domingo, 19 de maio de 2019

MÁRIO DE SÁ CARNEIRO - POETA - NASCEU EM 1890 - 19 DE MAIO DE 2019

Mário de Sá-Carneiro

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Disambig grey.svg Nota: Para o político português com o mesmo sobrenome, veja Francisco Sá Carneiro.
Mário de Sá-Carneiro
Mário de Sá Carneiro
Nascimento19 de maio de 1890
LisboaPortugal
Morte26 de abril de 1916 (25 anos)
Hôtel de Nice, ParisFrança
ResidênciaLisboa: Travessa do Carmo
NacionalidadePortugal portuguesa
OcupaçãoEscritor
Gênero literárioModernismo
Magnum opusCéu em Fogo
Assinatura
AssinaturaMárioDeSáCarneiro.svg
Mário de Sá-Carneiro (Lisboa19 de Maio de 1890 — Paris26 de Abril de 1916) foi um poetacontista e ficcionista português, um dos grandes expoentes do modernismo em Portugal e um dos mais reputados membros da Geração d’Orpheu.[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Edifício na Rua da Conceição, na Baixa Pombalina, onde nasceu Mário de Sá-Carneiro em 1890
Nasceu no seio de uma abastada família, sendo filho e neto de militares. O seu pai era Carlos Augusto de Sá-Carneiro e a sua mãe, Águeda Maria de Sousa Peres Marinello. Órfão de mãe com apenas dois anos (1892), ficou entregue ao cuidado dos avós, indo viver para a Quinta da Vitória, na freguesia de Camarate, às portas de Lisboa, aí passando grande parte da infância.
Começa a escrever poesia aos 12 anos, sendo que aos 15 já traduzia Victor Hugo e com 16 Goethe e Schiller. No liceu teve ainda algumas experiências episódicas como ator.
Em 1911, com 21 anos, vai para Coimbra, onde se matricula na Faculdade de Direito, mas não conclui sequer o primeiro ano.
Desiludido com a «cidade dos estudantes», segue para Paris a fim de prosseguir os estudos superiores, com o auxílio financeiro do pai. Cedo, porém, deixou de frequentar as aulas na Sorbonne, dedicando-se a uma vida boémia, deambulando pelos cafés e salas de espectáculo, chegando a passar fome e debatendo-se com os seus desesperos, situação que culminou na ligação emocional a uma prostituta, a fim de combater as suas frustrações e desesperos.
Sá-Carneiro conhecera em 1912 aquele que foi, sem dúvida, o seu melhor amigo: Fernando Pessoa. Já na capital francesa viria a conhecer Guilherme de Santa-Rita (Santa-Rita Pintor). Inadaptado socialmente e psicologicamente instável, foi neste ambiente que compôs grande parte da sua obra poética e a correspondência com o seu confidente Fernando Pessoa; é, pois, entre 1912 e 1916 (o ano da sua morte), que se inscreve a sua fugaz – e no entanto assaz profícua – carreira literária.
Entre 1913 e 1914 Mário Sá-Carneiro viaja para Lisboa com uma certa regularidade, regressando à capital, devido à deflagração do conflito entre a Sérvia e a Áustria-Hungria, o qual a breve trecho se tornou uma conflagração à escala europeia – a I Guerra Mundial.
Com Fernando Pessoa e ainda Almada Negreiros integrou o primeiro grupo modernista português (o qual, influenciado pelo cosmopolitismo e pelas vanguardas culturais europeias, pretendia escandalizar a sociedade burguesa e urbana da época), sendo responsável pela edição da revista literária Orpheu, editada por António Ferro (e que por isso mesmo ficou sendo conhecido como a Geração d’Orpheu ou Grupo d’Orpheu),[1] um verdadeiro escândalo literário à época, motivo pelo qual apenas saíram dois números (Março e Junho de 1915; o terceiro, embora impresso, não foi publicado, tendo os seus autores sido alvo da chacota social) – ainda que hoje seja, reconhecidamente, um dos marcos da história da literatura portuguesa, responsável pela agitação do meio cultural português, bem como pela introdução do Modernismoem Portugal.[1]
Também teve colaboração em diversas publicações periódicas, nomeadamente no semanário Azulejos [2] (1907-1909); na II série da revista Alma nova[3] (1915-1918) e na revista Contemporânea[4] (1915-1926), e pode ainda encontrar-se colaboração da sua autoria, publicada postumamente, na revista Pirâmide [5] (1959-1960) e Sudoeste [6] (1935).
Em Julho de 1915 regressa a Paris, escrevendo a Pessoa cartas de uma crescente angústia, das quais ressalta não apenas a imagem lancinante de um homem perdido no «labirinto de si próprio», mas também a evolução e maturidade do processo de escrita de Sá-Carneiro.
Uma vez que a vida que trazia não lhe agradava, e aquela que idealizava tardava em se concretizar, Sá-Carneiro entrou numa cada vez maior angústia, que viria a conduzi-lo ao seu suicídio prematuro, perpetrado no Hôtel de Nice, no bairro de Montmartre em Paris, com o recurso a cinco frascos de arseniato de estricnina. Embora tivesse adiado por alguns dias o dramático desfecho da sua vida, numa «carta de despedida» para Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro revela as suas razões para se suicidar:
Paris - 31 Março 1916
Meu Querido Amigo.
A menos de um milagre na próxima segunda-feira, 3 (ou mesmo na véspera), o seu Mário de Sá-Carneiro tomará uma forte dose de estricnina e desaparecerá deste mundo. É assim tal e qual – mas custa-me tanto a escrever esta carta pelo ridículo que sempre encontrei nas "cartas de despedida"... Não vale a pena lastimar-me, meu querido Fernando: afinal tenho o que quero: o que tanto sempre quis – e eu, em verdade, já não fazia nada por aqui... Já dera o que tinha a dar. Eu não me mato por coisa nenhuma: eu mato-me porque me coloquei pelas circunstâncias – ou melhor: fui colocado por elas, numa áurea temeridade – numa situação para a qual, a meus olhos, não há outra saída. Antes assim. É a única maneira de fazer o que devo fazer. Vivo há quinze dias uma vida como sempre sonhei: tive tudo durante eles: realizada a parte sexual, enfim, da minha obra – vivido o histerismo do seu ópio, as luas zebradas, os mosqueiros roxos da sua Ilusão. Podia ser feliz mais tempo, tudo me corre, psicologicamente, às mil maravilhas: mas não tenho dinheiro. [...]
Mário de Sá-Carneiro,
carta para Fernando Pessoa.[7]
Fim
Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
E eu quero por força ir de burro!
Mário de Sá Carneiro,
Paris, 1916.[8]

Contava apenas vinte e cinco anos. Extravagante tanto na morte como em vida (de que o poema Fim é um dos mais belos exemplos), convidou para presenciar a sua agonia o seu amigo José de Araújo. E apesar de o grupo modernista português ter perdido um dos seus mais significativos colaboradores, nem por isso o entusiasmo dos restantes membros esmoreceu – no segundo número da revista Athena, Pessoa dedicou-lhe um belo texto, apelidando-o de «génio não só da arte como da inovação dela», e dizendo dele, retomando um aforismo das Báquides (IV, 7, 18), de Plauto, que «Morre jovem o que os Deuses amam» (tradução literal de Quem di diligunt adulescens moritur).
Génio na arte, não teve Sá-Carneiro nem alegria nem felicidade nesta vida. Só a arte, que fez ou que sentiu, por instantes o turbou de consolação. São assim os que os Deuses fadaram seus. Nem o amor os quer, nem a esperança os busca, nem a glória os acolhe. Ou morrem jovens, ou a si mesmos sobrevivem, íncolas da incompreensão ou da indiferença. Este morreu jovem, porque os Deuses lhe tiveram muito amor.
Mas para Sá-Carneiro, génio não só da arte mas da inovação nela, juntou-se, à indiferença que circunda os génios, o escárnio que persegue os inovadores, profetas, como Cassandra, de verdades que todos têm por mentira. In qua scribebat, barbara terrafuit. Mas, se a terra fora outra, não variara o destino. Hoje, mais que em outro tempo, qualquer privilégio é um castigo. Hoje, mais que nunca, se sofre a própria grandeza. As plebes de todas as classes cobrem, como uma maré morta, as ruínas do que foi grande e os alicerces desertos do que poderia sê-lo. O circo, mais que em Roma que morria, é hoje a vida de todos; porém alargou os seus muros até os confins da terra. A glória é dos gladiadores e dos mimos. Decide supremo qualquer soldado bárbaro, que a guarda impôs imperador. Nada nasce de grande que não nasça maldito, nem cresce de nobre que se não definhe, crescendo. Se assim é, assim seja! Os Deuses o quiseram assim.
Fernando Pessoa
Athena n.º 2, Lisboa, Novembro, 1924.

Placa que assinala o edifício onde Mário de Sá-Carneiro se suicidou, em 26 de abril de 1916
(Rua Victor-Massé 29, Paris).
Verdadeiro insatisfeito e inconformista (nunca se conseguiu entender com a maior parte dos que o rodeavam, nem tão pouco ajustar-se à vida prática, devido às suas dificuldades emocionais), mas também incompreendido (pelo modo com os contemporâneos olhavam o seu jeito poético), profetizou acertadamente que no futuro se faria jus à sua obra, no que não falhou.
Com efeito, reconhecido no seu tempo apenas por uma fina élite, à medida que a sua obra e correspondência foi publicada, ao longo dos anos, tornou-se acessível ao grande público, sendo atualmente considerado um dos maiores expoentes da literatura moderna em língua portuguesa.
A terra que o acolheu na infância – Camarate –, e a quem ele dedicou também algumas das suas poesias, homenageou-o, conferindo o seu nome a uma escola local. O seu poema Fim foi musicado por um grupo português no final dos anos 1980, os Trovante. Mais tarde, o seu poema O Outro foi também musicado pela cantora brasileira Adriana Calcanhotto.
As suas influências literárias são de Edgar Allan PoeOscar WildeCharles BaudelaireStéphane MallarméFiódor DostoievskiCesário Verde e António Nobre. Este escritor influenciou vários outros, entre eles Eugénio de Andrade.
Em 1949 a Câmara Municipal de Lisboa homenageou o escritor dando o seu nome a uma rua junto à Avenida da Igreja, em Alvalade.[9]

Carreira[editar | editar código-fonte]

Mário de Sá-Carneiro
Na fase inicial da sua obra, Mário de Sá-Carneiro revela influências de várias correntes literárias, como o decadentismo, o simbolismo, ou o saudosismo, então em franco declínio; posteriormente, por influência de Pessoa, viria a aderir a correntes de vanguarda, como o interseccionismo, o paulismo ou o futurismo.
Nessas pôde exprimir com vontade a sua personalidade, sendo notórios a confusão dos sentidos, o delírio, quase a raiar a alucinação; ao mesmo tempo, revela um certo narcisismo e egolatria, ao procurar exprimir o seu inconsciente e a dispersão que sentia do seu «eu» no mundo – revelando a mais profunda incapacidade de se assumir como adulto consistente.
O narcisismo, motivado certamente pelas carências emocionais (era órfão de mãe desde a mais terna puerícia), levou-o ao sentimento da solidão, do abandono e da frustração, traduzível numa poesia onde surge o retrato de um inútil e inapto. A crise de personalidade levá-lo-ia, mais tarde, a abraçar uma poesia onde se nota o frenesi de experiências sensórias, pervertendo e subvertendo a ordem lógica das coisas, demonstrando a sua incapacidade de viver aquilo que sonhava – sonhando por isso cada vez mais com a aniquilação do eu, o que acabaria por o conduzir, em última análise, ao seu suicídio. Estudos recentes evocam a influencia de Oscar Wilde na obra do autor dias antes do seu suicídio. Acredita-se que, atormentado pela leitura de De Profundis, Mário de Sá-Carneiro teria visto o ponto final de sua vida e sua carreira.
Embora não se afaste da metrificação tradicional (redondilhasdecassílabosalexandrinos), torna-se singular a sua escrita pelos seus ataques à gramática, e pelos jogos de palavras. Se numa primeira fase se nota ainda esse estilo clássico, numa segunda, claramente niilista, a sua poesia fica impregnada de uma humanidade autêntica, triste e trágica.
Por fim, as cartas que trocou com Pessoa, entre 1912 e o seu suicídio, são como que um autêntico diário onde se nota paralelamente o crescimento das suas frustrações interiores.

Obras[editar | editar código-fonte]

Amizade (1912)[editar | editar código-fonte]

Publicada em 1912Amizade, é a primeira peça que escreve. Mário de Sá-Carneiro divide a autoria desta obra com Tomás Cabreira Júnior, seu colega do Liceu Camões em Lisboa. O fato de hoje podermos ler esta peça deve-se a um acaso. Dos dois colegas e autores da peça AmizadeTomás Cabreira Júnior era o único dos dois que tinha os manuscritos. Por qualquer motivo era Sá-Carneiro quem os tinha consigo aquando do suicídio de Tomás Cabreira Júnior, que antes de cometer tal ato destruiu toda a sua obra.

Princípio (1912)[editar | editar código-fonte]

No ano de 1912, o autor dá à estampa um conjunto de novelas que reúne sob o título Princípio.

A Confissão de Lúcio (1914)[editar | editar código-fonte]

Inaugurando um estilo até então em si desconhecido, o romance, Mário de Sá-Carneiro publica, em 1914[10]A Confissão de Lúcio. A temática desta obra gira em torno do fantástico e é um óptimo espelho da época de vanguarda que foi o modernismo português.

Dispersão (1914)[editar | editar código-fonte]

O ano de 1913 veio a revelar-se de uma pujança criativa inigualável. Não só variou dentro da prosa, como apresenta ao público a sua primeira obra de poesia: Dispersão. Esta obra é composta por doze poemas e a sua primeira edição foi revista quer pelo autor quer pelo seu grande amigo, e também poeta, Fernando Pessoa.

Céu em Fogo (1915)[editar | editar código-fonte]

Em 1915, volta a reunir novelas, mais precisamente oito, num volume a que dá o título de Céu em Fogo. Estas novelas revelam igualmente as mesmas perturbações e obsessões que já a sua poesia expressava.

Obras Póstumas[editar | editar código-fonte]

Nem tudo aquilo que Sá-Carneiro produziu em vida veio a ser publicado, ainda que muitas coisas, além dos seus livros, tenha deixado espalhadas pelas publicações em que participou, como as revistas Orpheu ou Portugal Futurista.

Indícios de Oiro (1937)[editar | editar código-fonte]

Do qual Mário de Sá-Carneiro não chegou a publicar em vida Indícios de Oiro, publicada em 1937 pelas Edições Presença, é o conjunto de trabalhos seus mais significativo do conjunto da sua obra.

Correspondência[editar | editar código-fonte]

A sua correspondência com outros membros do Orpheu foi também reunida em volumes póstumos: Cartas a Fernando Pessoa (2 vols., 1958-1959), Cartas de Mário de Sá-Carneiro a Luís de Montalvor, Cândia Ramos, Alfredo Guisado e José Pacheco (1977), Correspondência Inédita de Mário de Sá-Carneiro a Fernando Pessoa (1980).

Obra poética. Poesia completa, incluindo os primeiros poemas e poemas dispersos[editar | editar código-fonte]

Edição e organização por António Quadros. Sintra: Publicações Europa-América, 1985.

Antologia poética[editar | editar código-fonte]

Edição literária de António Gonçalves. Ilustrações de Tiago Manuel. Matosinhos: Kalandraka, 2012, coleção Treze Lunas.

Correspondência com Fernando Pessoa[editar | editar código-fonte]

Edição e notas por Teresa Sobral Cunha. Lisboa: Relógio de Água, 2003, 2 vol.

Traduções[editar | editar código-fonte]

De Sá-Carneiro existe ainda uma tradução da peça Les Fossiles, de François de Curel, em parceria com António Ponce de Leão.

Em outras linguas[editar | editar código-fonte]

  • «Poemes». En Poesia gallega, portuguesa i brasilera moderna. Traducció de Josep Maria Llompart. Barcelona: Edicions 62-La Caixa, 1988, pàgs. 53-57.
  • Prémices. Dominique Touati (tr.). Paris: La Différence, 1994.
  • Ciel en feu. Dominique Touati (tr.). Paris: La Différence, 1987; 2e éd. 1990.
  • La Confession de Lúcio. Dominique Touati (tr.). Paris: La Différence, 2000.
  • Quasi e altre poesie. Traduzione e cura di Alessandro Ghignoli. Pistoia: Via del Vento, 2003.
  • Poésies completes. Traduit par Dominique Touati et Michel Chandeigne; préfacé par Teresa Rita Lopes, avec un texte de Fernando Pessoa et les dernières lettres à lui adressées par Mário de Sá-Carneiro. Paris: La Différence, 2007, col. Minos.
  • Lettres à Fernando Pessoa. Traduction de Jorge Sedas Nunes et Dominique Bussillet, Falaise: Impeccables, 2015.
  • Poesía completa. Traducción y prólogo de Manuel Vicente Rodríguez. Valencina de la Concepción: Renacimiento, 2016, col. Traducciones 25.
  • Poesia completa. Cartes a Fernando Pessoa. Traducció i introducció de Vicent Berenguer. Gandia: Lletra Impresa, 2017, col. Rara Avis 4.

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