sábado, 26 de fevereiro de 2022

VICTOR HUGO - ROMANCISTA - NASCEU EM 1802 - 26 DE FEVEREIRO DE 2022

 

Victor Hugo

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Victor Hugo
Victor Hugo em 1875, aos 73 anos, por Comte Stanisław
NascimentoVictor-Marie Hugo
26 de fevereiro de 1802
Besançondepartamento de DoubsFrança
Morte22 de maio de 1885 (83 anos)
ParisFrança
ResidênciaPlace des Barricades - Barricadenplein, rue Laffitte, Marine Terrace, Hauteville House, Museu-casa onde nasceu Victor Hugo, avenue Victor-Hugo, Calle de la Reina, Madrid, Maison du Pigeon - De Duif, Maison du Moulin à vent - De Windmolen, Place des Vosges, Rue Louise-Émilie-de-La-Tour-d'Auvergne, rue Catherine-de-La-Rochefoucauld
SepultamentoPanteão
NacionalidadeFrancês
CidadaniaFrança
Progenitores
CônjugeAdèle Foucher (c. 1822; m. 1868)
Filho(s)Léopold Victor Hugo
Léopoldine Hugo
Charles Hugo
François-Victor Hugo
Adèle Hugo
Irmão(s)Abel Hugo, Eugène Hugo
Alma materLycée Louis-le-Grand
OcupaçãoEscritor, artista, político,
Prêmios
  • Oficial da Legião de Honra (1837)
  • Concours général
Género literárioRomancedrama
Movimento literárioRomantismo
realismo
Obras destacadasOs Miseráveis
O Corcunda de Notre-Dame
Movimento estéticopensamento livreanticlericalismoromantismo
Títulovisconde
ReligiãoDeísmoEspiritismo[1][2][3][4]
Causa da mortepneumonia
Assinatura
Victor Hugo Signature.svg

Victor-Marie Hugo (Besançon26 de fevereiro de 1802 — Paris22 de maio de 1885) foi um romancistapoetadramaturgoensaístaartistaestadista e ativista pelos direitos humanos francês de grande atuação política em seu país. É autor de Les Misérables e de Notre-Dame de Paris, entre diversas outras obras clássicas de fama e renome mundial.

Biografia

1802 - 1830

Vista aérea do centro histórico da cidade de Besançon, às margens do rio Doubs, leste da atual República Francesa

Nascido em 26 de fevereiro de 1802 na commune de Besançon, no Doubs, leste da então prestes a ser dissolvida Primeira República Francesa, Victor Hugo foi o terceiro filho de Sophie Trébuchet (1772-1821) e Joseph Léopold Sigisbert Hugo (1774-1828), Conde de Siguença, um major que, mais tarde, se tornaria um general do exército napoleônico.

A infância de Victor Hugo foi marcada por grandes acontecimentos. Napoleão Bonaparte foi proclamado imperador dois anos depois de seu nascimento, e a monarquia dos Bourbons foi restaurada antes de seu décimo oitavo aniversário. Os pontos de vista políticos e religiosos opostos dos pais de Victor Hugo refletiam as forças que lutavam pela supremacia na França ao longo de sua vida: seu pai era um oficial que havia atingido uma elevada posição no exército de Napoleão. Era um deísta republicano que considerava Napoleão um herói, enquanto sua mãe era uma radical católica defensora da casa real, sendo que se acredita tenha sido amante do general Victor Lahorie, que foi executado em 1812 por conspirar contra Napoleão. Devido à ocupação do pai de Victor Hugo, Joseph, que era um oficial, mudavam-se com frequência e Victor aprendeu muito com essas viagens. Na viagem de sua família a Nápoles, ele viu as grandes passagens dos Alpes e seus picos nevados, o azul do Mediterrâneo e Roma durante suas datas festivas. Embora tivesse apenas cerca de seis anos à época, lembrava-se vividamente da viagem que durara meio ano. A família permaneceu em Nápoles por alguns meses e depois voltou para Paris.

Sophie acompanhou o marido em seus postos na Itália (onde Joseph Léopold ocupou o posto de governador de uma província perto de Nápoles) e Espanha (onde ele se encarregou de três províncias da Espanha). Cansada das constantes mudanças exigidas pela vida militar, e em litígio com o marido infiel, Sophie separou-se temporariamente de Joseph Léopold em 1803 e se estabeleceu em Paris. A partir de então, ela dominou a educação e formação de Victor Hugo. Como resultado, os primeiros trabalhos de Hugo na poesia e ficção refletem uma devoção apaixonada tanto do rei como da . Foi somente mais tarde, durante os eventos que levaram à Revolução de 1848, que ele iria começar a se rebelar contra a sua educação católica e monarquista e em vez disso advogar o republicanismo e o livre pensamento.

Victor Hugo passou a infância entre Paris, onde foi educado por muitos tutores e também em escolas privadas, Nápoles e Madrid.[5][6] Considerado um menino precoce, ainda jovem tornou-se escritor, tendo em 1817, aos 15 anos, sido premiado pela Academia Francesa por um de seus poemas.[7]

Em 1819 fundou, com os seus irmãos, a revista "Le Conservateur Littéraire", e, no mesmo ano, ganhou o concurso da Académie des Jeux Floraux, instituição literária francesa fundada no século XIV.[5]

Em 1821, Hugo publicou seu livro de poesias"Odes et poésies diverses" (Odes e Poesias Diversas), com o qual ganhou uma pensão, concedida por Luís XVIII. Um ano mais tarde publicaria seu primeiro romance"Han d'Islande" (Hans da Islândia).[6]

Casou-se com sua amiga de infância, Adèle Foucher, em 12 de outubro de 1822, o casamento gerou o desgosto de seu irmão, Eugène, que era apaixonado por Adèle. Em decorrência disso, Eugène enloquece e é internado em um hospício. No ano seguinte, a morte do primeiro filho e o fracasso literário do livro Hans da Islândia, que não agrada a crítica, interrompem o período de estabilidade vivido até então. Em 1824 nasce sua primeira filha, Leopoldine.[8]

Em 1825, aos 23 anos, recebe o título de Cavaleiro da Legião de Honra.[9] Nesta época, torna-se líder de um grupo de escritores criando o Cenáculo.[10]

A publicação da terceira coletânea de poemas de Victor Hugo, intitulada "Odes et Ballades", em 1826, marcou o início de um período de intensa criatividade.[11]

Em 1827, no prefácio de seu extenso drama histórico, Cromwell, Hugo expõe uma chamada à liberação das restrições que impunham as tradições do classicismo. O prefácio é considerado o manifesto do movimento romântico na literatura francesa,[7][8] nele o escritor fala da necessidade de romper com as amarras e restrições do formalismo clássico para poder então refletir a extensão plena da natureza humana.[11] Ainda neste prefácio, Hugo defende o drama moderno, com a coexistência do sublime e do grotesco.[12] O sucesso do prefácio de Cromwell consolidaram a imagem de Hugo como a principal liderança do romantismo na França. Aos 26 anos de idade, o escritor desfrutava de uma situação material confortável e prestígio não apenas entre a juventude rebelde francesa, mas também entre a corte de Carlos X.[13]

Neste período integrou-se ao romantismo transformando-se em um verdadeiro porta-voz desse movimento. A residência de Hugo tornou-se um ponto de encontro de escritores românticos entre os quais Alfred de Vigny e o crítico literário Charles Augustin Sainte-Beuve.[11]

censura recaiu sobre sua obra, Marion do Lorme, em 1829peça teatral apoiada na vida de uma cortesã francesa do século XVII, isso aconteceu porque a obra foi considerada muito liberal,[7] e também devido ao fato de os censores terem interpretado a peça como uma crítica a Carlos X, o que fez com que a produção daquela que seria sua primeira peça a ser interpretada fosse cancelada.

Em 1830 estreia Hernani, a sua primeira obra teatral, que representa o fim do classicismo e expressa novas aspirações da juventude.[11] A peça, que exalta o herói romântico em luta contra a sociedade,[12] divide opiniões, agradando os jovens e desagradando os mais velhos, o que desencadeia uma disputa de público que contribui para a consagração de Hugo como líder romântico.[8] A peça obteve grande sucesso, lotando o teatro em todas as suas exibições. A disputa entre opiniões gerada por Hernani obteve proporções além do teatro, apoiadores e opositores travavam brigas e discussões por toda a França.[14]

Após o nascimento de mais uma filha, também no ano de 1830, que recebeu o nome da mãe, sua esposa recusa-se a ter mais filhos e concede ao marido liberdade para transitar por Paris, desde que não a aborrecesse. Tal faz com que Hugo se entregue à libertinagem, ligando-se indistintamente a atrizes, aristocratas e humildes costureiras, mas não se separara de Adèle.[8] Neste mesmo período, Adèle inicia um relacionamento amoroso com o amigo da família, Saint-Beauve.[15]

1831 - 1885

Ilustração de Alfred Barbou, para Notre-Dame de Paris: o corcunda Quasimodo escala a catedral.
Acervo Digital Afro-Brasileiro https://www.flickr.com/photos/acervoafrobrasileiro/39745404522/in/dateposted-public/
Victor Hugo na capa da Revista Illustrada em 1885

Seu romance, Notre-Dame de Paris, é lançado em 1831, considerado o maior romance histórico de Victor Hugo, o livro definiu a forma de exploração ficcional do passado que marcaram o romantismo francês. O livro narra a história do amor altruísta do deformado sineiro da catedral de Notre DameQuasimodo, pela bailarina cigana Esmeralda. Com um estilo realista, especialmente nas descrições de Paris medieval e seu submundo, o enredo é melodramático, com muitas reviravoltas irônicas.[16] O livro foi um sucesso instantâneo e logo fez de Hugo o mais famoso escritor que vivia na Europa, tendo o livro se propagado e traduzido por todo o continente.[17]

No ano de 1832 Hugo mudou-se para um apartamento instalado na Praça de Vosges, no bairro Le Marais, onde morou até 1848, tendo sido visitado por escritores como Honoré de BalzacAlfred de MussetAlexandre Dumas e o compositor Franz Liszt.[18]

Em novembro de 1832 Victor Hugo apresentava em Paris Le Roi S’Amuse, uma peça baseada na vida amorosa do rei Francisco I da França. Desde 1827 até o ano da estreia de Le Roi S’Amuse, Hugo passara de uma postura inicialmente conservadora para um liberalismo reformista que se refletia em suas posições públicas e em sua obra. Le Roi S'Amuse também sofreria censura, acusada de expor a figura régia ao ridículo.[19]

Retrato de Juliette Drouet pintado por Charles-Émile-Callande de Champmartin.

No ano seguinte, Hugo passa a ter um relacionamento amoroso com a atriz Juliette Drouet, que atuou em duas peças do autor que estrearam naquele ano, Lucrécia Borgia e Marie Tudor. Eles se conheceram em um momento em que Hugo estava abalado, pois descobrira que sua esposa o havia traído. Juliette interpretava o papel da Princesa Negroni em Lucrécia Borgia, exatamente quinze dias após a estreia da peça, em 16 de fevereiro de 1833, Juliette se tornou amante de Hugo. Hugo instalou Juliette em uma casa isolada no Les Metz, um lugarejo próximo à casa onde ele morava com sua família. Quase todos os dias eles se encontravam, o ponto de encontro era uma árvore oca em um bosque, o tronco desta árvore Juliette usava para deixar suas mensagens para ele e Hugo deixava suas cartas e poemas lá. O romance tinha momentos turbulentos devido a problemas financeiros, pois Juliette contraiu muitas dívidas com credores, ainda assim, o amor se mostrou resistente às discussões e brigas.[20]

A peça Lucrécia Borgia, drama a que primeiro deu o título de Ceia em Ferrara teve grande êxito, o que foi considerado a vitória decisiva da escola romântica.[21]

Em fevereiro de 1837 morre seu irmão Eugène, acometido por uma doença psicológica desde o casamento de Hugo, Eugène não voltou mais à razão, a doença o foi enfraquecendo e por fim o levou à morte. Este também foi ano em que o rei Luís Filipe I conferiu à Victor Hugo o grau de oficial da Legião de Honra, e os duques de Orléans enviaram-lhe um quadro de Ignez de Castro, pintado por Saint-Évre, na extremidade superior da moldura havia a seguinte inscrição: "O duque e a duqueza de Orleans ao sr. Victor Hugo, 27 de junho 1837".[21]

Alugava apartamentos nos arredores de Paris com nomes falsos, onde encontrava-se com suas amantes. Numa dessas ocasiões foi flagrado com Léonie d’Aunet, cujo marido havia chamado a polícia, a mulher foi presa, quanto a Victor Hugo nada lhe aconteceu.[22]

Exílio em Jersey (1853-55)

Criado por sua mãe no espírito da monarquia, acaba por se convencer, pouco a pouco, do interesse da democracia ("Cresci", escreve num poema onde se justifica). A sua ideia é que "onde o conhecimento está apenas num homem, a monarquia se impõe." "Onde está num grupo de homens, deve fazer lugar à aristocracia. E quando todos têm acesso às luzes do saber, então vem o tempo da democracia".

Tendo se tornado favorável a uma democracia liberal e humanitária, é eleito deputado da Segunda República em 1848, e apoia a candidatura do príncipe Louis-Napoléon.

Túmulo de Victor Hugo no Panteão de Paris.

Exila-se após o golpe de Estado de 2 de Dezembro de 1851, que condena vigorosamente por razões morais em "Histoire d'un crime".

Durante o Segundo Império, em oposição a Napoléon III, vive em exílio em JerseyGuernsey e Bruxelas. É um dos únicos proscritos a recusar a anistia decidida algum tempo depois: « Et s'il n'en reste qu'un, je serai celui-là » ("e se sobra apenas um, serei eu").

Durante o seu exílio visita o Luxemburgo por curtos períodos de um ou dois dias nos anos de 1862, 1863 e 1865; em 1871 reside em Vianden por um período de dois meses e meio como refugiado político.[23]

Com a morte da sua filha, Leopoldina, começa a descobrir e investigar experiências espíritas relatadas numa obra diferente nomeada "Les tables tournantes de Jersey".

Morre em 22 de maio de 1885.

De acordo com seu último desejo, seu corpo é depositado em um caixão humilde que é enterrado no Panthéon.[24]

Tendo ficado vários dias exposto sob o Arco do Triunfo, estima-se que 1 milhão de pessoas vieram lhe prestar uma última homenagem. Quando morreu, as prostitutas de Paris ficaram de luto.[22] A pessoa mais velha da história, Jeanne Calment, que morreu em 1997, afirma ter ido ao funeral de Victor Hugo. Jeanne tinha 10 anos quando houve o funeral.

Vida literária

Victor Hugo em 1853

Como muitos escritores de sua geração, Victor Hugo foi profundamente influenciado por François-René de Chateaubriand, famosa figura da escola romântica e figura proeminente da literatura francesa do começo do século XIX. Quando jovem, Hugo afirmou que seria “Chateaubriand ou nada”, e sua vida teria muitas semelhanças com a de seu predecessor. Como Chateaubriand, Hugo daria força ao Romantismo, envolver-se-ia com política como defensor da causa republicana e seria forçado ao exílio devido à suas opções políticas. A eloquência e a paixão precoce das primeiras obras de Victor Hugo trouxeram-lhe sucesso e fama quando ainda jovem. Sua primeira coletânea de poesia (Odes et Poésies Diverses) foi publicada em 1822, quando Hugo tinha apenas vinte anos de idade, e lhe rendeu uma pensão real de Luís XVIII. Embora os poemas fossem admirados por seu ardor e sua fluência espontâneos, foi sua próxima coletânea (Odes et Ballades), publicada em 1826, que revelaram Hugo como grande poeta.

A primeira obra madura de ficção do autor francês apareceu em 1829, e refletia a aguda consciência social que permearia sua obra posterior. Le Dernier jour d'un condamné (O Último Dia de um Condenado à Morte) teria profunda influência sobre autores posteriores como Albert CamusCharles Dickens e Fiódor DostoiévskiClaude Gueux (1834), uma estória documental sobre a execução de um assassino francês, foi considerada mais tarde pelo próprio autor como precursora de sua maior obra sobre a injustiça social (Os Miseráveis). Seu primeiro romance a ser enormemente reconhecido foi ''O Corcunda de Notre-Dame'', publicado em 1831 e logo traduzido para diversos idiomas através da Europa. Um dos efeitos dessa obra foi levar a cidade de Paris a restaurar a bastante negligenciada Catedral de Notre-Dame, a qual estava atraindo milhares de turistas que haviam lido a novela. O livro também renovou o apreço por construções pré-renascentistas, as quais passaram a ser mais cuidadosamente preservadas.

Victor Hugo começou a planejar um grande romance sobre miséria e injustiça social no começo da década de 30, mas a obra só seria publicada em 1862. O escritor estava consciente da qualidade do livro. A editora belga Lacroix and Verboeckhoven realizou uma campanha de publicidade incomum para a época, emitindo notas à imprensa sobre o trabalho até seis meses antes do lançamento. Ademais, publicou inicialmente apenas a primeira parte da novela (Fantine), lançada simultaneamente em grandes cidades. Estoques inteiros do livro foram vendidos em dias, e a obra teve grande impacto sobre a sociedade francesa. A crítica francesa foi, em geral, hostil ao romance. Barbey d’Aurevikky reclamou da vulgaridade da obra; Flaubert achou que o livro não era “nem verdadeiro nem genial”; Baudelaire – apesar de críticas positivas em jornais – chamou a obra de “sem graça e inepta”. Os Miseráveis, no entanto, mostraram-se populares junto às massas, e logo os temas abordados estavam em destaque na Assembleia Nacional da França. Hoje a novela permanece como sua obra mais popular, tendo sido adaptada para o cinema, a televisão, o teatro e para musicais.

Imagem de "Cosette", por Émile Bayard, da edição original de Les Misérables (1862)

Victor Hugo afastou-se de temas políticos e sociais em seu próximo romance, Les Travailleurs de la Mer (Os Trabalhadores do Mar), publicado em 1866. Ainda assim, o livro foi bem recebido, talvez devido ao sucesso prévio de Os Miseráveis. Dedicado à ilha de Guernsey, localizada no Canal da Mancha e na qual o escritor passou 15 anos de exílio. A descrição de Hugo da batalha do homem contra o mar e as criaturas que nele habitam tornou conhecido um prato incomum em Paris: Lulas. A palavra utilizada em Guernsey para se referir ao animal (pieuvre) foi incorporada ao léxico francês. Em sua próxima obra, Hugo retornou aos temas políticos sociais. L'Homme Qui Rit (O homem que ri) foi publicado em 1869 e fazia um retrato crítico da aristocracia. Contudo, o livro não foi bem recebida como seus trabalhos anteriores, e o próprio escritor passou a comentar sobre a crescente distância entre sua obra e a de seus contemporâneos, como Flaubert e Émile Zola, cujas novelas realistas e naturalistas ganhavam popularidade. Seu último romance, Quatre-vingt-treize (Noventa e três), publicado em 1874, abordava um tema até então evitado por Victor Hugo: o reinado do terror, durante a Revolução Francesa. Embora a popularidade do escritor francês estivesse em declínio quando de sua publicação, muitos consideram hoje Quatre-vingt-treize uma obra à altura das mais famosas de Victor Hugo.

Pensamento político

Caricatura de Victor Hugo no ponto máximo de sua carreira política, por Honoré Daumier, (1849)

A partir de 1849, Victor Hugo dedica um quarto da sua obra à política, um quarto à religião e outro à Filosofia humana e social.

Sempre um reformista, envolve-se em política por toda a sua vida. Mas se critica as misérias sociais, não adota o discurso socialista da luta de classes. Pelo contrário, ele próprio viveu uma vida financeiramente confortável, construída com seus próprios esforços, tornando-se um dos escritores mais bem remunerados de sua época. Acreditava no direito do homem usufruir dos frutos do seu trabalho, embora reforçasse a responsabilidade que acompanha o enriquecimento pessoal. Desse modo, sempre buscou prosperar enquanto doava uma parte significativa de sua renda para diferentes obras de caridades.

Seu principal romance, os Miseráveis, narra a história de um self made-man, Jean Valjean, um sujeito que foge da prisão e reconstrói sua vida através do trabalho. Valjean monta uma empresa e, através dela, traz prosperidade para a sua região; além disso, usa sua fortuna em obras de caridade para ajudar os pobres. Suas boas obras são interrompidas apenas quando um policial - um agente do Estado - decide interferir arbitrariamente nas atividades privadas da sociedade civil.

Os Miseráveis, portanto, traz claramente a filosofia política de Victor Hugo. É um mundo onde há cooperação - e não luta - entre as classes; onde o empreendedor desempenha uma função essencialmente benéfica para todos; onde o trabalho é a via principal de aprimoramento pessoal e social; onde a intervenção estatal por motivos moralistas - seja do policial ou do revolucionário obcecado pela justiça terrena - é um dos principais riscos para o bem de todos que será gerado espontaneamente pelos indivíduos privados.

Ele também se opõe à violência quando ela se aplicou contra um poder democrático, mas a justifica (conforme à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão), contra um poder ilegítimo. É assim que, em 1851, lança um chamado à luta - "carregar seu fuzil e ficar preparado" - que não é seguido. Mantém esta posição até 1870, quando começa a Guerra Franco-Prussiana; Hugo a condena: "guerra de capricho" e não de liberdade.

Em seguida, o império é deposto e a guerra continua, desta vez contra a república. O argumento de Hugo em favor da fraternização resta, ainda, sem resposta. É assim que, em 17 de Setembro, publica uma chamada ao levante das massa e à resistência. Os republicanos moderados ficam horrorizados: preferem Bismarck aos "socialistas"! A população de Paris, no entanto, se mobiliza e lê avidamente Les Châtiments. (Ver Comuna de Paris).

Escultura de Victor Hugo, por Rodin.

Coerente, Hugo não podia ser comunista: "O significado da Comuna é imenso, ela poderia fazer grandes coisas, mas na verdade faz somente pequenas coisas. E pequenas coisas que são odiosas, é lamentável. Compreendam-me: sou um homem de revolução. Aceito, assim, as grandes necessidades, mas somente sob uma condição: que sejam a confirmação dos princípios e não o seu desrespeito. Todo o meu pensamento oscila entre dois pólos: civilização-revolução "." A construção de uma sociedade igualitária só será possível se for consequência de uma recomposição da sociedade liberal."

No entanto, diante da repressão que se abate sobre os comunistas, o poeta declara seu desgosto: "Alguns bandidos mataram 64 reféns. Replica-se matando 6 000 prisioneiros!".

Denunciando até o fim a segregação social, Hugo declara durante a última reunião pública que preside: "A questão social perdura. Ela é terrível, mas é simples: é a questão dos que têm e dos que não têm!". Tratava-se precisamente de recolher fundos para permitir a 126 delegados operários a viagem ao primeiro Congresso socialista da França, em Marselha.

Victor Hugo, no entanto, nunca aceitou o discurso socialista. Ele acreditava que uma sociedade aberta encontraria soluções para seus problemas. Mais que isso, ele era contra políticas de redistribuição de riquezas, pois o efeito dessas seria desincentivar a produção, fazendo com que toda a sociedade caminhasse para trás. Caso fosse permitida a liberdade de comércio, por outro lado, e caso se tolerasse algum grau de desigualdade social, o resultado seria o progresso geral de todos, beneficiando inclusive os membros mais pobres da sociedade.

"O comunismo e o agrarianismo acreditam que resolveram este segundo problema [da distribuição de renda], mas estão enganados: a distribuição destrói a produtividade. A repartição em partes iguais mata a ambição e, por consequência, o trabalho. É uma distribuição de açougueiros, que mata aquilo que reparte. Portanto, é impossível tomar essas pretensas soluções como princípio. Destruir riqueza não é distribuí-la".

Victor Hugo pronunciou durante a sua carreira política quatro grandes discursos: um sobre a defesa do litoral; um sobre a condição feminina; um sobre o ensino religioso; e uma argumentando contra a pena de morte.

Pensamento religioso

Durante seu exílio na ilha Jersey entre 1851 e 1855, Victor Hugo participou de inúmeras sessões espíritas observando as então emergentes mesas girantes, vindo a acreditar que por tal meio conseguiu entrar em contato com diversos espíritos - entre eles o de sua falecida filha Leopoldina - e que obteve confirmação de muitas de suas antigas ideias filosóficas e religiosas, chegando a escrever: "Os seres que povoam o Invisível, e que veem os nossos pensamentos, sabem que há vinte cinco anos me ocupo dos assuntos que a mesa suscita e aprofunda". Diante de experiências como essas Victor Hugo se tornou espírita e em 1867 clamou que a ciência deveria dar atenção e seriedade para os fenômenos das mesas: "A mesa girante ou falante foi bastante ridicularizada. Falemos claro. Esta zombaria é injustificável. Substituir o exame pelo menosprezo é cômodo, mas pouco científico. Acreditamos que o dever elementar da Ciência é verificar todos os fenômenos, pois a Ciência, se os ignora, não tem o direito de rir deles. Um sábio que ri do possível está bem perto de ser um idiota. Sejamos reverentes diante do possível, cujo limite ninguém conhece, fiquemos atentos e sérios na presença do extra-humano, de onde viemos e para onde caminhamos".[1][2][3][4][25]

Em muitas de suas obras, tanto em prosa como em poesia, o escritor manifestou sua forte crença na vida após a morte, como por exemplo no poema À Villequier de 1854:[2]

No final de seu testamento, o escritor escreveu: "Deixo cinquenta mil francos aos pobres. Desejo ser levado para o cemitério na sua carreta. Recuso a oração de qualquer igreja; peço uma oração a todas as almas. Creio em Deus. Victor Hugo".[26]

astrônomo e pesquisador psíquico francês Camille Flammarion escreveu em 1889: "Victor Hugo, alguns anos antes de sua morte, por várias vezes conversou pessoalmente comigo em Paris; ele jamais deixara de acreditar nas manifestações de Espíritos. E esta inquebrantável crença, cujas raízes remontavam às experiências de Jersey, no convívio diuturno com as “mesas falantes” foi, para o gigante da literatura do século XIX, um incentivo para a vida, para o trabalho e para o amor a seus semelhantes".[2][27][28]

No final de 2012, o museu Maison de Victor Hugo, que antes foi a casa do escritor, em Paris, abriu uma exposição sobre a influência do Espiritismo em Victor Hugo e na produção artística em geral: "Entrée des médiums, Spiritisme et Art, de Hugo à Breton". O título "Entrada dos médiuns" vem de um texto do francês André Breton, líder do surrealismo, movimento artístico que teve grande interesse pela mediunidade, principalmente pela psicopictografia.[29]

Bibliografia

Retrato de "Cosette" por Emile Bayard, da edição original de Les Misérables (1862)
Retrato de "Cosette" por Emile Bayard, da edição original de Les Misérables (1862)
Desenho de Victor Hugo: Le Rocher de l'Ermitage dans un paysage imaginaire, 1855
Desenho de Victor Hugo: Polvo com as Iniciais V.H., 1866
Desenho de Victor Hugo, Por de sol (1853-1855)
  • Odes et Poésies Diverses (1822)
  • Han d'Islande (1823)
  • Nouvelles Odes (1824)
  • Bug-Jargal (1826)
  • Odes et Ballades (1826)
  • Cromwell (1827)
  • Les Orientales (1829)
  • O Último Dia de um Condenado à Morte - no original Le Dernier jour d'un condamné (1829)
  • Hernani (1830)
  • Notre-Dame de Paris Nossa Senhora de Paris (1831)
  • Marion Delorme (1831)
  • Les Feuilles d'automne
  • Le Roi s'amuse (1832)
  • Lucrèce Borgia (1833)
  • Marie Tudor (1833)
  • Étude sur Mirabeau (1834)
  • Littérature et philosophie mêlées (1834)
  • Claude Gueux (1834)
  • Angelo (1835)
  • Les Chants du crépuscule (1835)
  • Les Voix intérieures (1837)
  • Ruy Blas (1838)
  • Les Rayons et les ombres (1840)
  • Le Rhin (1842)
  • Les Burgraves (1843)
  • Napoléon le Petit (1852)
  • Les Châtiments (1853)
  • Lettres à Louis Bonaparte (1855)
  • Les Contemplations (1856)
  • La Légende des siècles (1859)
  • Les Misérables (1862)
  • William Shakespeare (1864)
  • Les Chansons des rues et des bois (1865)
  • Les Travailleurs de la Mer (1866)
  • Paris-Guide (1867)
  • L'Homme qui rit (1869)
  • L'Année terrible (1872)
  • Quatrevingt-treize (1874)
  • Mes Fils (1874)
  • Actes et paroles - Avant l'exil (1875)
  • Actes et paroles - Pendant l'exil (1875)
  • Actes et paroles - Depuis l'exil (1876)
  • La Légende des Siècles 2e série (1877)
  • L'Art d'être grand-père (1877)
  • Histoire d'un crime - 1re partie (1877)
  • Histoire d'un crime - 2e partie (1878)
  • Le Pape (1878)
  • Vie ou de Mort (1875)
  • Religions et religion (1880)
  • L'Âne (1880)
  • Les Quatre vents de l'esprit (1881)
  • Torquemada (1882)
  • La Légende des siècles - Tome III (1883)
  • L'Archipel de la Manche (1883)

Obras póstumas

  • Théâtre en liberté (1886)
  • La fin de Satan (1886)
  • Choses vues - 1re série (1887)
  • Toute la lyre (1888)
  • Alpes et Pyrénées (1890]])
  • Dieu (1891)
  • France et Belgique (1892)
  • Toute la lyre - nouvelle série (1893)
  • Correspondances - Tome I (1896)
  • Correspondances - Tome II (1898)
  • Les années funestes (1898)
  • Choses vues - 2e série (1900)
  • Post-scriptum de ma vie (1901)
  • Dernière Gerbe (1902)
  • Mille francs de récompense (1934)
  • Océan. Tas de pierres (1942)
  • Pierres (1951)

Referências

  1. ↑ Ir para:a b Pierre Assouline. Même le guéridon de Victor Hugo vote Mélenchon. Le Monde (online); 05/04/2012. Página visitada em 01/07/2014.
  2. ↑ Ir para:a b c d Maria do Carmo M. Schneider. Victor Hugo: a face oculta de um gênio. Anais do XIII Congresso da Associação Brasileira de Literatura Comparada. Página visitada em 01/07/2014.
  3. ↑ Ir para:a b Abib, D.. CULTURA ESPÍRITA NO BRASIL/ SPIRITIST CULTURE IN BRASIL. Brazilian Cultural Studies, América do Norte, 224 07 2013. p. 113.
  4. ↑ Ir para:a b MALGRAS, J. Les Pionniers du Spiritisme en France: Documents pour la formation d'un livre d'Or des Sciences Psychiques. Paris: (s.n.), 1906.
  5. ↑ Ir para:a b «Victor Hugo»educacao.uol.com.br. Consultado em 25 de fevereiro de 2021
  6. ↑ Ir para:a b ASSÍRIO & ALVIM (2007). Victor Hugo. Sítio Editora Assírio & Alvim <http://www.assirio.com/autor.php?id=1411&i=U[ligação inativa]>. Acessado em 09 de maio de 2010.
  7. ↑ Ir para:a b c «Victor Marie Hugo - Biografia»www.nossosaopaulo.com.br. Consultado em 25 de fevereiro de 2021
  8. ↑ Ir para:a b c d SOCIEDADE DIGITAL (2008). Biografia Victor Hugo. Sítio Sociedade Digital <http://www.sociedadedigital.com.br/artigo.php?artigo=218&item=3 Arquivado em 28 de novembro de 2010, no Wayback Machine.>. Acessado em 09 de maio de 2010.
  9.  COSAC NAIFY (2009). Os Miseráveis - Edição definitiva. Sítio Editora Cosac Naify <http://editora.cosacnaify.com.br/SalaImprensaInterna/60/OS-MISER%C3%81VEIS---EDI%C3%87%C3%83O-DEFINITIVA.aspx Arquivado em 6 de julho de 2011, no Wayback Machine.>. Acessado em 09 de maio de 2010.
  10.  GASPAR, Luís (1997). Victor Hugo Biografia. Sítio Truca <http://www.truca.pt/ouro/biografias1/victor_hugo.html>. Acessado em 09 de maio de 2010.
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  12. ↑ Ir para:a b «POETAS MORTOS (2006). "Victor Hugo - 200 anos de nascimento»e.indice.uol.com.br. Consultado em 25 de fevereiro de 2021
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  16.  DISCOVER FRANCE (2010). Notre-Dame Cathedral, Paris. Sítio Discover France <http://www.discoverfrance.net/France/Cathedrals/Paris/Notre-Dame.shtml>. Acessado em 16 de maio de 2010. (em inglês)
  17.  HUGO-ON LINE (2008). The Hunchback of Notre Dame, 1831. Sítio Hugo On Line <http://www.hugo-online.org/Novels/hunchback_notre_dame.html. Acessado em 16 de maio de 2010. (em inglês)
  18.  LOUREIRO, Monique (2002). França celebra 200 anos de nascimento de Victor Hugo. Sítio BBC Brasil <http://www.bbc.co.uk/portuguese/cultura/020226_victorhugobg.shtml[ligação inativa]>. Acessado em 29 de maio de 2010.
  19.  LEAL, André C. et all. (2008). Giuseppe Verdi - Rigoletto. Sítio TV1 <http://tv1.rtp.pt/antena2/index.php?article=701[ligação inativa]>. Acessado em 29 de maio de 2010.
  20.  THE RESOURCE ZONE (2005). Juliette Drouet. Sítio The Resource Zone <http://www.theresourcezone.org.gg/Juliette%20Drouet.htm[ligação inativa]>. Acessado em 03 de junho de 2010. (em inglês)
  21. ↑ Ir para:a b CASTRO IRMÃO E CIA. (1867). Archivo Pittoresco (10ª edição). Lisboa: Typographia de Castro Irmão. Versão Digital Disponível em: <http://books.google.com.br/books?id=p2w-AAAAYAAJ&printsec=frontcover&source=gbs_slider_thumb#v=onepage&q&f=false>
  22. ↑ Ir para:a b Guia dos Curiosos[ligação inativa]
  23.  victor-hugo.lu
  24.  Victor Hugo (em inglês) no Find a Grave
  25.  SOUTO MAIOR, Marcel. Kardec - A Biografia (1ª edição). São Paulo: Ed. Record, 2013.
  26.  Jacques Lantier, Le spiritisme, Grasset, 1971, chapitre : la mort de Victor Hugo ou bien La Revue Spirite, 1885, numéro 11
  27.  Banque des savoirs. Histoire des sciences - Camille Flammarion : la passion des étoiles à la portée de tous. Página visitada em 07/12/2014.
  28.  FLAMMARION, Camille. Les expériences de Victor Hugo à Jersey et du groupe fourièriste à Paris. Les Analles Politiques et Littéraires, mai./1899
  29.  Alcino Leite Neto. Contatos do escritor Victor Hugo com espíritos são tema de exposição em Paris. Folha de S. Paulo - 28/12/2012. Página visitada em 09/12/2014.

Ligações externas

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SÃO NESTÓRIO - 26 DE FEVEREIRO DE 2022

 

Nestório

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Nestório
Nascimento381
Kahramanmaraş
Morte451 (69–70 anos)
Alto Egito
SepultamentoOásis de Carga
CidadaniaImpério Bizantino
Ocupaçãosacerdoteescritor,
ReligiãoNestorianismo

Nestório (em gregoΝεστόριοςc. 386 – ca. 451) foi um monge, oriundo da Anatólia, que se tornou arcebispo de Constantinopla entre 10 de abril de 428 e 22 de junho de 431.

Baseando-se nos ensinamentos da Escola de Antioquia, seus ensinamentos, que incluíam uma rejeição ao já tradicional uso do título de Teótoco ("Mãe de Deus") para a Virgem Maria, o colocaram em conflito com outros importantes membros do clero de sua época, notavelmente Cirilo de Alexandria, que o acusou de heresia. Nestório procurou se defender no Primeiro Concílio de Éfeso (431), mas só conseguiu ser formalmente condenado como herege e derrubado de sua sé episcopal. Depois disso, ele se retirou para um mosteiro, onde ele defendeu a ortodoxia pelo resto da vida. Apesar desta concessão, muitos dos que o apoiaram decidiram deixar a igreja, no que ficou conhecido como cisma nestoriano, e, nas décadas seguintes, se mudaram para a Pérsia. O nestorianismo se tornou então a posição oficial da Igreja Assíria do Oriente, que reconhece apenas os dois primeiros concílios ecumênicos (Primeiro Concílio de Niceia e o Primeiro Concílio de Constantinopla).

Acreditava que em Cristo há duas pessoas (ou naturezas) distintas, uma humana e outra divina, completas de tal forma que constituem dois entes independentes. A sua crença tornou-se a base do nestorianismo.

Foi ainda um escritor fecundo, mas quase todos os seus sermões foram queimados por ordem do imperador Teodósio II. Os escritos que restaram estão em siríaco.

Biografia

Nestório nasceu em 386 d.C. na Germanícia, na província romana da Síria (atual Kahramanmaraş, na Turquia).[1] Ele recebeu seu treinamento sacerdotal como pupilo de Teodoro de Mopsuéstia em Antioquia e ganhou uma grande reputação por seus sermões. Esta fama o levou ao trono patriarcal por ordem do imperador bizantino Teodósio II após a morte de Sisínio I em 428 d.C.

Nestorianismo e Concílio de Éfeso

Ver artigos principais: Nestorianismo e Primeiro Concílio de Éfeso

Logo após a sua chegada à capital imperial, Nestório se envolveu na disputa entre duas facções teológicas que divergiam em suas concepções cristológicas. Nestório tentou encontrar um meio termo entre os que enfatizavam o fato de que Deus Filho teria nascido como um homem, insistindo em chamar a Virgem Maria de Teótoco (em gregoΘεοτόκος - "Mãe de Deus"), e os que rejeitavam o título porque Deus, como um ser eterno, não poderia ter "nascido". Nestório sugeriu o título de Christotokos (Χριστοτόκος - "Mãe de Cristo"), mas não conseguiu apoio de nenhum dos lados da controvérsia.

Nestório acreditava que nenhuma união entre o humano e o divino era possível. Se uma união assim ocorresse, ele acreditava que Cristo não poderia ser verdadeiramente consubstancial com Deus e consubstancial conosco, porque ele iria crescer, amadurecer, sofrer e morrer (algo que, segundo ele, Deus não poderia fazer) e iria também possuir o poder de Deus, o que faria dele algo distinto dos humanos.

Eusébio de Dorileia foi o primeiro a acusar Nestório de heresia, mas seu mais obstinado adversário foi o patriarca de Alexandria Cirilo. Ele pediu ajuda ao papa Celestino I de Roma, exigindo uma decisão sobre Nestório, ao que o papa respondeu delegando ao próprio Cirilo a tarefa de excomungar Nestório se ele não mudasse suas opiniões em dez dias. Os oponentes de Nestório o acusaram de desacoplar a divindade de Cristo de sua humanidade, em duas pessoas existindo num único corpo, negando assim a realidade da encarnação de Jesus e destruindo a chamada união hipostática. Esta heresia se tornou conhecida como nestorianismo.

O imperador Teodósio II (r. 402–450) foi eventualmente induzido a convocar um concílio ecumênico em Éfeso, um lugar de especial importância na devoção à Virgem Maria e onde o termo Teótoco era muito popular. O imperador apoiou o arcebispo de Constantinopla, enquanto que o papa Celestino se juntou ao lado de Cirilo, que tomou conta do concílio, abrindo as discussões sem esperar a chegada da já muito atrasada comitiva de bispos orientais de Antioquia. Cirilo escreveu que "Surpreende-me que há alguns que duvidam que a Virgem Santa deve ser chamada ou não de Teótoco. Pois, se Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus, e a Virgem Santa deu-o à luz, ela não se tornou a [Teótoco]?".[2] O concílio então depôs Nestório e o declarou herético.

Nas palavras de Nestório:

Quando os seguidores de Cirilo viram a veemência do imperador...eles provocaram um distúrbio e discordaram em meio ao público com gritos, como se o imperador estivesse se opondo a Deus. Eles se rebelaram contra os nobres e os chefes que não concordaram com eles e corriam de um lado para o outro. E...receberam entre eles os que já tinham sido separados e removidos dos mosteiros, por conta de suas vidas e seus modos estranhos, e sido expulsos, e todos os que eram de seitas heréticas e estavam possuídos por um fanatismo e ódio contra mim. E uma paixão estava em todos eles, judeuspagãos e todas as seitas. E eles estavam trabalhando para que aceitassem sem exame prévio, as coisas que foram feitas também sem exame contra mim; e, ao mesmo tempo, todos eles, mesmo os que tinham participado comigo das refeições e em oração e em pensamento, concordaram...contra mim e juraram juramentos uns aos outros contra mim...Em nada eles estavam divididos.
 
— Nestório.

Contudo, conforme o concílio progredia, João I de Antioquia e os bispos orientais chegaram e ficaram furiosos ao saber que Nestório já havia sido condenado. Eles se reuniram num sínodo próprio e depuseram Cirilo. Ambos os lados apelaram ao imperador e ele inicialmente ordenou que ambos fosse exilados. Porém, Cirilo acabou por retornar após subornar vários membros da corte imperial.[3]

Nos meses seguintes, dezessete bispos que apoiavam Nestório foram removidos de suas sés. Eventualmente, João I de Antioquia foi obrigado a abandonar Nestório em março de 433. Em agosto de 435, Teodósio II proclamou um édito imperial que exilou Nestório para um mosteiro no Grande Oásis de Hibis (atual al-Khargah), no Egito, incrustado na diocese de Cirilo.

Comunidade nestoriana

Ver artigo principal: Igreja Assíria do Oriente

Como consequência do Primeiro Concílio de Éfeso, os nestorianos foram desterrados para o oriente pelo imperador bizantino Teodósio II, instalando-se primeiro em Edessa e Nísibis. Estas cidades constituíam os principais centros culturais da Síria cristã, onde se desenvolveu intensa atividade missionária.

Em 489, os nestorianos foram expulsos do Império Bizantino. Saindo de Edessa, foram recebidos pelos monarcas Sassânidas na Pérsia, cuja religião oficial era o zoroastrismo. Entre eles encontravam-se muitos médicos e outros homens da ciência, que levaram consigo inúmeras obras científicas em grego. Concentraram-se em Gundishapur, onde, desde o século III, existia um centro de estudos. Mais tarde juntaram-se a estes, os sábios da Escola de Atenas, fechada por Justiniano I. Iniciou-se um movimento de tradução das obras científicas gregas, primeiro para o siríaco e mais tarde para o árabe.

Ver também

Nestório de Constantinopla
(deposto)

(428 - 431)
Precedido por:Cruz ortodoxa.png

Patriarcas ecumênicos de Constantinopla

Sucedido por:
Sisínio I41.ºMaximiano

Referências

  1.  Nestorius – Britannica Online Encyclopedia
  2.  Epístola 1, aos monges do Egito, Patrologia Graeca 77:13 B
  3.  John I., McEnerney (1998). St. Cyril of Alexandria Letters 51-110. Col: Fathers of the Church Series. 77. [S.l.]: Catholic University of America Press. pp. 151,204. ISBN 9780813215143

Bibliografia

  • Dias, José Pedro Sousa, A Farmácia e a História - Uma introdução à história da Farmácia, da farmacologia e da Terapêutica, Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, 2005.


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