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POR NICOLAU SANTOS
Diretor-Adjunto
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20 de Janeiro de 2017 |
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Hoje é o primeiro dia da III Guerra
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Bom dia. Este é o seu Expresso Curto sem nenhum açúcar. E, por isso mesmo, amaríssimo.
Hoje toma posse como 45º Presidente dos Estados Unidos o multimilionário Donald Trump. E se cumprir tudo o que já prometeu até agora, iniciamos hoje mesmo a contagem decrescente para a III Guerra Mundial. Quanto à guerra mundial económica, essa já começou.
Parece-lhe tremendista? Bom, então veja o que Trump já disse sobre a China. Já criticou a política militar e cambial do Império do Meio. Já acusou os chineses de roubarem um drone norte-americano. Já ameaçou aplicar pesados impostos aos produtos chineses. Já disse que o aquecimento global é um mito inventado por Pequim para prejudicar a competitividade da indústria norte-americana. Já falou com a Presidente de Taiwan, o que nunca nenhum Presidente norte-americano tinha feito desde 1979, quando a China e os Estados Unidos reataram relações e Washington reconheceu que a ilha faz parte integrante do gigante asiático – e uma delegação de Taiwan estará na sua posse. E o que pensar das palavras de Rex Tillerson, o homem que vai comandar a diplomacia norte-americana, segundo as quais o acesso da China às ilhas artificiais equipadas com sistemas de defesa anti-aérea que está a construir no Mar do Sul “já não vai ser permitido”?
Chega-lhe para perceber que Trump elegeu a China, segunda maior economia mundial e a grande potência emergente do séx. XXI, como o inimigo a combater? Chega-lhe para perceber que os equilíbrios geoestratégicos em que assentou o mundo no pós-II Guerra Mundial vão implodir? É que há mais. Trump coloca em causa a importância da NATO, desvaloriza as Nações Unidas, disse que vai mudar a embaixada americana de Telavive para Jerusalém, quer que os europeus paguem muito mais para assegurar a sua defesa, prepara-se para rasgar o acordo nuclear que o Irão assinou com EUA, União Europeia, China e Rússia e pretende que o México suporte o custo de 25 mil milhões de dólares do muro que ele prometeu construir na fronteira entre os dois países. No plano económico, os EUA serão muito menos solidários com o mundo e muito mais virados para dentro. Além disso, Trump nega as teses do aquecimento global, vai anular os constrangimentos sobre a indústria de carvão e abrir áreas até agora protegidas à exploração de petróleo e gás de xisto através do “fracking”.
É que se chama virar de pernas para o ar o mundo que conhecemos até agora. O novo habitante da Casa Branca vai adotar políticas protecionistas e unilaterais, rasgar acordos internacionais e definir novos aliados e inimigos, deixando cair o papel dos Estados Unidos de garante da ordem internacional saído da II Guerra Mundial. O mundo que aí vem será muito diferente. Não há uma única razão para acreditar que será melhor. E tudo começa hoje às 12h00 na capital norte-americana, 17h00 de Lisboa.
Já agora, Internamente, oito em cada dez americanos pensa que o país está profundamente dividido, tanto como desde a guerra civil. Ontem, já houve uma grande manifestação em frente à Trump Tower, em Nova Iorque. Hoje está prevista uma manifestação reunindo milhares de pessoas em Washington, durante as cerimónias de posse. |
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OUTRAS NOTÍCIAS O Iraque vai retirar o seu embaixador de Portugal, depois de as autoridades de Bagdad terem decidido não levantar a imunidade dos filhos do seu representante diplomático, que, como é conhecido, estão envolvidos num caso de agressão a um jovem português em Ponte de Sôr em agosto do ano passado. A decisão evita o incómodo de Lisboa ter de declarar o embaixador “persona non grata” – ou, quiçá, de tomar outra atitude mais drástica, que os descendentes de Viriato e Sertório não são de levar desaforo para casa. Entretanto, o embaixador já tinha acordado em pagar 12 mil euros relativos aos tratamentos hospitalares de Ruben Cavaco, além de mais 40 mil por danos morais. O Presidente da República, como não podia deixar de ser, também botou faladura, concordando com as palavras do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva – o diplomata iraquiano não tinha condições para continuar em Portugal.
A entrevista que Marcelo Rebelo de Sousa vai dar à SIC no domingo já provocou um dano colateral. É a primeira entrevista do Presidente da República após a sua eleição, há um ano, e passará no "Jornal da Noite". Marques Mendes, o comentador dominical da estação, vai antecipar o comentário para sábado.
É cada vez mais certo que a Taxa Social Única vai ser chumbada no Parlamento. Por isso, hoje o Presidente da República reúne com as associações patronais e na segunda com as centrais sindicais, numa derradeira tentativa para salvar o acordo de concertação social. Na ordem de trabalhos, um único tema, a TSU que, segundo o Jornal de Negócios, “arrisca ser o primeiro de muitos choques” entre os partidos que apoiam a atual solução governativa. O Diário de Notícias confirma: “Esquerda chumba qualquer alternativa à descida da TSU”. O i acrescenta: “Murro na mesa na TSU deu nova vida a Passos no PSD”.
A situação não escapou ao socialista Francisco Assis, que andava muito calado. Agora não perdeu o ensejo, ele que sempre foi contra a atual solução governativa: “É um sintoma muito nítido que o Governo a três acabou”, que cada vez vai haver mais instabilidade e que será necessário recorrer a eleições a curto prazo. Pedro Nuno Santos saiu-lhe ao caminho, afirmando que “Assis tem muita ânsia de mostrar que tinha razão” e convidando-o a debater o tema na sede do PS no Largo do Rato, recusando quer eleições antecipadas quer uma moção de confiança. Assis retorquiu, dizendo que Pedro Nuno Santos está “colonizado mentalmente pelo BE”. Pedro Nuno Santos lamenta “insultos”.
O primeiro-ministro esteve em Davos e veio de lá muito feliz. Encontrou no corredor a senhora Lagarde e ela fez aquela cara de quem não se lembra de onde é que o conhecia. O certo, contudo, é que António Costa entrou com ela para um gabinete (honi soit qui mal y pense…) mais os respetivos assessores e depois divulgou a boa nova ao mundo: "a primeira mensagem foi de congratulações" por Portugal ter tido "um resultado surpreendente para aquilo que eram as previsões iniciais do FMI" e pelo trabalho desenvolvido pelo executivo "não só para a consolidação orçamental, mas também para a criação de emprego, para o crescimento económico e para a estabilização do sistema financeiro". Ena! A Christine estava no dia em que é contra a austeridade!
A OCDE é que parou no tempo. Num balanço sobre as “Reformas no Mercado Laboral em Portugal 2011-2015”, divulgado esta ontem em Lisboa, a organização volta a insistir, não obstante as 450 medidas postas em prática pelo Governo PSD/CDS, à média de três por semana, na necessidade de flexibilizar ainda mais os despedimentos (coisa que já nem os patrões exigem e que o disparo do desemprego demonstra que não é nenhum obstáculo intransponível nesta matéria) e manifesta-se contra o aumento do salário mínimo, que considera demasiado elevado para a competitividade das empresas portuguesas. Mas depois dá uma mãozinha ao Governo e admite que a redução da Taxa Social Única para compensar subida do salário mínimo “ganha relevância” quando se discutem os 600 euros em 2019.
O México entregou ontem às autoridades dos Estados Unidos o líder do cartel de droga de Sinaloa, Joaquim "El Chapo" Guzman, depois de o Tribunal Superior do México ter recusado os recursos interpostos pelo seu advogado, nos quais o narcotraficante se opunha à extradição, anunciaram as autoridades mexicanas, em comunicado. Talvez por causa disto Trump faça um desconto no preço do muro…
Milhares de pessoas saíram ontem às ruas de Banjul, capital da Gâmbia, para celebrar a tomada de posse do Presidente Adama Barrow, que decorreu em Dacar, Senegal, e a entrada no país de uma coligação regional militar. A coligação regional militar pretende obrigar o chefe de Estado cessante, Yahya Jammeh, a deixar o poder. Segundo testemunhas dos festejos, uma multidão de cidadãos superou o medo de uma possível repressão do ditador e expressou a sua alegria perante o final de 22 anos de regime autoritário.
Cerca de três dezenas de pessoas podem ter morrido dentro do hotel Rigopiano, numa estância de esqui na região italiana de Abruzzo, soterrado por uma avalanche de neve.
O magistrado brasileiro Teori Zavascj, relator da operação Lava Jato no Supremo Tribunal de Justiça, faleceu ontem, quando o pequeno avião em que se deslocava se despenhou no mar de Paraty, na Costa Verde do Rio de Janeiro, provocando quatro mortes. O presidente brasileiro, Michel Temer, decretou três dias de luto oficial.
O ator Miguel Ferrer, que integrou o elenco da série "NCIS (Investigação Criminal): Los Angeles" morreu sua casa, em Los Angeles, aos 61 anos, foi ontem anunciado. Na séria participa a atriz portuguesa Daniela Ruah.
O frio veio para ficar, pelo menos até domingo. Ontem nevou em Tavira e em Vila Real de Santo António, onde tal não acontecia há 63 anos. É por estas e por outras que o Trump diz que o aquecimento global é uma mentira inventada pelos chineses…
Se puder, hoje evite ir aos hospitais. É que os trabalhadores de saúde estão em greve durante todo o dia. A greve, contudo, não abrange nem médicos nem enfermeiros. Consultas e cirurgias podem ser afetadas. Os trabalhadores exigem o cumprimento dos horários de 35 horas, a admissão de novos profissionais (cerca de cinco mil a seis mil a nível nacional) e a negociação das carreiras.
O novo bastonário da Ordem dos Médicos é Miguel Guimarães, urologista, 54 anos, que defende uma “participação ativa” da instituição na definição das políticas públicas para o setor.
Finalmente, sobre a crise no Sporting, os jornais desportivos dividem-se. Para A Bola, “é cada vez mais fria a relação entre Jorge Jesus e Bruno de Carvalho” e o “técnico vai pedir esclarecimentos sobre a perda de poderes”. Ao contrário, o Record diz que os dois estão “Juntos até ao fim” e que o presidente convidou inclusive o treinador para a sua comissão de honra de recandidatura ao cargo. As eleições decorrem a 4 de março. O jornal garante ainda que “ao contrário do que circulava ontem nos bastidores, Vítor Pereira e Pedro Martins não foram equacionados” para substituir Jesus. Contudo, O Jogo garante que Vítor Pereira é o favorito para suceder a Jesus. Mas a notícia verdadeiramente inquietante para todos os sportinguistas é outra: o defesa-central Coates estará a caminho do Benfica, que já terá um acordo com o Sunderland e com o agente do jogador uruguaio com base num contrato por cinco anos e um salário anual de 1,4 milhões de euros anuais por época.
FRASES “O Iraque comunicou que retira o embaixador de Lisboa. Não preciso de saber mais nada: nem o dia ou a hora do voo. Apenas preciso de saber que o embaixador é retirado de Lisboa. Naturalmente, não tem condições para permanecer”. Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros, fazendo voz grossa a Bagdad.
“[A discussão em torno da descida da Taxa Social Única] é um sintoma de que o governo a três acabou”. Manuela Ferreira Leite no seu comentário na TVI. Mas talvez as notícias da morte da atual situação governativa sejam um pouco exageradas. Aguardemos os próximos capítulos.
“Quando a marcha do progresso parecer lenta, lembrem-se: a América não é o projeto de uma única pessoa. A palavra mais poderosa da nossa democracia é a palavra ‘nós’. Nós, o povo. Nós vamos vencer. Sim, nós podemos”. Barack Obama na sua carta de despedida ao povo americano, deixando em muita gente em todo o mundo com uma lágrima no canto do olho.
“Soberbamente organizados e bem dirigidos, os insurrectos apanharam de surpresa o Governo. As forças leais ao Governo ofereceram pouca resistência (…)”. Henry Kissinger, secretário de Estado norte-americano, num memorando escrito a 29 de abril de 1974 para o Presidente Richard Nixon sobre o golpe de Estado que em Portugal derrubou a ditadura – e num surpreendente elogio a Otelo, Salgueiro Maia e aos capitães de Abril.
“A indústria automóvel dos Estados Unidos teria um mau despertar se todas as peças fornecidas, que não são fabricadas nos Estados Unidos, chegassem subitamente com uma taxa de 35%. Eu acredito que tornaria a indústria automóvel dos Estados Unidos mais fraca, pior e sobretudo mais cara. Eu esperaria até ver o que o Congresso tem a dizer quanto a isso, tendo em conta que está cheio de pessoas que pretendem o oposto de Trump”. Sigmar Gabriel, vice-chanceler alemão, mostrando que a Alemanha vai ser um osso duro de roer para os dentes de Trump, Bild.
O QUE FUI OUVIR. E O QUE ANDO A LER. O maestro e pianista João Balula Cid, 59 anos, morreu na madrugada de terça-feira em Lisboa, no Hospital da Luz. Dono de uma enorme sensibilidade e dum imenso talento, o João foi uma presença regular nos ecrãs televisivos, tendo participado em inúmeros programas. Em 2008, por falta de trabalho em Portugal, emigrou para a Noruega onde trabalhou numa empresa que produzia caras de bacalhau. Exigiu, contudo, que lhe pusessem à disposição um piano. Essa situação motivou que fosse capa da revista do Expresso, contando a sua aventura e falando sobre os temas que compôs, ainda não editados em disco. Balula Cid atuou em Portugal, Canadá, EUA, México, Espanha, França, Bélgica, Países Baixos, Luxemburgo, Itália, Suécia, Noruega, Inglaterra, Rússia, Cazaquistão, Região Especial de Macau, Timor-Leste, Austrália e Alemanha, onde, entre 1991 e 1992, foi diretor musical e pianista no Hotel Kempinski em Berlim. Vale a pena ouvir muitos dos discos que editou.
Quanto a leituras, ando a ler ora a biografia de Estaline, que o Expresso está a editar, ora “A gorda”, de Isabela Figueiredo. No primeiro caso, fica-se a saber pelo primeiro volume aquilo que acontece em todas as ditaduras: o líder acaba sempre rodeado pelos tipos mais mesquinhos e desprezíveis. Também se fica a saber que Estaline tinha um braço mais curto, que a sua mulher Nadia era provavelmente bipolar ou sofria de perturbações psíquicas e que ele tinha muitas dores de dentes. Não é um bom cocktail. Com as condições históricas ideais só podia dar no que deu: mais de dez milhões de camponeses deslocados ou mortos pela fome e pelo frio, milhares de supostos adversários fuzilados ou mandados para os goulags e um país economicamente devastado por políticas totalmente erradas. No caso de “A gorda”, recomendo vivamente que se comece pelo anterior livro de Isabela Figueiredo “Caderno de Memórias Coloniais”: agarra-nos do princípio ao fim, fica-se sem fôlego e não se larga o livro até ele acabar.
E pronto, está servido “o” Expresso Curto de 20 de janeiro de 2017, o dia em que Donald Trump toma posse como 45º presidente dos Estados Unidos e o mundo começa a dar passos para uma enorme catástrofe. Como é óbvio, espero bem estar enganado. Mas os sinais estão todos nas estrelas.
Até lá, contudo, agasalhe-se, aproveite o fim de semana para ler, descansar e conviver e pense que ainda vamos ter saudades desta vida tranquila que tivemos nos últimos 40 anos. Tenha um excelente fim-de-semana.
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