Policarpo de Esmirna
São Policarpo de Esmirna | |
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Vitral de São Policarpo na Église Saint-Pothin, em Lyon, França. | |
Bispo de Esmirna; Mártir; Padre Apostólico | |
Nascimento | ca. 69 |
Morte | Esmirna ca. 155 (86 anos) |
Veneração por | Toda a Cristandade |
Festa litúrgica | 23 de fevereiro (antigamente, 26 de janeiro) |
Atribuições | Vestindo um pálio, segurando um livro representando a Carta aos Filipenses |
Padroeiro | Contra dor de ouvido e disenteria |
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Policarpo de Esmirna (/pɒlikɑːrp/; grego: Πολύκαρπος, Polýkarpos; Latim: Polycarpus; n. 69 - m. 155) foi um bispo da igreja de Esmirna do século II.[1] De acordo com a obra "Martírio de Policarpo", ele foi apunhalado quando estava amarrado numa estaca para ser queimado-vivo e as chamas milagrosamente não o tocavam.[2] Ele é considerado por isso um mártir e um santo por diversas denominações cristãs.
Policarpo havia sido discípulo do apóstolo João, fato atestado pelo Bispo Ireneu de Lyon,[3] que ouviu-o discursar quando jovem, e por Tertuliano.[4]
A tradição primitiva que foi expandida pelo "Martírio...", ligando Policarpo em contraste com o apóstolo João que, apesar de muitas tentativas de assassinato, não foi martirizado e teria morrido de velhice após ser exilado para a ilha de Patmos, se baseia nos chamados "Fragmentos de Harris", papiros fragmentários em copta datados entre os séculos III e VI.[5] Frederick Weidmann, o editor dos fragmentos, interpreta-os como sendo parte de uma hagiografia esmirniota num contexto de rivalidade entre as igrejas de Esmirna e Éfeso, que "desenvolve a associação de Policarpo a João num nível desconhecido - até onde sabemos - até a época ou depois.".[6] Os fragmentos contudo ecoam o "Martírio..." e também divergem dele.
Com o Papa Clemente de Roma e Bispo Inácio de Antioquia, Policarpo é considerado um dos três principais Padres Apostólicos. A única obra sobrevivente atribuída a ele é a Epístola de Policarpo aos Filipenses, relatada pela primeira vez por Ireneu.
Vida
Há duas fontes principais para informações sobre a vida de Policarpo: o "Martírio de Policarpo", uma carta aos esmirniotas recontando seu martírio, e as passagens na Adversus Haereses de Ireneu de Lyon. Outras fontes são as Epístolas de Inácio, entre elas uma para Policarpo e outra para os esmirniotas, e a própria epístola aos filipenses. A chamada "Vida de Policarpo", os trechos em Tertuliano, Eusébio de Cesareia e em Jerônimo são consideradas não históricas (primeiro caso) ou baseadas em material prévio (demais). Em 1999, alguns fragmentos coptas dos séculos III a VI sobre Policarpo foram publicados sob o nome de "Fragmentos de Harris".[7]
Pápias
De acordo com Ireneu, Policarpo era companheiro de Papias de Hierápolis,[8] outro que "ouviu João", nas palavras de Ireneu ao interpretar o testemunho de Pápias, e um correspondente de Inácio de Antioquia. Este endereçou-lhe uma carta e o menciona em suas próprias correspondências com os efésios e com os magnésios.
Ireneu considerava a memória de Policarpo como sendo uma ligação direta com o passado apostólico. Ele relata quando e como ele se tornara cristão e, em sua epístola a Florinus, afirmou ter visto e ouvido Policarpo pessoalmente na Ásia Menor. Ele relata, principalmente, ter ouvido o relato da discussão de Policarpo com "João, o Presbítero" e com outros que haviam visto Jesus. Ireneu também reporta que Policarpo se convertera pelas mãos dos apóstolos e por eles foi consagrado bispo (segundo Jerônimo, por João[9]). Diversas vezes ele enfatiza a idade avançada de Policarpo.
Visita a Aniceto
De acordo com Ireneu, durante o papado de seu conterrâneo sírio, Aniceto, nas décadas de 150 ou 160, Policarpo visitou Roma para discutir as diferenças que existiam entre as práticas asiáticas e romanas "com relação a certas coisas" e especialmente sobre a data da Páscoa. Ireneu afirma que sobre "certas coisas" os dois bispos rapidamente chegaram num acordo, enquanto que sobre a Páscoa, cada um continuou aderindo às suas próprias tradições, sem contudo quebrar com a comunhão entre as igrejas. Policarpo seguia a prática oriental de celebrar a Páscoa no 14 de Nisan, o dia da Pessach judaica, sem se preocupar em qual dia da semana ele caía, enquanto que em Roma a Páscoa era celebrada sempre aos domingos (vide quartodecimanismo). Aniceto - as fontes romanas concedem este ponto como sendo uma honraria especial - permitiu que Policarpo celebrasse a Eucaristia em sua própria igreja.[1]
Ainda estando em Roma, Policarpo conheceu alguns hereges gnósticos valentianos (inclusive Valentim), e encontrou-se com Marcião, a quem Policarpo chamava de "primogênito de Satanás".[9]
Martírio
O "Martírio..." relata que Policarpo, no dia de sua morte, disse "Por oitenta e seis anos, eu O servi", o que poderia indicar que ele teria então esta idade[10] ou que ele teria vivido este tempo após ter se convertido.[2] Ele prossegue dizendo "Como então posso ter blasfemado contra meu Rei e Salvador? Prossigais com tua vontade." Policarpo foi então queimado vivo[9] na estaca por se recusar a acender incenso para o imperador romano.[11] A data da morte é disputada. Eusébio a coloca no reinado de Marco Aurélio (c. 166 - 167), porém, uma adição pós-Eusébio ao "Martírio" coloca a morte num sábado, 23 de fevereiro, durante o proconsulado de Statius Quadratus (ca. 155-156). Estas datas mais antigas casam melhor com a tradição de sua associação com Inácio de Antioquia e com o apóstolo João. Lightfoot defendia a data mais antiga enquanto que Killen discordava ferozmente.
Grande Sabbath
O "Martírio de Policarpo", que é uma carta aos esmirniotas, afirma que Policarpo foi preso "no dia do Sabbath" e morto no dia do "Grande Sabbath", alguns acreditam que isto seria uma evidência de que os fiéis de Esmirna sob Policarpo observavam a guarda do Sabbath de sete dias. Por outro lado, isto é vigorosamente desmentido por testemunhos anteriores, como Inácio de Antioquia, bispo e mártir anterior a Policarpo, o qual condenava com veemência a observação de quaisquer costumes judaizantes, tais como a observância de luas e sábados:
“Aqueles que viviam segundo a ordem antiga das coisas voltaram-se para a nova esperança, não mais observando o Sábado, mas sim o dia do Senhor, no qual a nossa vida foi abençoada, por Ele e por sua morte” (Carta aos Magnésios. 9,1).
William Cave escreveu "...o Sabbath ou 'Sábado' (pois a palavra 'sabbatum é constantemente utilizada nas obras dos padres da Igreja quando citam o Sabbath em sua forma cristã) era guardado por eles em grande estima e, especialmente no oriente, honrado com todas as solenidades religiosas públicas.".[12]. Como já explanado, tal interpretação não procede. De fato, outro testemunho fidedigno e antigo encontra-se na Epístola do Pseudo-Barnabé, (cerca de 74 d.C.) um dos documentos mais antigos da Igreja, anterior ao Apocalipse, o qual diz, sem titubeios:
“Guardamos o oitavo dia (o domingo) com alegria, o dia em que Jesus levantou-se dos mortos” (Barnabé 15:6-8).
Outros consideram que a expressão "Grande Sabbath" faz referência à Pessach ou a outro feriado anual Se for este o caso, então o martírio deve ter ocorrido entre um ou dois meses após pois a data de 23 de fevereiro, pois o 14 de Nisan (a data que Policarpo considerava como sendo a Páscoa) não pode ocorrer antes do final de março (por sua dependência do equinócio vernal). Outros feriados chamados de "Grande Sabbath" (se a frase de fato faz referência ao que normalmente se considera como sendo um feriado judaico, que eram observados por muitos dos primeiros cristãos) ocorrem na primavera, no final do verão ou no outono. Nunca no inverno (todas as estações se referem ao hemisfério norte).
Entretanto, tal interpretação encontra-se sujeita a fortes questionamentos, pois é sabido que os cristãos já tinham rompido com o Judaísmo desde, pelo menos, por volta de 90 d.C., com o Concílio de Jâmnia, no qual os judeus expulsaram os últimos seguidores de Cristo de origem judaica das sinagogas, tomando-os como hereges. Assim, é muito pouco provável que os cristãos observassem quaisquer costumes judaicos, à exceção daqueles na Ásia Menor, os quais somente guardaram a Páscoa como sendo em 14 de nisã, por consideração e costume oriundo do Apóstolo João. De qualquer forma, já no fim do século II d.C. e início do século III d.C., todos os cristãos observavam a data da Páscoa como sendo o domingo correspondente à primeira lua cheia da Primavera no Hemisfério Norte, não mais em 14 de nisã.
O "Grande Sabbath" pode ter sido aludido em João 7:37 ("No último, no grande dia da festa..."), que seria um feriado anual que se seguia imediatamente à Festa dos Tabernáculos. É duvidoso, porém, se esta referência bíblica alude a uma prática comum ou a um evento específico.
Obras
A única obra sobrevivente atribuída a Policarpo é a Epístola de Policarpo aos Filipenses enviada em 110,[9] um mosaico de referências às Escrituras em grego, preservada no relato de Ireneu sobre a vida do bispo de Esmirna. Ela, um trecho do "Martírio" que tem a forma de uma carta circular da Igreja de Esmirna para as demais igrejas da província do Ponto, é parte de uma coleção de escritos dos Padres Apostólicos. Juntamente com os Atos dos Apóstolos, que contém o relato do martírio de Santo Estevão, o "Martírio de Policarpo" é considerado como sendo uma dos mais antigos[1] relatos genuínos de martírios cristãos e um dos poucos relatos sobreviventes compostos na época das perseguições.
Importância
Policarpo ocupa um lugar importante na história do cristianismo primitivo.[7] Ele é contado entre os primeiros cristãos cuja alguma obra sobreviveu. É provável que ele tenha conhecido o apóstolo João, um dos doze apóstolos.[9] Ele era também o ancião de uma importante congregação que teve importante papel na consolidação da Igreja Cristã. Ele é também de uma época cuja ortodoxia é geralmente aceita pelas igrejas ortodoxas, católicas orientais, por grupos adventistas, protestantes (tradicionais, não reformados) e católicos. De acordo com David Trobisch, Policarpo pode ter sido um dos que compilaram, editaram e publicaram o que seria chamado de "Novo Testamento".[13] Todos estes fatos aumentam muito o interesse sobre sua obra.
Ireneu escreveu o seguinte sobre ele[14]: "Um homem que era de estatura muito maior e uma testemunha mais firme da verdade do que Valentim, Marcião e o resto dos heréticos [gnósticos]". Policarpo viveu no período seguinte à morte dos apóstolos, quando uma grande variedade de interpretações sobre o que Jesus havia dito e feito estava sendo pregada. Seu papel foi de autenticar o que seria considerado "ortodoxo" através de sua famosa relação com o apóstolo João: "um grande valor era atribuído ao testemunho que Policarpo poderia dar como sendo a genuína tradição da antiga doutrina apostólica", comentou Henry Wace,[2] "seu testemunho condenando como novidades ofensivas a ficção dos professores heréticos".
Ver também
Referências
- ↑ ab c Este artigo incorpora texto (em inglês) da Encyclopædia Britannica (11.ª edição), publicação em domínio público.
- ↑ ab c Este artigo incorpora texto do verbete Polycarpus, bishop of Smyrna no "Dicionário de Biografias Cristãs e Literatura do final do século VI, com o relato das principais seitas e heresias" (em inglês) por Henry Wace (1911), uma publicação agora em domínio público.
- ↑ Ireneu. «3». Adversus Haereses. A refutation of the heretics, from the fact that, in the various Churches, a perpetual succession of bishops was kept up. (em inglês). III. [S.l.: s.n.] - Policarpo não cita o Evangelho de João em sua epístola sobrevivente, o que pode ser uma indicação de qualquer que seja o João que ele conheceu, não era ele o autor deste evangelho ou de que o evangelho não estava ainda finalizado quando Policarpo era discípulo. Weidmann sugere (vide Weidmann, Frederick W. (1999). Polycarp and John: The Harris Fragments and Their Challenge to the Literary Tradition (em inglês). [S.l.]: University of Notre Dame Press. p. 132) que os "Fragmentos de Harris" podem refletir tradições muito antigas: "o material bruto para uma narrativa sobre João e Policarpo pode ter sido composto antes de Ireneu; a codificação do significado de uma linha sucessória direta do apóstolo João através de Policarpo pode, discutivelmente, ser ligado diretamente a Ireneu".
- ↑ Tertuliano. «32.2». Prescrição contra heréticos. None of the Heretics Claim Succession from the Apostles. New Churches Still Apostolic, Because Their Faith is that Which the Apostles Taught and Handed Down. The Heretics Challenged to Show Any Apostolic Credentials. (em inglês). I. [S.l.: s.n.]
- ↑ Datação de acordo com Weidmann, Frederick W. (1999). Polycarp and John: The Harris Fragments and Their Challenge to the Literary Tradition (em inglês). [S.l.]: University of Notre Dame Press.
- ↑ Weidmann, Frederick W. (1999). Polycarp and John: The Harris Fragments and Their Challenge to the Literary Tradition (em inglês). [S.l.]: University of Notre Dame Press. p. 133
- ↑ ab Hartog, Paul (2002). Polycarp and the New Testament. [S.l.: s.n.] p. 17. ISBN 978-3-16-147419-4
- ↑ Ireneu. «33.4». Adversus Haereses. The blessing pronounced by Jacob had pointed out this already, as Papias and the elders have interpreted it (em inglês). V. [S.l.: s.n.]
- ↑ ab c d e "De Viris Illustribus - Polycarp the bishop", em inglês.
- ↑ Staniforth, Maxwell (1987). Early Christian Writings (em inglês). London: Penguin Books. p. 115
- ↑ «Polycarp» (em inglês). Polycarp.net. Consultado em 25 de novembro de 2012
- ↑ Cave, William (1840). H. Cary, ed. Primitive Christianity: or the Religion of the Ancient Christians in the First Ages of the Gospel (em inglês). London: Oxford. pp. 84–85
- ↑ David Trobisch (2007–2008). «Who Published the New Testament?» (PDF). Free Inquiry (em inglês). 1 (28): 30-33. Consultado em 25 de novembro de 2012
- ↑ Ireneu. «3.4». Adversus Haereses. A refutation of the heretics, from the fact that, in the various Churches, a perpetual succession of bishops was kept up. (em inglês). III. [S.l.: s.n.]
Ligações externas
- Este artigo incorpora texto (em inglês) da Encyclopædia Britannica (11.ª edição), publicação em domínio público.
- "St. Polycarp" na edição de 1913 da Enciclopédia Católica (em inglês). Em domínio público.
- «Polycarp» (em inglês). Early Christian Writings. Consultado em 25 de novembro de 2012
- «Polycarp: The Apostolic Legacy» (em inglês). Vision.org. Consultado em 25 de novembro de 2012. Arquivado do original em 27 de outubro de 2012
- «Texto completo do Martírio de Policarpo» (em inglês). New Advent. Consultado em 25 de novembro de 2012
- «Saint Polycarp of Smyrna» (em inglês). Patron Saints Index. Consultado em 25 de novembro de 2012. Arquivado do original em 30 de março de 2008
- «Capítulo da Legenda Áurea sobre Policarpo» 🔗 (em inglês). Catholic Forum. Consultado em 25 de novembro de 2012. Arquivado do original em 11 de setembro de 2012