Religião
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Religião (do latim religio, -onis) é um conjunto de sistemas culturais e de crenças, além de visões de mundo, que estabelece os símbolos que relacionam a humanidade com a espiritualidade e seus próprios valores morais.[nota 1] Muitas religiões têm narrativas, símbolos, tradições e histórias sagradas que se destinam a dar sentido à vida ou explicar a sua origem e do universo. As religiões tendem a derivar a moralidade, a ética, as leis religiosas ou um estilo de vida preferido de suas ideias sobre o cosmos e a natureza humana.
A palavra religião é muitas vezes usada como sinônimo de fé ou sistema de crença, mas a religião difere da crença privada na medida em que tem um aspecto público. A maioria das religiões tem comportamentos organizados, incluindo hierarquias clericais, uma definição do que constitui a adesão ou filiação, congregações de leigos, reuniões regulares ou serviços para fins de veneração ou adoração de uma divindade ou para a oração, lugares (naturais ou arquitetônicos) e/ou escrituras sagradas para seus praticantes. A prática de uma religião pode também incluir sermões, comemoração das atividades de um deus ou deuses, sacrifícios, festivais, festas, transe, iniciações, serviços funerários, serviços matrimoniais, meditação, música, arte, dança, ou outros aspectos religiosos da cultura humana.
O desenvolvimento da religião assumiu diferentes formas em diferentes culturas. Algumas religiões colocam a tônica na crença, enquanto outras enfatizam a prática. Algumas religiões focam na experiência religiosa subjetiva do indivíduo, enquanto outras consideram as atividades da comunidade religiosa como mais importantes. Algumas religiões afirmam serem universais, acreditando que suas leis e cosmologia são válidas ou obrigatórias para todas as pessoas, enquanto outras se destinam a serem praticadas apenas por um grupo bem definido ou localizado. Em muitos lugares, a religião tem sido associada com instituições públicas, como escolas , hospitais, família, governo e hierarquias políticas.
Alguns acadêmicos que estudam o assunto têm dividido as religiões em três categorias amplas: religiões mundiais, um termo que se refere à crenças transculturais e internacionais; religiões indígenas, que se refere a grupos religiosos menores, oriundos de uma cultura ou nação específica; e o novo movimento religioso, que refere-se a crenças recentemente desenvolvidas.[1] Uma teoria acadêmica moderna sobre a religião, o construtivismo social, diz que a religião é um conceito moderno que sugere que toda a prática espiritual e adoração segue um modelo semelhante ao das religiões abraâmicas, como um sistema de orientação que ajuda a interpretar a realidade e definir os seres humanos[2] e, assim, a religião, como um conceito, tem sido aplicado de forma inadequada para culturas não ocidentais que não são baseadas em tais sistemas ou em que estes sistemas são uma construção substancialmente mais comum.
Etimologia
Religião por país |
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Historicamente foram propostas várias etimologias para a origem de religio. Cícero, na sua obra De natura deorum, (45 a.C.) afirma que o termo se refere a relegere, reler, sendo característico das pessoas religiosas prestarem muita atenção a tudo o que se relacionava com os deuses, relendo as escrituras. Esta proposta etimológica sublinha o carácter repetitivo do fenómeno religioso, bem como o aspecto intelectual. Mais tarde, Lactâncio (século III e IV d.C.) rejeita a interpretação de Cícero e afirma que o termo vem de religare, 'religar', argumentando que a religião é um laço de piedade que serve para religar os seres humanos a Deus. No livro "A Cidade de Deus" Agostinho de Hipona (século IV d.C.) afirma que religio deriva de religere, "reeleger". Através da religião a humanidade reelegia de novo a Deus, do qual se tinha separado. Mais tarde, na obra De vera religione, Agostinho retoma a interpretação de Lactâncio, que via em religio uma relação com "religar".[3][4]
Macróbio (século V d.C.) considera que religio deriva de relinquere, 'deixar para trás'.[5]
Segundo outras fontes, a raiz da palavra religião tem ligações com o -lig-, de 'diligente' ou 'inteligente', ou com le-, lec-, -lei, -leg- de "ler", "lecionar", "eleitor" e "eleger" respectivamente. o re- inicial é um prefixo que vem de red(i) "vir", "voltar" como em "reditivo" ou "relíquia" [6]
A palavra "religião" foi usada durante séculos no contexto cultural da Europa, marcado pela presença do cristianismo que se apropriou do termo latino religio. Em outras civilizações não existe uma palavra equivalente. O hinduísmo antigo utilizava a palavra rita que apontava para a ordem cósmica do mundo, com a qual todos os seres deveriam estar harmonizados e que também se referia à correta execução dos ritos pelos brâmanes. Mais tarde, o termo foi substituído por dharma, termo que atualmente é também usado pelo budismo e que exprime a ideia de uma lei divina e eterna.
Primeiras manifestações religiosas
Há muito tempo se discute, qual teria sido a primeira religião da humanidade, do ponto de vista histórico, os primeiros registros de manifestações religiosas datam da antiguidade, na Mesopotâmia, pois estes foram os primeiros povos a registrar sua historia através da escrita, porem as manifestações religiosas são muito mais antigas, e eram praticadas por diversos povos ao redor do mundo antes mesmo dos mesopotâmios registrarem as suas, como atesta a arqueologia.
Muitas teorias têm tentado explicar qual seria a primeira religião, até o século XVIII, incentivado pelo cristianismo era comum a ideia de que a primeira religião do mundo era monoteísta, centrada em um único Deus.[7][8] Outros pesquisadores no entanto argumentam que o politeísmo já era praticado desde a pré-história, pelo mais diversos povos, antes do monoteísmo.[9] [8][10]A partir da década de 70, surgiu a teoria do matriarcado pré-histórico, segundo essa teoria, os povos primitivos do neolítico, cultuavam uma deusa, ou grupo de deusas. Embora essa teoria tenha ganhado espaço entre grupos ideológicos feministas e na mídia, ela não encontra respaldo e não é mais aceita entre os pesquisadores modernos, pois a maioria absoluta das evidências arqueológicas, apontam para a inexistência de um matriarcado pré-histórico.[11][12] Atualmente acredita-se que a crença na vida após a morte, e o culto aos animais e as forças da natureza, foram as primeiras formas de manifestações religiosas, realizadas pelos seres humanos, e que cada povo com o passar do tempo foi desenvolvendo sua própria religião, adequando as sua próprias necessidades.
Conceitos
Existem termos que são ditos/escritos frequentemente no discurso religioso grego, romano, judeu e cristão. Entre eles estão: sacro e seus derivados (sacrar, sagrar, sacralizar, sacramentar, execrar), profano (profanar) e deus(es).[13] O conceito desses termos varia bastante conforme a época e a religião de quem os emprega. Contudo, é possível ressaltar um mínimo comum à grande parte dos conceitos atribuídos aos termos.[14]
Os religiosos gregos e romanos criam na existência de vários deuses; os judeus, muçulmanos e cristãos acreditam que há apenas uma divindade, um ser impossível de ser sentido pelos sensores humanos e que é capaz de provocar acontecimentos improváveis/impossíveis que podem favorecer ou prejudicar os homens.[14] Para grande parte das religiões,[13] as coisas e as ações se dividem entre sacras e profanas. Sacro é aquilo que mantém uma ligação/relação com o(s) deus(es). Frequentemente está relacionado ao conceito de moralidade.[13] Profano é aquilo que não mantém nenhuma ligação com o(s) deus(es). Da mesma forma, para grande parte das religiões a imoralidade e o profano são correspondentes. Já o verbo "profanar" (tornar algo profano) é sempre tido como uma ação má pelos religiosos.[14]
Definição
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Dentro do que se define como religião podem-se encontrar muitas crenças e filosofias diferentes. As diversas religiões do mundo são de facto muito diferentes entre si. Porém ainda assim é possível estabelecer uma característica em comum entre todas elas. É facto que toda religião possui um sistema de crenças no sobrenatural, geralmente envolvendo divindades, deuses e demónios.[15] As religiões costumam também possuir relatos sobre a origem do Universo, da Terra e do Homem, e o que acontece após a morte. A maior parte crê na vida após a morte.[15]
A religião não é apenas um fenômeno individual, mas também um fenômeno social. Exemplos de doutrinas que exigem não só uma fé individual, mas também adesão a um certo grupo social, são as doutrinas da Igreja Católica, do judaísmo, dos amish.
A ideia de "religião", com muita frequência, contempla a existência de seres superiores que teriam influência ou poder de determinação no destino humano. Esses seres são principalmente deuses, que ficam no topo de um sistema que pode incluir várias categorias: anjos, demônios, elementais, semideuses, etc.
Outras definições mais amplas de religião dispensam a ideia de divindades e focalizam os papéis de desenvolvimento de valores morais, códigos de conduta e senso cooperativo em uma comunidade.[15]
Ateísmo é a ausência de crença em qualquer tipo de deus, muitas vezes se contrapondo às religiões teístas. Agnosticismo é a postura filosófica que afirma ser impossível saber racionalmente sobre a existência ou inexistência de deuses e sobre a veracidade de qualquer religião teísta, por falta de provas favoráveis ou contrárias.[13] Deísmo é a crença na existência de um Deus criador, mas questiona a ideia de revelação divina.
Algumas religiões não consideram deidades, e podem ser consideradas como ateístas (apesar do ateísmo não ser uma religião, ele pode ser uma característica de uma religião). É o caso do budismo, do confucionismo e do taoísmo. Recentemente surgiram movimentos especificamente voltados para uma prática religiosa (ou similar) da parte de deístas, agnósticos e ateus - como exemplo podem ser citados o Humanismo Laico e o Unitário-Universalismo. Outros criaram sistemas filosóficos alternativos como August Comte, fundador da Religião da Humanidade.
As religiões que afirmam a existência de deuses podem ser classificadas em dois tipos: monoteísta ou politeísta. As religiões monoteístas (monoteísmo) admitem somente a existência de um único deus, um ser supremo. As religiões politeístas (politeísmo) admitem a existência de mais de um deus.
Atualmente, as religiões monoteístas são dominantes no mundo: judaísmo, cristianismo e islamismo, juntos, agregam mais da metade dos seres humanos e quase a totalidade do mundo ocidental. Além destas, o zoroastrismo, a fé bahá'i, o espiritismo e bnei noah são religiões monoteístas.
Movimentos religiosos
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Esta classificação procura agrupar as religiões com base em critérios geográficos, como a concentração numa determinada região ou o facto de certas religiões terem nascido na mesma região do mundo. As categorias mais empregues são as seguintes:
- Religiões abraâmicas: judaísmo, cristianismo, islamismo, fé bahá'í;
- Religiões da Ásia Oriental: confucionismo, taoismo, budismo mahayana e xintoísmo;
- Religiões da Índia: hinduísmo, jainismo, budismo e siquismo;
- Religiões africanas: religiões dos povos tribais da África Negra;
- Religiões da Oceania: religiões dos povos das ilhas do Pacífico, da Austrália e da Nova Zelândia;
- Religiões da Antiga Grécia e Roma.
- zoroastrismo
Esta classificação não se refere à forma como tais religiões estão distribuídas hoje pela Terra, mas às regiões onde elas surgiram. Fundamenta-se no fato de que as religiões nascidas em regiões próximas mantém também proximidades em relação aos seus credos, por exemplo: as religiões nascidas no Oriente Médio em geral são monoteístas e submetem seus crédulos a forte regime de proibições e obrigações, sempre se utilizando de ameaças pós-morte como a do inferno cristão. Já as religiões nascidas no Oriente Distante são politeístas ou espiritualistas (não pregam a existência de nenhum deus, mas acreditam em forças espirituais) e são mais flexíveis quanto suas normas morais.
A distribuição atual das religiões não corresponde às suas origens, já que algumas perderam força em suas regiões nativas e ganharam participação em outras partes do planeta, um exemplo básico é o cristianismo, que é minoritário no Oriente Médio (onde surgiu) e majoritário em todo o Ocidente e na Oceania (para onde migrou).
Mundo contemporâneo
Desde os finais do século XIX, e em particular desde a segunda metade do século XX, o papel da religião, bem como seu número de aderentes, tem se alterado profundamente.
Alguns países cuja tradição religiosa esteve historicamente ligada ao cristianismo, em concreto os países da Europa, experimentaram um significativo declínio da religião. Este declínio manifestou-se na diminuição do número de pessoas que frequenta serviços religiosos ou do número de pessoas que desejam abraçar uma vida monástica ou ligada ao sacerdócio.
Em contraste, nos Estados Unidos, na América Latina e na África subsariana, o cristianismo cresce significativamente; para alguns estudiosos[quem?] estes locais serão num futuro próximo os novos centros desta religião. O islão é actualmente a religião que mais cresce em número de adeptos, que não se circunscrevem ao mundo árabe, mas também ao sudeste asiático, e a comunidades na Europa e no continente americano. O hinduísmo, o budismo e o xintoísmo têm a sua grande área de influência no Extremo Oriente, embora as duas primeiras tradições influenciem cada vez mais a espiritualidade dos habitantes do mundo ocidental. A Índia, onde cerca de 80 por cento da população é hindu, é um dos países mais religiosos do mundo, ficando em segundo lugar, após os Estados Unidos. As explicações para o crescimento das religiões nestas regiões incluem a desilusão com as grandes ideologias do século XIX e XX, como o nacionalismo e o socialismo. O protestantismo, que vem crescendo nos países da América Latina, iniciou-se com Martinho Lutero, na reforma protestante do século XVI.
Por outro lado, o mundo ocidental é marcado por práticas religiosas sincréticas, ligadas a uma "religião individual" de cada um faz para si e ao surgimento dos chamados "novos movimentos religiosos". Embora nem todos esses movimentos sejam assim tão recentes, o termo é usado para se referir a movimentos neocristãos (Movimento de Jesus), judaico-cristãos (Judeus por Jesus), movimentos de inspiração oriental (Movimento Hare Krishna) e a grupos que apelam ao desenvolvimento do potencial humano através por exemplo de técnicas de meditação (Meditação Transcendental). Também presente na Europa e nos Estados Unidos da América é aquilo que os investigadores designam como uma "nebulosa místico-esotérica", que apela a práticas como o xamanismo, o tarot, a astrologia, os mistérios e cuja actividades giram em torno da organização de conferências, estágios, revistas e livros. Algumas das características desta nebulosa místico-esotérica são as centralidades do indivíduo que deve percorrer um caminho pessoal de aperfeiçoamento através da utilização de práticas como o ioga, a meditação, a ideia de que todas as religiões podem convergir, o desejo de paz mundial e do surgimento de uma nova era marcada por um nível superior de consciência.
Quatro maiores religiões | Seguidores[carece de fontes] | % da população mundial | Artigo |
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População mundial | 6,8 bilhões[16][17] | Dados extraídos de artigos individuais: | |
Cristianismo | 1,9 bilhão – 2,1 bilhões[18] | 29% – 32% | Cristianismo por país |
Islã | 1,3 bilhão – 1,57 bilhão[18][19] | 19% – 21% | Islão por país |
Budismo | 500 milhões – 1,5 bilhão[20][21] | 7% – 21% | Budismo por país |
Hinduísmo | 950 milhões – 1 bilhão | 14% – 20% | Hinduísmo por país |
Total | 4,65 bilhões – 6,17 bilhões | 68,38% – 90,73% |
Mídia
Em 23 de dezembro de 1999 em seu número especial por ocasião da mudança do milênio, a revista The Economist publicou uma nota necrológica de Deus,[22] e afirmou mais tarde ter agido precipitadamente. Num longo noticiário de 3 de novembro de 2007, reconhece que apesar do prognóstico laicista ou secularista, a fé sobrevive. O noticiário concluiu que para um político ou estadista seria um erro muito perigoso ignorar ou legar a um segundo plano a religião.[23] A temática em torno de religião e sobre Deus também tomou conta do debate político na África em 2010 e ganhou espaço na campanha eleitoral, candidatos são obrigados a responder perguntas sobre religião e se veem compelidos a participar de cultos.[24]
Características
Embora cada religião apresente elementos próprios, é também possível estabelecer uma série de elementos comuns às várias religiões e que podem permitir uma melhor compreensão do fenômeno religioso.
As religiões possuem grandes narrativas, que explicam o começo do mundo ou que legitimam a sua existência. O exemplo mais conhecido é talvez a narrativa do Génesis na tradição judaica e cristã. Quanto à legitimação da existência e da validade de um sistema religioso, este costuma apelar a uma revelação ou à obtenção de uma sabedoria por parte de um fundador, como sucede no budismo, onde o Buda alcançou a iluminação enquanto meditava debaixo de uma figueira ou no Islão, em que Muhammad recebeu a revelação do Corão de Deus.
As religiões tendem igualmente a sacralizar determinados locais. Os motivos para essa sacralização são variados, podendo estar relacionados com determinado evento na história da religião (por exemplo, a importância do Muro das Lamentações no judaísmo ou da Igreja do Santo Sepulcro no cristianismo) ou porque a esses locais são associados acontecimentos miraculosos (santuários católicos de Fátima ou de Lourdes) ou porque são marcos de eventos religiosos relacionados à mitologia da própria religião (monumentos megalíticos, como Stonehenge, no caso das religiões pagãs). Na antiga religião grega, os templos não eram locais para a prática religiosa, mas sim locais onde se acreditava que habitava a divindade, sendo, por isso, sagrados.
As religiões estabelecem que certos períodos temporais são especiais e dedicados a uma interacção com o divino. Esses períodos podem ser anuais, mensais, semanais ou podem mesmo se desenrolar ao longo de um dia. Algumas religiões consideram que certos dias da semana são sagrados (Shabat para os judeus, sábado para os adventistas e alguns batistas do sétimo dia, ou o domingo para a maioria das outras religiões ligadas ao cristianismo), outras marcam esses dias sagrados de acordo com fenômenos da natureza, como as fases da lua, na religião Wicca, em que todo primeiro dia de lua cheia (esbat) é considerado sagrado. As religiões propõem festas ou períodos de jejum e meditação que se desenvolvem ao longo do ano.
O estudo da religião
História do estudo da religião
As primeiras reflexões sobre a religião foram feitas pelos antigos Gregos e Romanos. Xenofonte relativizou o fenómeno religioso, argumentando que cada cultura criava deuses à sua semelhança. O historiador grego Heródoto descreveu nas suas Histórias as várias práticas religiosas dos povos que encontrou durante as viagens que efetuou. Confrontado com as diferenças existentes entre a religião grega e a religião dos outros povos, tentou identificar alguns deuses das culturas estrangeiras com os deuses gregos. O sofista Protágoras declarou desconhecer se os deuses existiam ou não, posição que teve como consequências a sua expulsão de Atenas e o queimar de toda a sua obra. Crítias defendeu que a religião servia para disciplinar os seres humanos e fazer com que estes aderissem aos ideais da virtude e da justiça. Júlio César e o historiador Tácito descreveram nas suas obras as práticas religiosas dos povos que encontraram durante as suas conquistas militares.
Nos primeiros séculos da era atual, os autores cristãos produziram reflexões em torno da religião fruto dos ataques que experimentaram por parte dos autores pagãos. Estes criticavam o facto desta religião ser recente quando comparada com a antiguidade dos cultos pagãos. Como resposta a esta alegação, Eusébio de Cesareia e Agostinho de Hipona mostraram que o cristianismo se inseria na tradição das escrituras hebraicas, que relatavam a origem do mundo. Para os primeiros autores cristãos, a humanidade era de início monoteísta, mas tinha sido corrompida pelos cultos politeístas que identificavam como obra de Satanás.
Durante a Idade Média, os pensadores do mundo muçulmano revelaram um conhecimento mais profundo das religiões que os autores cristãos. Na Europa, as viagens de Marco Polo permitiram conhecer alguns aspectos das religiões da Ásia, porém a visão sobre as outras religiões era limitada: o judaísmo era condenado pelo facto dos judeus terem rejeitado Jesus como messias e o islão era visto como uma heresia.
O Renascimento foi um movimento cultural e artístico que procurava reviver os moldes da Antiguidade. Assim sendo, os antigos deuses dos gregos e dos romanos deixaram de ser vistos pela elite intelectual e artística como demónios, sendo representados e estudados pelos artistas que os representavam. Nicolau de Cusa realizou um estudo comparado entre o cristianismo e o islão em obras como De pace fidei e Cribatio Alcorani. Em Marsílio Ficino encontra-se um interesse em estudar as fontes das diferentes religiões; este autor via também uma continuidade no pensamento religioso. Giovanni Pico della Mirandola interessou-se pela tradição mística do judaísmo, a Cabala.
As descobertas e a expansão européia pelos continentes, tiveram como consequência a exposição dos europeus a culturas e religiões que eram muito diferentes das suas. Os missionários cristãos realizaram descrições das várias religiões, entre as quais se encontram as de Roberto de Nobili e Matteo Ricci, jesuítas que conheceram bem as culturas da Índia e da China, onde viveram durante anos.
Em 1724, Joseph François Lafitau, um padre jesuíta, publicou a obra Moeurs des sauvages amériquains comparées aux moeurs des premiers temps, na qual comparava as religiões dos índios, a religião da Antiguidade Clássica e o catolicismo, tendo chegado à conclusão de que estas religiões derivavam de uma religião primordial.
Nos finais do século XVIII e no início do século XIX parte importante dos textos sagrados das religiões tinham já sido traduzidos nas principais línguas européias. No século XIX ocorre também a estruturação da antropologia como ciência, tendo vários antropólogos se dedicado ao estudo das religiões dos povos tribais. Nesta época os investigadores refletiram sobre as origens da religião, tendo alguns defendido um esquema evolutivo, no qual o animismo era a forma religiosa primordial, que depois evoluía para o politeísmo e mais tarde para o monoteísmo.
Abordagens disciplinares
O estudo científico da religião é, atualmente, realizado por várias disciplinas das ciências sociais e humanas. A história das religiões, nascida na segunda metade do século XIX, estuda a religião recorrendo aos métodos da investigação histórica. Ela estuda o contexto cultural e político em que determinada tradição religiosa emergiu.
A sociologia da religião analisa as religiões como fenómenos sociais, procurando desvendar a influência dela na vida do indivíduo e da comunidade. A Sociologia da Religião tem como principais nomes Emile Durkheim, Karl Marx, Ernst Troeltsch, Max Weber e Peter Berger.
A antropologia, tradicionalmente centrada no estudo dos povos sem escrita (embora os seus campos de estudo possam ser também as modernas sociedades capitalistas), desenvolveu igualmente uma área de estudo da religião, na qual se especulou sobre as origens e funções da religião. John Lubbock, no livro The Origin of Civilization and the Primitive Condition of Man apresentou um esquema evolutivo da religião: do ateísmo (entendido como ausência de ideias religiosas), passa-se para o xamanismo, o antropomorfismo, o monoteísmo e finalmente para o monoteísmo ético. Esta visão evolucionista foi colocada em questão por outros investigadores, como E.B. Taylor que considerava o animismo como a primitiva forma de religião.
A fenomenologia da religião, que deriva da filosofia fenomenológica de Edmund Husserl, tenta captar o lado único da experiência religiosa. Utiliza como principal método científico a observação, explicando os mitos, os símbolos e os rituais. Ela procura compreender a religião do ponto de vista do crente, bem como o valor dessas crenças na vida do mesmo. Por estas razões evita os juízos de valores (conceito de epoje ou abandono de qualquer juízo de valor). Os principais nomes ligados à Fenomenologia da Religião são Nathan Soderblom, Garardus van der Leeuw, Rudolf Otto, Friedrich Heiler e Mircea Eliade.
Filosofia da Religião
A filosofia da religião como uma disciplina distinta é uma inovação dos últimos 200 anos, mas seus temas centrais como a existência e a natureza do divino, a humanidade da relação do homem para com ele, a natureza da religião, e o lugar da religião na vida humana, tem estado com o ser humano desde o início da filosofia. Os filósofos têm examinado tempo a verdade e a justificação racional para as alegações, e têm explorado tais fenômenos filosoficamente interessantes como a fé, a experiência religiosa, e os traços distintivos do discurso religioso. A segunda metade do século XX foi um período especialmente frutífero, com os filósofos que utilizam novos desenvolvimentos em lógica e da epistemologia para montar as duas defesas sofisticadas, e ou os ataques às afirmações religiosas.[25]
A expressão "filosofia da religião" não entrou em uso geral até o século XIX, quando foi empregada para se referir à articulação e crítica da consciência religiosa da humanidade e suas expressões culturais em pensamento, linguagem, sentindo, e prática. Historicamente, a reflexão filosófica sobre temas religiosos teve dois focos:, atitudes, sentimentos e práticas que se acreditava em primeiro lugar, Deus ou Brahma ou Nirvana ou qualquer outra coisa que seria o objeto do pensamento religioso , e, em segundo lugar, o tema religioso humano, isto é, os pensamentos, atitudes, sentimentos e a prática. O primeiro tipo de reflexão filosófica tem uma longa história. No Ocidente, por exemplo, as discussões da natureza de Deus (se ele é imutável, digamos, ou conhece o futuro, se a sua existência pode ser racionalmente demonstrada, e afins) são incorporadas em tratados teológicos tais como Proslogion de Anselmo e Monologion, Summas de Tomás de Aquino, o Guia de Maimônides, e Incoerência dos Filósofos de al-Ghazali. Também fazem parte de sistemas metafísicos influentes como Platão, René Descartes e Leibniz.
Referências
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Notas
- ↑ Embora a religião seja difícil de definir, um modelo padrão de religião, usado em cursos de estudos religiosos, foi proposto por Clifford Geertz, que simplesmente a considerara um "sistema cultural" (Clifford Geertz, ""Religião como Sistema Cultural, 1973). A crítica do modelo de Geertz por Talal Asad categorizou a religião como "uma categoria antropológica" (Talal Asad,A Construção da Religião como umacategoria antropológica, 1982.)
Bibliografia
- FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As Ciências das Religiões. São Paulo: Paulus, 1999. ISBN 85-349-1460-5
- DELUMEAU, Jean (dir.). As Grandes Religiões do Mundo. Lisboa: Editorial Presença, 1997. ISBN 972-23-2241-9
- MARQUES, Leonado A. História das Religiões e a Dialética do Sagrado. Madras, 2005. ISBN 85-7374-952-0