde sua estreia em 1948, manteve um ritmo de publicação pouco usual nas letras portuguesas.
Conhecida não só como romancista, mas também como autora de peças de teatro, guiões de cinema, biografias, ensaios e livros infantis, a sua obra conta com mais de meia centena de títulos. Também se distinguiu enquanto articulista da "escola" do "jornalismo literário", tendo colaborado com assiduidade na imprensa. A autora revela preocupação pela condição social e cultural dos portugueses, particularmente interessada em perscrutar o passado, recorrendo à ficção para problematizar o conhecimento histórico e vivencial.
Ficção
Biografias
Teatro
Crónicas, memórias, textos ensaísticos
Literatura infantil
Adaptações cinematográficas
- 1981 - Francisca, real. Manoel de Oliveira, romance Fanny Owen
- 1993 - Vale Abraão, real. Manoel de Oliveira, romance Vale Abraão
- 1995 - O Convento, real. Manoel de Oliveira, com Catherine Deneuve e John Malkovich, romance As Terras do Risco
- 1996 - Party, real. Manoel de Oliveira, peça Party: Garden-Party dos Açores
- 1998 - Inquietude, real. Manoel de Oliveira, conto A Mãe de um Rio, Prêmio Globo de Ouro (1999) para a melhor realização
- 2002 - O Princípio da Incerteza, real. Manoel de Oliveira, romance O Princípio da Incerteza
- 2005 - Espelho Mágico, real. Manoel de Oliveira, romance A Alma dos Ricos
- 2009 - A Corte do Norte, real. João Botelho
Prémios
Prémios à autora
Prémios às obras
- 1953 - Prémio Delfim Guimarães (Guimarães Editores), (A Sibila)
- 1954 - Prémio Eça de Queirós (Secretariado Nacional de Informação), (A Sibila)
- 1966 - Prémio Ricardo Malheiros (Academia das Ciências de Lisboa), (Canção Diante de uma Porta Fechada)
- 1967 - Prémio Nacional de Novelística (Secretariado Nacional de Informação), (Homens e Mulheres)
- 1977 - Prémio Ricardo Malheiros (Academia das Ciências de Lisboa) — Prémio Literário, (As Fúrias)
- 1980 - Prémio P.E.N. Clube Português de Ficção, (O Mosteiro)
- 1980 - Prémio D. Dinis (Fundação Casa de Mateus), (O Mosteiro)
- 1983 - Prémio de Romance e Novela, Associação Portuguesa de Escritores, (Os Meninos de Ouro)
- 1988 - Prémio RDP Antena 1 da Literatura (Ex-aequo), (Prazer e Glória)
- 1993 - Prémio da Crítica (Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários), (Ordens Menores)
- 1994 - Prémio Municipal Eça de Queirós (Câmara Municipal de Lisboa) — Prémio de Prosa de Ficção, (As Terras do Risco)
- 1996 - Prémio Máxima de Literatura (Memórias Laurentinas e Party)
- 1997 - Prémio União Latina de Literaturas Românicas, Itália (Um Cão que Sonha)
- 2001 - Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores (Jóia de Família)
Bibliografia
- BULGER, Laura Fernanda, A Sibila: Uma superação inconclusa, Lisboa, 1990.
- CASTELO BRANCO, Maria do Carmo, A fala da Sibila: nótulas para a leitura de “A Sibila” de Agustina Bessa Luís, Porto, 1990.
- COSTA, Maria Moreira da, A Sibila de Agustina Bessa Luís, Mem Martins, 1990.
- DUMAS, Catherine, Estética e personagens no romance de Agustina Bessa Luís, Porto, 2002.
- LEÃO, Isabel Vaz Ponce de; Olímpio PINHEIRO, Agustina 1948-1998. Bodas escritas de oiro, Porto, 1999.
- LEMOS, Filomena Maria; Laura Maria PEREIRA, Ler, reler, criar, produzir… a obra literária “Dentes de Rato”, Lisboa, 2000.
- LIMA, Isabel Pires de, Vozes e olhares no feminino, Porto, 2001.
- LOPES, Silvina Rodrigues, A alegria da comunicação, Lisboa, 1989.
- LOPES, Silvina Rodrigues, Agustina Bessa Luís: As hipóteses do romance, Porto, 1992.
- MACHADO, Álvaro Manuel, Agustina Bessa Luís: O Imaginário Total, Lisboa, 1983.
- MANUEL, Maria Antónia Câmara; João Manuel MORAIS, Análise de “A Sibila” de Agustina Bessa Luís, Lisboa, 1987.
- MARINHO, Maria de Fátima, O romance histórico em Portugal, Porto, 1999.
- PADRÃO, Maria Glória; Maria Helena PADRÃO, A Sibila de Agustina Bessa Luís: o romance e a crítica, 3a ed., Porto, 1987.
- PADRÃO, Maria Helena Os Sentidos da Paixão Edições da Universidade Fernando Pessoa, Porto, 1998.
- PORTELA Filho, Artur, Agustina por Agustina. Entrevista conduzida por Artur Portela Fº, Lisboa, 1986.
Fontes
- ↑ «Cópia arquivada». Consultado em 18 de Agosto de 2010. Arquivado do original em 9 de Abril de 2010
- ↑ O assento de nascimento refere Travanca como local de nascimento. Contudo, a própria Agustina Bessa-Luís afirma ter nascido numa casa de Vila Meã, onde se situava o domicílio familiar.
- ↑ José Artur Teixeira Bessa, seu irmão mais velho.
- ↑ Ir para:a b Círculo Literário Agustina Bessa-Luís
- ↑ "(…) estas novas terras romanescas entreabertas pela passagem de Sibila bem podem receber o nome de neo-românticas", Sobre Agustina, in O Canto do Signo, Existência e Literatura (1957-1993), Lisboa: Presença 1994, 162.
- ↑ A romancista que sonhou a sua obra Arquivado em 11 de maio de 2012, no Wayback Machine. por Carlos Câmara Leme, Revista Ler, Janeiro de 2009, p. 42. Página visitada em 04-01-2014.
- ↑ Textos inéditos de Agustina Bessa-Luís vão ser publicados na próxima semana, in Sol, 24-10-2013. Página visitada em 04-01-2014.
- ↑ Ana Soromenho (3 de junho de 2019). «"Eu só queria escrever, entrar no coração das pessoas e beber-lhes o sangue": Agustina Bessa-Luís 1922-2019». 03-06-2019. Consultado em 24 de setembro de 2020
- ↑ Anabela Mota Ribeiro (12 de outubro de 2014). «O riso de Agustina». 12-10-2014. Consultado em 24 de setembro de 2020
- ↑ Inês Nadais, Joana Amaral Cardoso, Lucinda Canelas e Isabel Coutinho (3 de junho de 2019). «Morreu Agustina Bessa-Luís, o nosso grande "mistério literário"». 3-6-2019. Consultado em 20 de setembro de 2020
- ↑ Morreu a escritora Agustina Bessa-Luís (1922-2019), TSF 03.06.2019
- ↑ Ir para:a b «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "Agustina Bessa Luís". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 8 de junho de 2014
- ↑ «Prêmio Camões de Literatura». Brasil: Fundação Biblioteca Nacional. Cópia arquivada em 16 de Março de 2016
- ↑ «O PEN Clube de Galicia entrega mañá en Santiago os premios Rosalía de Castro». La Voz de Galicia (em espanhol). 23 de maio de 2006. Consultado em 12 de dezembro de 2020
Ligações externas