quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Entrevista do advogado de José Sócrates ao jornal "I" - 5 de Fevereiro de 2015


Jornal i

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Advogado de Sócrates garante que não é do Partido Socialista. As suas inclinações políticas “são à esquerda disso”
Chegou à porta do seu escritório, na Rua Pinheiro Chagas, cinco minutos depois da hora combinada e fez logo um aviso: “Surgiram-me circunstâncias novas sobre este caso e por isso não posso demorar muito”. Mas a “meia dúzia de respostas” de João Araújo acabou por se transformar numa entrevista de mais de uma hora. Enquanto citava Eça de Queiroz e Pinto Monteiro, criticou o Ministério Público, os jornalistas e disse que Sócrates nunca se adaptaria à natureza passiva do cargo de Presidente da República. Desta vez não usou qualquer ironia, mas confessou que a utiliza como defesa. Em algumas dessas situações, o que lhe apetecia mesmo era gozar com o interlocutor.
A ministra da Justiça diz que fala ao telefone como se estivesse a falar para um gravador. Foi esse cuidado que faltou a José Sócrates?
Não vejo assim. Acho que existe um abuso das escutas telefónicas em Portugal. Falar ao telefone em Portugal deixou de ser uma forma de comunicação e passou a ser uma forma de divulgação. Isso diz respeito ao meu cliente, à senhora ministra da Justiça – pelos vistos – , diz respeito a mim e à generalidade dos cidadãos. É uma questão que tem de ser vista com muito cuidado. Está a perder-se o direito à privacidade.
A ministra disse também não perceber o porquê de nos crimes fiscais a inversão do ónus da prova não incomodar ninguém mas o mesmo não acontecer quando se trata de enriquecimento ilícito...
Eu li isso, mas isso não corresponde à verdade. Não há inversão do ónus da prova em crime nenhum. Deve ter havido algum mal-entendido, porque eu não acredito que a senhora ministra não saiba o que diz.
Paula Teixeira da Cruz disse ainda não ter ficado surpreendida com a detenção de ex-políticos…
A senhora ministra, não sei com que é que se surpreenderá. Suponho que se amanhã fosse detido um membro do seu partido, do seu governo ela não ficaria nada surpreendida. Ou ficaria? Não sei. As surpresas são fruto das nossas convicções ou inclinações. Ela não ficou surpreendida… É um facto que este massacre a José Sócrates não é de agora, a detenção é apenas um episódio. Qualquer pessoa neste país que tenha 15 anos ouviu sempre falar mal de José Sócrates, é natural que para uma quantidade enorme de pessoas, depois deste massacre, vá formando convicções.
O juiz da Relação de Lisboa que vai decidir o recurso de José Sócrates publicou um artigo no Facebook onde defendia Carlos Alexandre. Acha que os juízes deviam ter mais cuidado quando…
Quando falam ao telefone? (risos)
Não, quando tornam públicas, mesmo que em redes sociais, algumas matérias pessoais?
Todos nós temos direito às nossas opiniões, juízes e advogados também. Divulgá-la vai de cada um. Não creio que o senhor desembargador tenha elogiado o douto Carlos Alexandre, ainda que isso valesse alguma coisa. O que terá acontecido é que partilhou esse artigo elogioso. Ainda não vi, mas não será razão para se fazer um caso disso.
Em entrevista ao i , o advogado de João_Perna admitiu a possibilidade de ter havido transporte de dinheiro ao dizer que levar dois ou dez mil euros num envelope fechado é uma “coisa muito fininha”. Como viu essas declarações?
Não comento declarações de colegas nem de juízes. Eu nunca vi um maço de notas, nem grosso nem magro.
Mas há declarações da defesa de Perna que são contrárias àquilo que o senhor defende. Uma delas é a de que em Portugal não se prende para investigar…
Cada um de nós faz o melhor que pode pelos seus constituintes.
Neste tipo de casos estabelecem-se pactos entre as defesas?
Entre nós não há tendências para pactos, não usamos esses expedientes. Eu nunca usei…
Tem repetido que há muitas coisas que chegaram aos jornais que nunca deveriam ter sido conhecidas. O que é que já se devia saber sobre o seu cliente que ainda não se sabe?
Nada. E de facto não deveria ter saído nada do que saiu.
Do que já se conhece, Carlos Santos Silva terá referido em interrogatório que pagou motorista, casa e entregava dinheiro a José Sócrates. Como é que se pode explicar ao cidadão comum a entrega de montantes desta grandeza?
Conheço algumas coisas que dizem ser declarações do engenheiro Carlos Santos Silva. Ninguém tem de dar satisfações a ninguém sobre o que se passa na sua vida privada, muito menos em sede criminal. Se os factos em causa forem criminais, indiciários, poderemos falar sobre esse assunto. Mas por enquanto, tendo em conta o estado da ciência em que estou, para além de não saber se essas declarações existem, eu não posso comentar.
Mas houve entregas dinheiro, alegados empréstimos. Porque é que o dinheiro não ia para a conta de Sócrates? Para não levantar suspeitas?
Não, aparentemente creio que não. Nunca me pus a pensar muito sobre esse assunto.
No interrogatório, Sócrates foi confrontado com as suas ligações ao Brasil e à farmacêutica Octapharma?
Não. Esse é um assunto pacífico. Nunca isso foi alvo de qualquer…
Mas foi confrontado com a possibilidade de o seu salário ser dinheiro que saía das contas de Santos Silva…
Isso não é verdade.
O alegado esquema de circulação de dinheiro entre Carlos Santos Silva e uma offshore de Lalanda de Castro não foi um dos dados com que Sócrates foi confrontado no interrogatório?
Ah, sim, no interrogatório, falou-se nisso…
Já que se falou no Brasil, alguém do governo daquele país ou do Partido dos Trabalhadores (PT), nomeadamente Lula da Silva, ligou para a cadeia de Évora?
Não sei. As chamadas que o engenheiro José Sócrates faz devem ser poucas, porque ele tem a sua comunicação completamente restringida…
Apesar dessas restrições, Sócrates fala consigo quando o visita. Alguma vez, em desabafo, lhe disse o que mudaria na Justiça se voltasse a ser primeiro-ministro?
Nunca me comentou isso. Por acaso é um assunto que eu gostaria de conversar com ele, mas tenho tido tão pouco tempo. E é uma pergunta que é um pouco indiscreta para fazer a quem está preso. Perguntar-lhe nesta fase do campeonato o que é que ele faria se fosse primeiro-ministro para melhorar tudo aquilo de que se queixa seria uma pergunta desleal. As nossas conversas cingem-se ao processo…
O i noticiou há dias que o único facto que poderia indiciar o crime de corrupção e com o qual Sócrates foi confrontado foi a conversa com o vice-presidente de Angola Manuel Vicente. Confirma?
Há muitos factos, mas o único que é expressamente relacionado com corrupção é de facto esse.
Foi já várias vezes referido que José Sócrates teria cerca de 23 milhões em nome do amigo Carlos Santos Silva e houve notícias que adiantaram que a defesa não o negava…
É evidente que no recurso a defesa diz que não é verdade que o dinheiro seja dele. O que se passa é que num recurso analisamos todas as hipóteses. E terminámos com um exercício que partia do seguinte cenário: “Ainda que isso fosse verdade, só por hipótese, que o dinheiro fosse de Sócrates…” Mas sempre negámos que os milhões sejam dele.
Tem noção se o montante total entregue por Santos Silva a Sócrates são vários milhões?
Não, não, não. De modo nenhum. Nem pensar nisso.
Mas teria de haver algum registo dos montantes entre eles ou o acerto seria feito por alto?
Não sei, só sei que não são os milhões de que se fala para aí, nem nada que se pareça…
Sócrates sabia que Santos Silva tinha estes 23 milhões?
Suponho que a fortuna do senhor engenheiro Santos Silva seja muito superior a 23 milhões. Não sei se o meu cliente tinha noção deste valor. Antes de ele ser detido nunca falei com o senhor engenheiro José Sócrates sobre o seu amigo. Não conheço as fortunas das pessoas, sei que o engenheiro José Sócrates tinha noção de que Santos Silva era uma pessoa rica. Mas os montantes e a origem dessa riqueza, pelo menos comigo, nunca falou. E não suponho que ele saiba.
Quando é que Sócrates previa pagar esse empréstimo?
Não sei, isso é uma coisa que eles devem ter combinado entre si.
Confirma que aquele dinheiro encontrado dentro de um cofre, num banco, era de Santos Silva?
Já se sabe que é mentira. É uma aldrabice como outra qualquer, como as malas de Paris… É factualmente mentira.
O senhor foi ter com o seu cliente a Paris no dia da detenção…
É verdade, fui ter com ele a Paris no dia em que ele foi detido.
Mas não voltaram juntos para Lisboa. Porquê?
Tinha o meu voo de regresso marcado numa companhia modesta, à minha altura, e o senhor engenheiro veio na Air France.
Qual o motivo dessa deslocação?
O facto de ter havido buscas a casa do filho dele e da ex-mulher dele, bem como o facto de terem sido detidos o motorista e Carlos Santos Silva.
Como estava Sócrates quando o encontrou em Paris?
Não estava receoso, estava determinado. Como sempre…
Lembra-se do que ele lhe disse?
Lembro-me, mas não posso reproduzir…
Nem uma frase, que demonstre essa determinação?
Há uma coisa. Penso que posso reproduzir, sem sentir que violo o dever de confidencialidade. A uma dada altura ele virou-se para mim e disse: “Eu fui primeiro-ministro, se não for eu a respeitar as instituições quem é que as vai respeitar?!”
Se fosse advogado de Sócrates antes desta investigação tê-lo-ia aconselhado a não ter algumas atitudes que pudessem vir a ser consideradas suspeitas?
A minha preocupação neste caso nunca foi saber o que é que o engenheiro Sócrates deveria ter feito. Não posso dizer que se soubesse o que sei hoje teria aconselhado isto ou aquilo. Mas não creio que tivesse aconselhado nada de especial.
Foi substituído durante algum tempo por Pedro Dellile. Estão ambos a trabalhar neste processo?
Ninguém substitui ninguém. Trabalhamos solidariamente. Cada um faz o que combina com o outro.
Sócrates acompanha, na prisão, o que se escreve e diz sobre a Operação Marquês?
Ele tem apenas acesso aos quatro canais abertos.
Como é que ele olha para o homem que é descrito todos os dias nos noticiários?
Acho que ele não se preocupa muito com isso. Não penso que ver televisão seja a ocupação principal dele. Sobre ele, fala-me pouco.
Ainda assim, dá mais atenção às notícias que o doutor?
Entre mim e o engenheiro José Sócrates há uma diferença enorme. É que ele tem de se preocupar com os jornais e eu não.
Actualmente José Sócrates acha-se presidenciável?
Essa é uma questão a que não posso responder. Ainda eu não era advogado de José Sócrates e fiz-lhe essa pergunta, se ele quereria ser presidente da República, e ele respondeu-me: “Você é maluco!” Não o estou a ver com tal vontade, o perfil dele não se coaduna com a natureza passiva do cargo de presidente da República.
A prisão pode matá-lo politicamente?
Não faço ideia. Não sou do Partido Socialista nem nunca fui. As minhas inclinações políticas são à esquerda disso, não tenho grandes simpatias pelo PS. Não lhe posso mesmo responder, posso é pôr-me no lugar das pessoas. E, como dizia o Eça de Queiroz: “Procurar ser ministro? A minha vaidade nunca me permitiria descer a tanto.”
E alguma vez lhe disse quem é que gostaria de ter recebido na prisão?
Não é matéria das nossas conversas, sobre estados de alma e essas coisas não falamos…
As conversas que têm são frias?
Completamente. Completamente secas, só falamos do processo. Foi uma imposição que impusemos um ao outro e a cada um em particular. Acordámos que temos de manter essa relação…
Não há amizade?
Não. Entre advogado e cliente não há amizade. Quando o processo estiver terminado voltarei à minha amizade com o engenheiro José Sócrates.
É possível ligar e desligar uma amizade?
Se não for possível, se não nos conseguirmos afastar das nossas afectividades, não conseguimos ser advogados. E aí o melhor é dizer ao nosso cliente: “sou muito teu amigo por isso não posso ser teu advogado”. É como ser médico. Quando entro num processo é-me completamente indiferente o que sinto pela pessoa que defendo, gosto de pensar que só me preocupo em representar a Justiça e o Direito.
Já tiveram pontos de tensão?
Até agora não encontrei nenhum, mas mais tarde, quando pudermos, faremos um balanço. Eu não tenho nenhuma relação especial com o engenheiro José Sócrates. É evidente que somos amigos, mas não somos amigos chegados nem nada que se pareça…
Defende que o seu cliente não deveria estar em prisão preventiva, era preferível estar preso em casa?
Não, de modo nenhum. Aqui não há preferências. Preferir a morte por enforcamento à morte por fuzilamento?! Não. Se não há nenhuma razão para estar preso, não há razão para estar preso.
Mas a obrigação de permanência na habitação é uma medida de coacção menos pesada…
Não vejo que o senhor engenheiro José Sócrates se sujeitasse a uma coisa dessas. Não vejo. Andar com uma anilha?! Nem os pombos… Não acredito, mas isso é uma questão dele. Eu, pessoalmente, nunca toleraria uma coisa dessas. Não me ponham a escolher entre duas prisões porque eu não quero a prisão.
É muito crítico da comunicação social. Não acha normal que a detenção e prisão de um ex-primeiro-ministro desperte uma grande atenção mediática?
Aquilo de que me queixo não é das notícias. É do facto de serem tendenciosas e mal informadas. Normalmente com desprezo pela verdade, porque não são factuais, são opinativas. O caso justifica ser amplamente divulgado, o problema é que as notícias visam a destruição, a degradação de uma pessoa e isso aborrece-me. Muito do que foi dito é crime mas eu agora não tenho tempo de me ocupar disso. A seu tempo... Talvez seja pela minha idade, mas fui educado por um outro código, que já não vigora.
Que código?
O de que não se bate numa pessoa que está caída, não se goza com um preso, não se brinca com um doente, não se ri de um soldado coxo na formatura. Foi o que aprendi. Mas o que assisto é a um bacanal contra uma pessoa que está presa e não se pode defender. Está sujeito a toda a maledicência, à fantasia, a falsidades e algumas coisas verdadeiras, mas não tem possibilidade de se defender.
Acha que na hierarquia do Departamento Central de Investigação e Acção Penal tem havido conivência com a violação do segredo de justiça?
A violação do segredo de Justiça é um crime. Como é ao Ministério Público que compete perseguir os criminosos e eu não tenho visto grande sucesso nisso, não digo que haja um conivência, mas há, pelo menos, uma tolerância evidente. Esses factos são criminosos…
Alarga essa tolerância à Procuradora-Geral da República?
Como dizia o ex-procurador-geral da República da República (PGR), o doutor Pinto Monteiro, o PGR em Portugal acaba por ser uma rainha de Inglaterra.
Como vê a actuação de Rosário Teixeira e Carlos Alexandre neste processo? O doutor já apontou o dedo a estes magistrados…
Eu referi-me já a um editorial, umas declarações do director do “Jornal de Notícias”. Falei sobre as declarações desse jornalista porque me parecem graves, mas não fui eu que apontei o dedo. Quanto aos magistrados, fazem o seu trabalho…
Mas considera que as fugas partem da investigação?
Partiram certamente do lado da investigação, do lado do tribunal, da Procuradoria… Se surgem de repente noticias que mais tarde se vêm a confirmar… É como a história do pato: se anda como um pato, se faz qua-qua, se calhar é pato.
Acha que tem sido passada contra-informação?
Sei de factos objectivamente falsos, inegavelmente falsos, que foram usados. Houve coisas que foram noticiadas – como as malas de Paris e o luxo de Paris – que serviam apenas para a destruição e degradação pessoal.
Mas acha que a Procuradora-Geral deveria ter um papel mais activo?
Eu não sei se a senhora procuradora está a feliz ou infeliz com o que está a acontecer ao nível da violação sistemática do segredo de justiça. Penso que no caso dela será mais uma questão de estado de alma, porque ela tem poucos poderes para intervir na matéria. E nem sei se quererá usar os poderes que tem. Tem de lhe colocar essa questão… Mas, o abandono do segredo de justiça é o abandono dos direitos das pessoas: da privacidade do bom nome, da presunção de inocência.
Acha que em Portugal a Justiça não funciona?
Pelo amor de Deus. Claro que funciona. De certeza. Tem é disfuncionalidades como tudo o que existe em Portugal.
Este é um caso de disfuncionalidades então?
De maneira nenhuma. De maneira absolutamente nenhuma. O sistema de justiça funciona. Poderia era funcionar melhor. Não tanto por causa das leis, mas por causa das pessoas.
Como assim?
A administração da Justiça corre o risco de ser posta ao serviço da política e isso é perigosíssimo. Não quer dizer que os juízes tenham de estar alheios ao mundo que os cerca – é, aliás, bom que estejam nesse mundo. Agora, esta excessiva inclinação de certos sectores da magistratura, mais notoriamente no MP para uma intervenção política directa e imediata parece-me extremamente perigosa, porque os afasta das condições de isenção. Mas não estamos numa fase em que possamos dizer que isto está tudo mal. A justiça funciona e os tribunais julgam – e julgam muito bem.
Então, considera que os problemas maiores estão no Ministério Público?
Sim, certamente. Penso que é o calcanhar de Aquiles da justiça criminal.
Neste processo esses problemas já o fizeram apresentar alguma queixa?
Não, ainda não me queixei, os factos são públicos e notórios. São crimes públicos.
Mas o seu cliente continua preso e o senhor já apontou várias situações que não considera normais…
Sim, mas por isso há um recurso que foi interposto, são factos da vida. É o direito a funcionar. Deveria funcionar melhor? Certamente! Mais rápido? Certamente! Agora não me posso queixar de uma qualquer prevaricação neste caso. Tenho é de recorrer da decisão.
O que acha que poderia ter sido diferente?
Acho que a decisão está mal tomada. Mas queixo-me é do longo tempo, são três meses de prisão e ainda não vi qualquer utilidade com a prisão preventiva.
Quais é que acha que são neste processo as principais fragilidades?
A complexidade maior está na obscuridade, na opacidade na explanação do Ministério Público dos factos. Eu tenho de me basear nos dados que o MP me apresenta, não me posso basear em outros. Do que o MP escreve e expõe não me parece que estejam especialmente bem clarificados os elementos do tipo criminal da fraude, do branqueamento nem da corrupção.
Os factos foram apresentados de forma genérica?
Não, foram apresentados de uma forma desligada, não concretizada e insuficiente.
As fugas de informação podem ter acontecido em sentido inverso? Por exemplo, no encontro com Pinto Monteiro, Sócrates pode ter tido conhecimento de alguma informação?
Acho que não, o doutor Pinto Monteiro já não era procurador-geral. Tenho muitas dúvidas que ele soubesse fosse do que fosse e tenho dúvidas que nesse almoço se tenha falado desses assunto.
Como vê as afirmações de Mário Soares, algumas delas muito críticas em relação à justiça portuguesa…
O doutor Mário Soares merece todo o respeito por ter sido Presidente da República e por mais coisas mais significativas e importantes que foi. É um homem de muita idade e quando se vai para a idade, e eu experimento isso, cada vez temos menos paciência. E cada vez mais temos tendência a abrandar as nossas cautelas pessoais. Cada vez menos atentamos nas nossas prudências.
Mas devemos então relativizar um pouco determinadas declarações?
Não, isso eu acho uma coisa completamente injusta. Adoptarem em relação ao doutor Mário Soares uma atitude de tolerância - “Coitadinho, está velho” – é de uma infantilidade e de uma injustiça profunda. Não é um velhinho gagá, é um homem com toda a plenitude das suas condições intelectuais, afectadas pela doença, mas que não lhe retira a lucidez e seriedade. Pode exprimir-se com maior ou menor contenção…
Mas como vê as declarações mais críticas à Justiça?
Vejo como o reflexo de uma profunda desilusão de um homem que se bateu por um Estado de Direito diferente do que temos. E devo dizer-lhe que nunca votei em tal pessoa, apesar de ter muitas oportunidades para votar. Nunca fui soarista, nunca fui do PS e politicamente nunca gostei do doutor Mário Soares. Mas não posso esconder a admiração pela obra, pelo que fez e pela vida dele.
Acha que este processo merece a intervenção do senhor presidente da República?
Não, é deslocado, é descentrado. O presidente da República – não este, este aqui nem pensar – o presidente da República que existe na Constituição não tem de se meter na justiça, assim como a justiça não tem de se meter na política.
Esta foi a primeira vez que abordou o caso sem usar ironia?
Não sou normalmente irónico. A ironia é alguma coisa que precisa de tempo e é boa quando não há respostas directas para as perguntas colocadas. Não sei se foi a primeira vez, o que lhe posso dizer é que, às vezes nessas entrevistas, me apetece gozar um bocadinho com o fulano do outro lado, porque está a precisar.
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ANTÓNIO FONSECA

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

SIC NOTÍCIAS - 4 DE FEVEREIRO DE 2015



Só li o primeiro parágrafo, mas achei piada a este belo "recorte" jornalístico:
<< o ex-primeiro-ministro nega também que nunca pensou em fugir e diz que (...) >>
Ora, se nega (o "também" é pormenor) que nunca pensou... o contrário de "nunca" é "pelo menos uma vez", de "nega" é "afirma", portanto a frase pode ser escrita como:
<< o ex-pm afirma também que já pensou em fugir (pelo menos uma vez) e diz que (...) >>
Claro que se trata de uma gralha, mas "das boas"; a frase pretendida seria "afirma também que nunca pensou" ou "nega também que alguma vez tenha pensado", enfim... são coisas do português tão bem tratado como o sr. na prisão, I guess..

José Sócrates garante nunca teve um milhão de euros escondido num cofre nem imóveis escondidos em fundos imobiliários. Em resposta a um conjunto de perguntas formuladas pela SIC, o ex-primeiro-ministro nega também que...
SICNOTICIAS.SAPO.PT
Não gosto ·  · 
  • Tu e 5 outras pessoas gostam disto.
  • Daniel Fonseca E pensar que eu ia só partilhar o seguinte ideia que ainda não vi ninguém endereçar, a propósito do "caso das botas" do senhor:

    Fez-me impressão como ou porque é que o Diretor do Estabelecimento Prisional tem que lhe pedir que entregue as botas; então
     se não são permitidas, como é que elas lhe foram parar aos pés? Já estou a imaginar o diálogo:
    - oh amigo, entregue por favor essa faca do mato porque os regulamentos não permitem a sua posse...
    - não dou e vou recorrer para o tribunal!
    - ah, está bem, então fique lá com ela e depois quando o tribunal decidir ajustamos contas, pode ser?
    4 h · Editado · Gosto
  • Jose Pedro Whiteman Esse jornalista não nega ter uma bela cunha.
    4 h · Gosto
  • Daniel Fonseca Acho que ele devia era negar também que nunca teve má nota a português..
    4 h · Gosto
  • António Fonseca




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20:51 03.02.2015

Todas as respostas de José Sócrates

Emílio Remelhe

José Sócrates garante: nunca teve um milhão de euros escondido num cofre nem imóveis escondidos em fundos imobiliários. Em resposta a um conjunto de perguntas formuladas pela SIC, o ex-primeiro-ministro nega também que nunca pensou em fugir e diz que não compreende o perigo de fuga alegado pelo juiz Carlos Alexandre para o manter em prisão preventiva. Acusa o Ministério Público de violar propositadamente o segredo de justiça, para o condenar antes do julgamento. Mais que isso, aponta o dedo a "invenções e mentiras". Leia aqui, na íntegra, as respostas de José Sócrates à SIC.

Tinha viagem marcada, de Paris para Lisboa, para quinta-feira. Mudou para sexta-feira à tarde e voltou a mudar para sexta-feira à noite. Como justifica estas alterações? Admite que possa ter levantado suspeitas à investigação?

Na 5ª feira, das 17 às 19 horas, participei num seminário académico na escola doutoral de Sciences PO. Essa foi a razão pela qual mudei o regresso de Lisboa de 5ª para 6ª feira. Já na 6ª feira, a alteração do meu voo de regresso a Lisboa deveu-se à deslocação do meu advogado a Paris para uma reunião comigo que não estava inicialmente prevista. Francamente, não percebo que suspeitas essas alterações possam justificar. A verdade é que eu voltei, não fugi! Quando vejo invocarem o "perigo de fuga" como um dos fundamentos da minha prisão preventiva o que me parece é que alguém está a esforçar-se muito para não ver o óbvio: eu vinha a entrar, não ia a sair! Se este fosse um processo normal, guiado pelo bom senso, qualquer suspeita, mesmo disparatada, sobre a minha alegada intenção de fugir teria morrido aí. A insistência nesse absurdo "perigo de fuga" mostra bem o espírito que anima esta investigação e as suas presunções. Vejam bem: ao invocarem o "perigo de fuga" como um dos fundamentos da minha prisão preventiva, o que os magistrados que dirigem este processo estão a dizer é que acreditam que havia um sério risco de ficar uma cadeira vazia no meu comentário semanal na RTP! Podemos avaliar a credibilidade da ideia fazendo um esforço para imaginar a cena, com o "pivôt" da RTP a anunciar: "Senhores telespectadores, esta semana não há comentário. O ex-primeiro-ministro, que costuma estar aqui todos os domingos, fugiu!". Mas há alguém de bom senso que possa acreditar numa coisa destas?! Nunca fugi de nenhuma dificuldade; sempre as enfrentei.

No dia da sua detenção o seu advogado enviou, de Paris, um email ao director do DCIAP. De que se tratava? Que consequência teve esse email?

Às 15h54 do dia 21 de novembro (horas antes da minha detenção à chegada ao aeroporto, com todo aquele espectáculo mediático), o meu advogado enviou um e-mail ao Diretor do DCIAP comunicando a minha vontade  de ser ouvido neste processo o mais rapidamente possível (depois das buscas em casa do meu filho e da notícia da detenção de pessoas que me são próximas não era preciso ser adivinho, nem ter informações privilegiadas, para calcular que havia um processo contra mim). O texto do e-mail diz expressamente: "ele (José Sócrates)... dispõe-se a comparecer (...) onde e quando for determinado para ser ouvido".
Isso mesmo foi reiterado pelo meu advogado por contacto telefónico no mesmo dia, tendo o Diretor do DCIAP garantido que iria transmitir imediatamente o pedido, por mensagem telefónica, ao Procurador Rosário Teixeira.

Estas diligências, obviamente, deitam por terra o que ainda pudesse restar da tese do "perigo de fuga". O que provam é o contrário: a minha inteira disponibilidade para colaborar com a Justiça e para vir ao processo prestar todos os esclarecimentos. O que é absolutamente extraordinário é que esse e-mail, enviado às 15h54 do dia 21, só tenha sido oficialmente recebido às 16h04 do dia 25, já depois de decretada a prisão preventiva, sustentada, entre outras, nessa alegação absurda do "perigo de fuga". Esse pequeno truque - ignorar o e-mail e sustentar o perigo de fuga - é muito revelador. Ainda estou à espera que o sr. Diretor do DCIAP se digne explicar o que se passou.

Tentou, de alguma forma, evitar ser detido à chegada a Lisboa?

À chegada a Lisboa foi-me imediatamente comunicada a minha detenção e nada podia ser feito para a evitar. Depois, foi aquele circo mediático que estava montado e que todos puderam ver. A verdade é esta: a minha detenção nada teve a ver com Justiça, mas com espectáculo. Não se tratou de cumprir um qualquer objectivo jurídico legítimo mas teatralizar politicamente uma acção judicial.

Retenho desses episódios um momento particularmente impressivo e significativo: a manifestação organizada por um Partido de inspiração fascista, ou nacionalista, cujos manifestantes ruidosamente aplaudiam as decisões do Juiz e do Procurador. Pela minha parte, eu, que nunca fui aplaudido por fascistas, o que vejo nestas decisões é um abuso. Um abuso das regras e do Direito. E, fiel à boa tradição democrática, considero o abuso contra qualquer cidadão uma ameaça aos demais.

A sua defesa tem insistido que não existem fortes indícios de crimes no processo. Mas há uma pergunta que toda a gente faz: será possível imaginar que a justiça prenda alguém sem provas minimamente sólidas? Ainda para mais se esse alguém foi um primeiro ministro deste país?

Compreendo bem a pergunta sobre se é plausível que as autoridades tenham prendido um ex-primeiro-ministro sem terem nas mãos provas minimamente sólidas ou sem possuírem pelo menos fortes indícios da prática de crimes. Mas a verdade é que foi isso que aconteceu. Bem sei que as pessoas tenderão a pensar: "se ele está preso, é porque alguma coisa deve ter feito". E é evidente que a investigação joga com isso e com as "fugas" selectivas ao segredo de justiça para obter a condenação antes mesmo da sentença. Mas é cada vez mais claro que neste caso se prendeu para investigar. O que aconteceu aqui foi uma total precipitação de quem estava tão cego pela sua intenção persecutória ou tão convencido da sua teoria e das suas presunções que avançou sem provas ou sequer fortes indícios de quaisquer crimes. Aliás, as próprias "fugas" ao segredo de justiça, apesar do enorme esforço dos jornais do costume, mostram que este processo assenta muito mais em teorias e presunções do que em provas e indícios concretos. É por isso que esta prisão preventiva é abusiva, desproporcionada e ilegal. A minha esperança é que se perceba que, neste caso, salvar a face da Justiça não é o mesmo que salvar a face do Ministério Público. Salvar a face da Justiça é ter a lucidez e a coragem de garantir, neste como em todos os casos, o respeito integral pelos direitos fundamentais e pelo Estado de Direito.

Enquanto Primeiro-ministro alguma vez tentou beneficiar empresas ou empresários com os planos de investimento lançados pelos seus Governos?
Em concreto, ajudou, de alguma forma, os negócios do Grupo Lena, mesmo depois de deixar o Governo? Se o fez recebeu algo em troca?

Nunca, em nenhuma circunstância, durante todo o tempo em que exerci funções governativas, tomei qualquer iniciativa, directamente ou através de terceiros, para favorecer as empresas do Grupo Lena ou do meu amigo Carlos Santos Silva. Não tenho nada que ver com a vida empresarial dele, ele nunca me pediu nada enquanto fui membro do Governo. A nossa relação fraterna é pessoal não é profissional.

Conheci os administradores do Grupo Lena como participantes em comitivas empresariais no contexto de visitas de Estado, em acções de diplomacia económica. Estive com eles, por essa altura, uma meia dúzia de vezes, sempre em encontros sociais. Tenho por eles e pelo seu grupo empresarial a maior consideração mas nunca, em todo o tempo em que fui membro do Governo, nem eles, nem ninguém por eles, me pediram seja o que for.

Aproveito para esclarecer, já que isso tem sido maldosamente referido, que o projecto do Grupo Lena de construção de casas na Venezuela foi integrado no convénio comercial celebrado entre Portugal e a Venezuela em 2010 nos mesmos termos em que o foram outros projectos pendentes de várias empresas. O Governo português, como é prática na política de diplomacia económica, empenhou-se na concretização desse projecto da mesma forma que se empenhou noutros, sem qualquer discriminação ou favorecimento.

É verdade que em Setembro de 2014 telefonou para o vice-presidente de Angola a interceder pelo Grupo Lena? Organizou ou tentou organizar um encontro entre as partes? Qual a razão?

Quanto ao telefonema para o vice-presidente de Angola, é verdade que, já neste último verão, vários anos depois de ter saído do Governo, num almoço com o meu amigo Carlos Santos Silva e um dos administradores do Grupo Lena, foi-me perguntado e pedido se podia diligenciar para que essa empresa fosse recebida pelo sr. vice-presidente de Angola. Acedi ao pedido por mera simpatia e fiz esse contacto com gosto, sem nenhum interesse que não fosse ajudar uma empresa portuguesa, como, aliás, fiz com outras.

Afonso Camões, então administrador da agência Lusa, admitiu que o avisou em Maio de 2014 que estava a ser investigado. Qual foi a sua reacção e o que fez com esta informação?

Tenho bem presente essa conversa com Afonso Camões. Na altura, reagi a ela com o desprezo e a indiferença que sempre me mereceram os boatos e os rumores. Não lhe dei mais importância que isso. No entanto, essa conversa ganha, hoje, outra relevância, tendo em conta o que entretanto se passou. Desejo contar essa pequena história mas quero fazê-lo, em primeiro lugar, no sítio próprio: no processo, já aberto, de violação do segredo de justiça. Tendo já comunicado à Sra. Procuradora Geral esta minha disponibilidade, aguardo que me convoquem para prestar declarações.

Mas não disfarcemos. O facto mais importante é a denúncia que Afonso Camões fez, que é gravíssima. Ela significa que, ao menos neste caso, as violações do segredo de justiça vieram precisamente daqueles a quem compete fazer justiça e aplicar lei.
Quanto às "fugas" mais recentes ao segredo de justiça - que continuam de forma sistemática, incluindo sobre o teor de escutas políticas que seria suposto estarem guardadas num cofre por serem irrelevantes para o processo... - já que me perguntam por factos, deixo aqui alguns:

1º facto: este processo está à guarda do Procurador e do Juiz.
2º facto: todas as "fugas" ao segredo de justiça, como se vê, têm sido favoráveis à acusação.
3º facto: um director de jornal escreveu expressamente num editorial que os jornalistas obtêm informações deste processo junto dos próprios responsáveis pela investigação.
4º facto: o jornal "Público", na sua edição do dia 20 de janeiro de 2015, na pág. 7, numa notícia sob o título "Director do JN foi à PGR falar sobre contactos com Sócrates", garantiu, preto no branco, que obteve informações sobre o conteúdo de certas escutas não junto da célebre "fonte conhecedora do processo", nem da enigmática "fonte judiciária", mas de "fonte judicial".

Quatro factos. Perante estes factos, o que me espanta mais é o silêncio. Este silêncio é verdadeiramente impressionante. Mas se pensam que o silêncio conduz ao esquecimento estão equivocados. Há questões graves demais para serem silenciadas.

O seu advogado, João Araújo, tem a convicção de que o procurador Rosário Teixeira e o juiz Carlos Alexandre foram fontes de informação de órgãos de comunicação social. Tem a mesma opinião? Baseada em que factos?

A questão das violações sistemáticas do segredo de justiça não pode ser dissociada da questão das minhas intervenções públicas. Sou obrigado a defender-me na praça pública porque é também na praça pública que estou a ser acusado e julgado. Era o que mais faltava que eu tivesse de assistir em silêncio à divulgação criminosa de informações manipuladas e objectivamente difamatórias sem fazer nada em defesa da minha honra e do meu bom nome. E não é só a violação do segredo de justiça, são as mentiras: malas de dinheiro que iam para Paris; o milhão descoberto num cofre que nunca foi meu; e agora um fundo que eu teria para "esconder" os imóveis que nunca tive. Tudo invenções e mentiras. E não aceito a confusão, completamente abusiva, entre a minha resposta às notícias difamatórias que são publicadas e um suposto "perigo de perturbação do inquérito", que também é invocado como fundamento para a minha prisão preventiva. Como se o inquérito fosse muito beneficiado com as "fugas" selectivas favoráveis à acusação e prejudicado pela apresentação de esclarecimentos favoráveis à defesa! Talvez o espanto não nos tenha, ainda, permitido apreciar a beleza da posição do Ministério Público: face a reiterados crimes de violação do segredo de justiça, de teor sempre favorável à acusação, parece que o Ministério Público acha que o que realmente perturba o inquérito é o exercício legítimo do direito de defesa da honra. Logo, a seguirmos esse raciocínio, a defesa do arguido é, em si, "perturbadora". Lindo! O ideal do Ministério Público será, portanto, o de um processo onde o arguido esteja em respeito, viradinho para a frente, sem se defender. Porque defender "é perturbar". E, antes de perdermos o pé nesta vertigem que nos obriga a viajar já tão para lá de tudo o que é aceitável na lealdade processual democrática, talvez convenha lembrar o nosso estimável Ministério Público que o que perturba, de facto, o inquérito são as constantes violações do segredo de justiça. Ora, nada disto é aceitável, sobretudo quando uma pessoa é constantemente bombardeada com estas "fugas" ao segredo de justiça. Sejam claros: só há verdadeira perturbação do inquérito, susceptível de justificar uma medida restritiva da liberdade, quando há um risco real e concreto para a produção ou conservação da prova, não quando o visado por notícias difamatórias vem a público prestar simples esclarecimentos, mesmo que possam incomodar a versão da acusação.

Em declarações anteriores confirmou que "face a algumas dificuldades de liquidez que atravessei em certos momentos (…) recorri várias vezes a empréstimos que o meu amigo Carlos Santos Silva me concedeu para pagar despesas diversas". A PGR disse, em comunicado, que o inquérito está a investigar "operações bancárias, movimentos e transferências de dinheiro sem justificação conhecida e legalmente admissível". Consegue justificar todos esses movimentos suspeitos? Tendo admitido dificuldades de liquidez, por que razão optou por um estilo de vida tão dispendioso?

Tínhamos de acabar aqui: no meu "estilo de vida", que dizem "dispendioso", na crítica de costumes e no julgamento moral que inspira desde o início toda a campanha do "Correio da Manhã" contra mim. Não admito, nem alimento, esses julgamentos. Nem sequer para comentar a mesquinhez dos que acham que é um "luxo" tirar um mestrado em Sciences Po ou ter filhos a estudar numa escola estrangeira.

Quanto aos movimentos financeiros alegadamente "suspeitos", já expliquei o essencial que havia a explicar: o engº Carlos Santos Silva fez-me empréstimos que sempre tencionei e tenciono pagar. Essa é a verdade e não constitui crime, nem aqui nem em lado nenhum do Mundo. Por outro lado, ao contrário do que se pretendeu fazer crer, não há nenhuma contradição entre a existência desses empréstimos e o outro que também contraí, e entretanto paguei, junto da Caixa Geral de Depósitos. Tal como o facto de ter tido dificuldades de liquidez num certo período da minha vida não significa que não tivesse um horizonte financeiro, pessoal e familiar, compatível com o meu nível de despesas. Mas, já agora, sem querer "perturbar" esta tão interessante discussão das várias teorias sobre a minha vida pessoal e financeira, talvez valha a pena recordar que estamos no âmbito de um processo criminal, que é suposto investigar crimes e sustentar-se em factos, não em opiniões sobre a vida dos outros. Por isso, pondo de lado as teorias, as presunções, a coscuvilhice e os julgamentos morais que têm enchido as páginas dos jornais e animado tantos comentários, e tendo eu já respondido a tantas perguntas, há talvez uma pergunta a que a acusação deveria nesta altura responder: afinal, onde é que estão as famosas "provas" ou os "fortes indícios" dos crimes que me imputam? E, ao certo, de que crimes concretos é que estamos a falar? É essa a resposta que falta. E, enquanto faltar, nem esta prisão preventiva se justifica nem este processo pode ter futuro.

Para além de preparar a sua defesa, como ocupa o tempo na cadeia?

A prisão é uma coisa séria e tenho sobre ela muita coisa a dizer. Mas deixemos isso para outra altura. Tenho demasiado respeito por quem aqui está para me entregar ao exercício "voyeurista" da descrição do quotidiano prisional. Deixemos isso para os "tablóides".

Tem recebido muitas visitas na cadeia. Sente, ainda assim, que alguns amigos se afastaram?

Não, não senti que os amigos se afastaram. Eles sabem da monstruosa injustiça que foi cometida e o seu significado político. Tenho comigo os meus amigos de sempre e os que sempre quis ter.




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Meu comentário:

NO COMENTS....

ANTÓNIO FONSECA


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