Santiago Maior
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Santiago Maior Santiago Apóstolo | |
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Santiago, numa obra de Rembrandt van Rijn | |
Apóstolo e Mártir | |
Nascimento | ? Betsaida, Galileia |
Morte | c. 44 Jerusalém |
Veneração por | Igreja Católica, Igrejas Orientais, Igreja Anglicana, Igreja Ortodoxa, Protestantismo |
Principal templo | Catedral de Santiago de Compostela, Galiza, Espanha |
Festa litúrgica | 25 de julho |
Atribuições | peregrino, cavaleiro, vieira, chapéu de viandante, cajado |
Padroeiro | dos peregrinos, dos cavaleiros, dos veterinários, dos farmacêuticos, dos alquimistas, 2ª secção do CNE, etc.; do Chile, da Guatemala, da Nicarágua e da Espanha, e inúmeras outras localidades |
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Santiago Maior, também chamado de Santiago Filho do Trovão (Boanerge), Tiago, filho de Zebedeu e Santiago Apóstolo o Maior,[1] martirizado no ano 44, foi um dos doze apóstolos de Jesus Cristo. Foi feito santo e chamado Maior (mais velho) para o diferenciar de outro discípulo de Jesus de mesmo nome, conhecido como Santiago Menor (mais jovem) e também de Tiago, o Justo, sendo estes últimos possivelmente a mesma pessoa: Tiago, menor; Tiago, o justo; e Tiago, irmão do Senhor.
Os nomes Tiago e Jaime derivam indirectamente do latim Iacobus, por sua vez uma latinização do nome hebraico Ya'akov (aportuguesado em "Jacó") e da sua associação Sanctus Iacopus.
Com o decorrer do tempo, o nome evoluiu em diversas direcções consoante as línguas: manteve-se Jakob em alemão e noutras línguas nórdicas, James em inglês, Giacomo em italiano e Jacques em francês.
Na Península Ibérica, há diferenças substanciais: Tornou-se Jaume ou Jaime (formas correntes no catalão). Jácome é adaptação antiga do italiano Giàcome, que subsiste como apelido pouco comum na Galiza e em Portugal. Há quem pense que o nome Iago / Yago é a forma patrimonial das línguas do centro e ocidente da Península Ibérica, mas isto é falso. A únicas formas patrimoniais em castelhano, que já aparecem registadas no Cantar del Mio Cid,[2] são Yaguo e Yagüe, ambas com evolução fonética normal a partir do acusativo e do vocativo, respectivamente. O nome do santo nesta obra aparece como Santi Yaguo e, em função vocativa, Santi Yagüe (por exemplo, quando é usado como grito de guerra dos cristãos). A forma Yaguo parece ter desaparecido por completo, mas Yagüe ainda se conserva como apelido (por exemplo, em Madrid há uma rua dedicada ao General Yagüe).
No domínio linguístico galego-português, é impossível que Iago seja uma forma patrimonial, porque todos os I latinos em posição inicial pré-vocálica (pronunciados [i] primeiro e [j] semivogal depois) dão lugar em romance à consoante fricativa sibilante pré-palatal ou palato-alveolar [ž] (IPA [ʒ]), assim já < iam, Janeiro < Ianuarius, jantar < iantare, jeito < iactus, João < Iohannes, jogo < iocus, junco < iuncus, etc., como se pode verificar em qualquer manual básico de história da língua.[3] Portanto, o resultado esperado, a ter havido uma evolução do nome isolado, seria "Jago", "Jagó", "Jágovo", ou qualquer coisa semelhante. O que de facto ocorreu é que aqui a pressão conservadora da Igreja manteve unido o nome ao adjectivo, que evoluíram juntos como uma palavra: "Santiago". A partir de "Santiago", por via popular, produz-se a deglutinação lógica San-Tiago (São Tiago). É assim que nasce o nome próprio português e galego "Tiago" e é por isso que o nome do apóstolo e os padroeiros de múltiplas freguesias por todo o país aparecem abreviados nos textos escritos como STiago desde a mesma Idade Média.
O nome Iago / Yago entra nas línguas peninsulares, bem como no italiano,[4] no século XIX e início do XX, devido à popularidade das personagens das óperas dramáticas e, em especial, líricas (por exemplo, "Otelo", "Aída", "Carmen"...). En concreto, "Yago" é uma personagem da ópera "Otelo" (baseada na obra do mesmo título de Shakespeare), com libreto do Conde Berio e música de Rossini, que foi estreada em 1816. E Iago é apenas a adaptação escrita do nome às ortografias portuguesa e galega, que não usam a letra Y. Chega com consultar um bom dicionário da língua portuguesa como o Aurélio,[5] para verificar que não só "Iago" procede da personagem da peça "Otelo", como ainda é empregado como substantivo comum para designar o "Indivíduo astuto, intrigante, falso, velhaco", coisa que não faria sentido se se tratasse dum nome próprio tradicional e comum na língua portuguesa. A chegada do nome a Espanha é o que fez inventar, em certos ambientes, a forma "Sant'Iago", da abreviatura do latim de Sant Iacob.
Segundo o Novo Testamento, Tiago era filho de Zebedeu e Salomé, e irmão do apóstolo São João Evangelista.
Nasceu em Betsaida, Galileia. Tal como o seu pai e o irmão, o apóstolo João, era pescador no mar da Galileia, onde trabalhava em provável parceria com André e Simão Pedro (Mateus 4:21–22 e Lucas 5:10), consertava as redes de pesca. Tiago, Pedro e João seriam, de resto, os primeiros a abandonar tudo para seguirem Jesus como seus discípulos (Mateus 17:1 e Mateus 26:37; Lucas 8:51), tendo sido dos seus mais próximos colaboradores, ao participarem na Transfiguração, na Agonia de Cristo no Jardim das Oliveiras.
No evangelho de Mateus, conta-se que a mãe de ambos, Tiago e João, Salomé, em seu orgulho materno, pediu a Jesus que seus dois filhos, Tiago e João, fossem colocados um à direita e outro à esquerda, no Reino de Deus, porém Jesus lhe objetou: "Vós não sabeis o que pedis. Podeis beber o cálice que eu hei de beber?". Os apóstolos responderam: "Podemos". "Pois bem, isso é verdade", concluiu Jesus, "mas dar-vos o primeiro lugar no Reino, isso depende do meu Pai, que está no céu". Este episódio causou alguma irritação entre os demais apóstolos, pois era uma tentativa óbvia de destacar-se acima do grupo.
Segundo Marcos 3:17, Tiago e João são chamados por Jesus como Boanerges, isto é, "Filhos do trovão". Isto se deu por um fato que caracterizou a índole de ambos: ao chegar Jesus com sua comitiva à terra dos samaritanos, estes lhe interditaram a entrada. João e Tiago viram neste fato uma afronta a Cristo e exprimiram sua indignação com estas palavras: "Queres, Senhor, que mandemos cair fogo do céu sobre esta cidade, para consumi-la?". Jesus, porém os repreendeu dizendo: "Vós não sabeis de que espírito sois! O Filho do Homem não veio para perder, mas para salvar as almas" (Lucas 9:54).
Segundo a Bíblia é um dos discípulos mais íntimos de Jesus de Nazaré, já que em várias ocasiões onde Jesus só se fazia acompanhar por 3 apóstolos, era ele escolhido, junto a Pedro e João. Assim se deu na Transfiguração no Monte Tabor, por ocasião da ressurreição da filha de Jairo e no Jardim das Oliveiras, pouco antes da prisão de Jesus.
Tiago é citado entre os testemunhos da terceira aparição de Cristo após a sua morte e ressurreição, nas margens do lago de Tiberíades.
Pouco mais se sabe acerca de sua vida. A sua última aparição no texto bíblico mais aceito é a de que foi o primeiro apóstolo a morrer e teria sido mandado decapitar por ordem de Herodes Agripa I, rei da Judeia, por volta do ano 44, em Jerusalém. É, aliás, o único apóstolo cuja morte vem narrada na Bíblia,«Ele [Herodes] fez perecer pelo fio da espada Tiago, irmão de João» (Atos 12:1–2).
Muitos são os que creem que Tiago tenha visitado a província romana da Hispânia e pregado a doutrina cristã, logo após o episódio de Pentecostes. Na cidade de Saragoça, teria presenciado uma aparição de Maria, mãe de Jesus, que ainda vivia. Tal aparição, em cima de um pilar, originou o culto de Nossa Senhora do Pilar. Devido ao insucesso em evangelizar os pagãos da Península Ibérica, Tiago teria regressado à Judeia, onde foi martirizado. Os locais que terá passado em Portugal em vida incluem Braga, Guimarães e Rates, onde o seu discípulo São Pedro (de Rates) se tornou o primeiro bispo de Braga ca. 45. assim como em vários locais da Galiza, na Espanha.
Segundo uma tradição lendária, o corpo de Santiago teria sido transportado para a Galiza, e sepultado no lugar de Compostela (depois chamado, em sua honra, Santiago de Compostela). A partida terá acontecido no porto de Jafa, perto de Jerusalém, dentro de uma "arca" de pedra" feito barco arrastado pelo vento assoprado pelos anjos, atravessou o Mediterrâneo e a Costa Portuguesa, e veio a desembarcar em Padrón, pertencente depois à diocese de Iria Flávia. No entanto, obviamente, não há provas que permitam corroborar com exactidão esta lenda a não ser dizer que foi encontrado um túmulo dos tempos primórdios do cristianismo, por baixo da Catedral de Compostela, acompanhado de outros dois de cada lado. O que é mais significativo é que num deles tem visível um dos nomes dos dois discípulos de Santiago e que, segundo ela, ajudaram que essa façanha fosse possível.[6]
Certo é que em 814, na Galiza, um eremita (seu nome Pelaio), seguindo uma revelação que tivera durante o sono, descobriu um túmulo contendo umas relíquias, e estas foram de imediato veneradas e associadas a Santiago, em virtude da lenda que afirmava que este se havia deslocado à Espanha para dar testemunho de Cristo. Sobre essa tumba viria a ser erguida a referida Catedral de Santiago de Compostela.
Como depois outra lenda conta que logo depois terá surgido no céu durante a Batalha de Clavijo, montado a cavalo e espada na mão a apoiar as hostes cristãs contra os mouros, permitindo com esse gesto milagroso a vitória do rei Ramiro I contra estes últimos. Santiago tornou-se o santo padroeiro de toda a Espanha, da qual fazia parte a Galiza, Leão e Castela, Aragão e o reino de Portugal mesmo depois da independência do reino de Leão e Castela, sendo ainda hoje o padroeiro do exército português e do espanhol.
O santuário em Compostela, tornou-se um dos mais famosos locais de peregrinação do mundo cristão, sobretudo na Idade Média, só superado por Roma e Jerusalém — as dificuldades no acesso a estes destinos acaba por conduzir muitos peregrinos a Compostela, especialmente após o final do perigo muçulmano na Península Ibérica. Mais tarde, nos séculos XVII e XVIII, surge novo impulso dinamizado pelos efeitos da Contra-reforma, após concílio de Trento, em que houve uma vaga massiva de peregrinos que desembarcou nos portos atlânticos para o fazer a pé e a cavalo. O Caminho de Santiago passou por isso a designar um conjunto de rotas, pejadas de albergues e hospícios dedicados ao santo, que cruzavam a Europa Ocidental e Portugal até Santiago de Compostela, através do norte de Espanha.
Ainda hoje, dezenas de milhares de peregrinos se dirigem anualmente a Santiago de Compostela, considerada a terceira cidade mais sagrada no cristianismo depois de Jerusalém e Roma [7]. No entanto não é de descorar a chamada de atenção de que a primeira fica no Oriente, a segunda ao centro, e esta fica muito perto ao "extremo" mais ocidental da terra cristã então conhecida (Finisterra).
De acordo com outras tradições, Santiago teria aparecido miraculosamente em vários combates travados em Espanha durante a Reconquista Cristã — Batalha de Clavijo, em 844 — sendo a partir de então apelidado de Matamoros ("Mata-Mouros"). Santiago y cierra España foi desde então o grito de guerra dos exércitos de Hispânia. Santiago foi também protetor do exército português, pelas razões explicadas acima, até à crise de 1383-1385, altura em que o seu brado foi substituído, oficialmente, pelo de São Jorge através da influência da corte inglesa, que então se tinha aliado a Portugal. Na prática os soldados portugueses continuaram a invocar Santiago nos seus combates, por razões de fé, tal como facilmente se pode verificar, por exemplo, lendo as descrições das Décadas da Ásia, de João de Barros.
Mais tarde, o escritor Cervantes registrou, no seu Don Quixote de la Mancha, que "Santiago Mata-Mouros é um dos mais valorosos santos e cavaleiros que o Mundo alguma vez teve; foi dado a Espanha por Deus, como seu padroeiro e para sua protecção".
No contexto da Reconquista, a Ordem Militar de Santiago foi fundada precisamente para combater os muçulmanos e guardar as fronteiras dos reinos cristãos da Península Ibérica, e a pertença à Ordem tornou-se uma grande dignidade. Mais tarde dividir-se-ia em dois ramos, um em Espanha, e o outro em Portugal, sendo esta a Ordem Militar de Santiago da Espada. Santiago é considerado o protector do exército português, embora depois da crise de 1383-1385, São Jorge, trazido pelos ingleses, passou a ser invocado contra as hostes espanholas. O florentino Giovanni da Empoli acompanhou os portugueses na toma de Malaca "sendo nosso capitão o Apóstolo Santiago", segundo escreveu na sua crônica.[8]
Santiago é aceite como santo por todas as confissões cristãs não protestantes. É festejado a 25 de julho, nas igrejas católica e luterana. Os ortodoxos comemoram-no a 30 de abril, os coptas a 12 de abril, e os etíopes a 28 de dezembro. A meados da Idade Média passou a ser concedido aos católicos a indulgência plenária pelos seus pecados. Estes tinham que se dirigir, em peregrinação e penitência, ao santuário de Santiago de Compostela nos Anos Jubilares Compostelanos, quando o seu dia santo calhasse num domingo.
Tiago, para além de padroeiro da Galiza e de todas as Espanhas, é também o santo protetor:
- dos cavaleiros, dos peregrinos, das peregrinações e dos caminhos
- do exército espanhol e do Português
- de inúmeras profissões: camionistas, chapeleiros, fabricantes de peles, tanoeiros, farmacêuticos, alquimistas, veterinários
- do Chile, da Guatemala e da Nicarágua, Colômbia, Cuba, México, Peru para além de inúmeras localidades ibero-hispanas
- da segunda secção dos escuteiros (CNE), os Exploradores.
- é também invocado para a prosperidade das macieiras e outras árvores de fruto e contra o reumatismo
Na iconografia, Santiago possui três representações:
- Como apóstolo (em pé, descalço, de túnica, segurando a Bíblia).
- Como peregrino, sentado ou em pé, usando sandálias, túnica, chapéu, cabaça, manto, e aquele que se tornou o símbolo de Santiago por excelência – a vieira (chamada concha de Santiago), a qual era usada frequentemente pelos peregrinos nos seus chapéus ou mantos – assim como um cajado, para auxiliar os peregrinos nas suas difíceis viagens por montes e vales.
- Por vezes, surge como cavaleiro, representado em um cavalo branco com uma espada em uma das mãos e um estandarte na outra. Essa devoção surge após a Batalha de Clavijo, em 844. Ao longo da Idade Média passa a ser conhecido como Santiago, o matamouros. A cruz com ponta de adaga torna-se um de seus símbolos.
- Na conquista hispânica na América, vê-se a quarta devoção a Santiago Maior. A iconografia de mata-mouros será readaptada, surgindo a figura de Santiago Mata-índios, que se tornará símbolo da conquista tanto de corpos quanto de almas no Novo Mundo.
Referências
- ↑ «Cópia arquivada» (PDF). Consultado em 29 de fevereiro de 2012. Arquivado do original (PDF) em 26 de novembro de 2010
- ↑ Ramón Menéndez Pidal (1969) Cantar del Mio Cid. (Texto, gramática y vocabulario). 4a. edición. Madrid: Espasa-Calpe.
- ↑ Edwin B. Williams (1975) Do Latim ao Português: Fonologia e morfologia históricas da língua portuguesa. 3a edição. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro.
- ↑ Emidio de Felice (1982) I nomi degli italiani. Roma: Sarin-Marsilio Editori.
- ↑ Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1986) Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2.ª edição revista e ampliada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
- ↑ «Catedral de Santiago de Compostela» (em espanhol). Consultado em 16 de março de 2024
- ↑ http://www.red2000.com/spain/santiago/history.html
- ↑ DA EMPOLI, Giovanni, in Dizionario Biografico degli Italiani - Volume 31 (1985), Giuliano Bertuccioli. Online em Treccani.it
- Enciclopédia Católica Santiago Maior (em inglês)
- Catedral de Santiago