Sol e temperaturas acima dos 20 graus. Bem sei que não há memória mais curta do que a metereológica, mas já tínhamos saudades de um fim-de-semana que não fosse de inverno-inverno. Por isso, e também para variar um pouco, o Macroscópio de hoje vai saltitar por diferentes temas, recomendando alguns artigos que, espero, proporcionarão boas leituras e, ao mesmo tempo, darão que pensar.
Começo regressando a temas de ciência, temas que ontem nos ocuparam boa parte do tempo. Desta vez para sugerir dois artigos sobre o nosso cérebro. Um é sobretudo curioso e instrutivo, o outro é um pouco mais controverso e arrepiante. O primeiro, do El Pais, diz-nos que
El cerebro humano es una máquina hecha con piezas recicladas. Recicladas? Exactamente: “
investigadores de Dartmouth College revisan lo que se conoce sobre la materia y explican que nuestra habilidad para responder a rápidos cambios culturales es posible porque el cerebro es capaz de reutilizar para usos modernos circuitos cerebrales surgidos por motivaciones antiguas. Ese sería el caso de la lectura, una actividad que los humanos solo han practicado de forma habitual en el último siglo de sus 150.000 años de existencia como especie. “No evolucionamos para leer, pero la investigación muestra que leemos reciclando un engranaje neuronal que evolucionó para procesar caras y objetos”, afirma Carolyn Parkinson, una de las autoras del artículo.” O segundo texto é mais perturbador e encontrei-o no Financial Times. Trata da possibilidade de um dia, não muito longínquo, se poderem transplantar cabeças. Um neurocirurgião italiano fala mesmo de isso ser possível já em 2017. Mais: essa possibilidade cirúrgica poderia, por exemplo, devolver a Stephen Hawking, o físico brilhante que há décadas vive preso a uma cadeira de rodas, um corpo saudável. Como devem imaginar os problemas éticos são enormes, e é deles que se fala em
The long, unnerving history of the head transplant. Pequeno extrato:
Grafting the head of one person on to the body of another creates new ethical territory in terms of what it means for the recipient’s sense of identity and psychological wellbeing. The closest analogy is face transplants, which are, in rare instances, used to treat disfiguring facial injury (given that severe immune rejection can kill, many medics disapprove of putting otherwise healthy people through life-threatening surgery). Still, a handful of full face transplants have now been carried out and patients report the immense psychological benefits of no longer standing out. Salto agora para o Médio Oriente, onde sem uma ordem especial vos indicarei alguns artigos. O primeiro é um que já tenho aqui guardado há uns tempos, à espera de uma boa oportunidade:
‘Monuments Men’ Seek to Halt Syrian Plunder. Trata-se de uma reportagem de fundo do Wall Street Journal sobre um tema de candente atualidade: “
Ancient sites are being looted and damaged in battle as Islamic State escalates trafficking in artifacts. Syria’s “monuments men,” a group of academics, archaeologists and volunteers, are seeking to halt the plunder at its source.” Quem tiver dúvidas sobre a importância e atualidade do tema, leia a notícia do dia:
Estado Islâmico ataca cidade histórica de Nimrud. Nimrud, para quem não saiba, era uma antiquíssima cidade assíria e os seus monumentos com milhares de anos estão a ser, ou já foram, destruídos por bulldozers.
Continuando no Médio Oriente, chamo-vos a atenção para o mais recente Conversas à Quinta, o programa semanal em que, aqui no Observador, tenho o prazer de ouvir Jaime Gama e Jaime Nogueira Pinto a, de forma civilizada e culta, debaterem temas da actualidade com uma profundidade hoje desaparecida dos nossos canais de televisão. Hoje estivemos a conversar sobre o significado do discurso de Benjamin Netanyahu no Congresso dos Estados Unidos, um discurso muito crítico para Obama. Em
Israel e os Estados Unidos: amuo ou divórcio? Falamos não apenas deste evento político, mas de todo o Médio Oriente, da política de alianças dos Estados Unidos e dos riscos de proliferação nuclear. É um programa que também pode descarregar para o seu smartphone em formato audio. Pode ouvir o podcast quer através do
iTunes ou do
SoundCloud do Observador.
(Apenas uma nota, indispensável: há um bom artigo de análise – e crítica – do discurso de Netanyahu no Financial Times:
The answer for Israel’s Benjamin Netanyahu is war against Iran)
Já que falamos de proliferação nuclear, devo chamar a atenção para o facto de esse ser, precisamente, o tema de capa da revista The Economist desta semana. Em
The new nuclear age, a revista descreve um cenário relativamente inquietante antes de defender a seguinte ideia:
What to do? The most urgent need is to revitalise nuclear diplomacy. One priority is to defend the nuclear Non-Proliferation Treaty, which slows the spread of weapons by reassuring countries that their neighbours are not developing nukes. It was essential that Iran stayed in the treaty (unlike North Korea, which left). The danger is that, like Iran, signatories will see enrichment and reprocessing as preparation for a bomb of their own—leading their neighbours to enrich in turn. That calls for a collective effort to discourage enrichment and reprocessing, and for America to shore up its allies’ confidence. A terminar este bloco de sugestões da imprensa internacional, apenas mais três referências. Duas são sobre um tema inevitável da actualidade, a interminável crise grega. A minha primeira escolha recaiu neste caso numa análise do Wall Street Journal,
Greece vs. Germany: Two Competing National Narratives. É um texto interessante porque explica bem a forma como os gregos olham para os alemães e os alemães olham para os gregos. Só que…
The popular narratives on both sides are therefore at best only partly true or ignore countervailing factors. They may impede solutions because, when fervently believed, they absolve each side from taking responsibility. O segundo texto “grego” é mesmo grego, pois foi publicado no Greek Reporter, um site de informação grego em inglês. Em
Greek Gov’t Looking More and More Like the Tower of Babel dá-se conta das dificuldades que Alexis Tzipras está a enfrentar no interior do seu próprio Syriza, dificuldades que o levaram a evitar um voto no parlamento sobre o acordo conseguido no Eurogrupo. Eis como termina essa reportagem:
It is no surprise then, that the only person in the cabinet who is in tune with reality receives the most fire from the obsessive leftists. Yanis Varoufakis has lived abroad for most of his life. He has lived in countries with robust economies such as the U.S.A. and Australia. He knows what a real economy is. Something that the leftist fanatics in the cabinet seem to have no idea about. Termino com um texto sobre história, uma primeira referência entre muitas que este ano por certo farei a um aniversário marcante: a passagem de 200 anos sobre a Batalha de Waterloo. É um texto do Telegraph e que nos fala do custo em sangue, em vidas humanas, dessa batalha que terminou, de vez, com as ambições de Napoleão:
Why we must remember the bloody cost of Waterloo. De facto, “
Some 55,000 soldiers were killed and wounded during the Battle of Waterloo, a carnage comparable to the first day of the Somme.” O texto é muito interessante e tem como base um livro que acaba de ser publicado no Reino Unido,
The Bloody Fields Of Waterloo, by Michael Crumplin. Como derradeira sugestão de leitura para este fim-de-semana, regresso ao Observador e um dos seus Especiais. Neste caso uma belíssima reportagem de António Reis,
O pugilista e o adversário dele, o tempo, que se apresenta assim: “
Durante 20 anos, em Portugal, um homem foi campeão de boxe 14 vezes. Jogou de 1968 a 1988. Ganhou muito combate, mas nunca por KO. Hoje é um dos 600 portugueses com Esclerose Lateral Amiotrófica.” É um texto comovente que, ao que o Observador sabe, já está a ajudar Alcino Palmeira, o antigo
boxeur a conviver melhor com a doença. Um jornalismo que, também por isso, dá gosto.
E por aqui nos ficamos. Tenham um bom fim-de-semana, aproveitem a anunciada Primavera antecipada e não se esqueçam das leituras.
Bom descanso a todos.