quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

OBSERVADOR - MACROSCÓPIO - 3 DE FEVEREIRO DE 2015

Macroscópio – Há mais mundo para além do futuro da Grécia‏

Macroscópio – Há mais mundo para além do futuro da Grécia

 
 
03-02-2015
 
 Grupos
Para: antoniofonseca40@sapo.pt



Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!
 
 
Hoje vou voltar a deixar a Grécia para segundo plano. Não que outros temas estejam a dominar a actualidade, mas porque o Macroscópio também deve chamar a atenção para outros temas que cruzam o debate público. Vamos a eles.
 
Caso BES
Não é propriamente sobre o caso BES, mas é sobre o BES. De facto o banco surgiu associado ao maior caso de corrupção no Brasil, o caso Lava Jato, numa entrevista do Público a Hermes Freitas Magnus, a testemunha-chave no processo. Leiam só uma das suas respostas:
Queriam que eu levasse para o Brasil dinheiro de contas do BES, no Porto. As contas eram dele [Janene], para lavar dinheiro em Portugal, mas ouvi dizer que estavam associadas a sociedades off-shore. Como não lhes levei a encomenda, eles pediram ao Enivaldo Quadrado [empresário brasileiro, condenado a três anos de prisão no caso "mensalão" e de novo detido, em 2014, no caso Lava Jato]. Ele acabou detido no Aeroporto de Cumbica, a 8 de Dezembro de 2008, com dinheiro não declarado escondido debaixo das roupas. 
 
Erros na prova dos professores
A famosa PACC vai continuar a dar que falar, até porque ontem saiu nova decisão judicial, desta vez desfavorável ao Ministério mas com pouco impacto prático porque incide sobre a prova do ano passado. Mais do que a guerrilha do dia-a-dia, importa pensar em todo o processo de formação e avaliação de professores. Uma interessante entrevista do responsável pelo organismo que realiza estas provas, o GAVE, fornece pistas interessantes, a começar pela que lhe dá título: “O sistema está muito feito de maneira a premiar a mediania&rdqu o;. Outra extrato, ainda a propósito de ter sido possível concluir licenciaturas e, depois, dar tantos erros de ortografia:
Têm que existir critérios que permitam monitorizar estes aspetos ao longo da formação dos professores e não só. Porque esta prova pode ser aplicada a qualquer grupo de profissionais, desde que sejam qualificados. Aliás, um aluno a partir da adolescência já com alguma consciência daquilo que é o pensamento lógico, eventualmente do ensino secundário, conseguirá responder a uma grande parte dos itens.
 
O estado do país
António Barreto deu este fim-de-semana uma entrevista ao jornal I, que este titula de forma forte: António Barreto como nu nca o viu. Há enorme desencanto nessa entrevista, e passagens tão fortes como esta:
Quais são os seus votos para 2015?
[…] em primeiro lugar alterar a Constituição, com um esforço comum a vários partidos, e/ou o sistema eleitoral. Em segundo, a reforma do Estado. Evidentemente que posso sempre acrescentar que gostaria de ver algumas pessoas presas.
Quem?
Não digo nomes, mas são alguns banqueiros, empresários, administradores de empresas, ex-ministros, ex-secretários de Estado, ex-directores-gerais... Gostava de os ver presos.
 
Regresso do anti-semitismo
As comemorações dos 70 anos da libertação de Auschwitz, que tiveram lugar há exactamente uma semana, chamaram a atenção para a persistência de vários fantasmas na Europa. Em especial o famtasma do anti-semitismo (hoje mesmo houve um ataque a uma comunidade judaica em Nive). Alguns artigos relevantes:
  • Jonathan Sacks, filósofo e académico do judaismo, publicou no Wall Street Journal um importante (e longo) ensaio intitulado The Return of Anti-Semitism. Na sua opinião, “violence and hatred against Jews is on the rise, especially in the Middle East and among Muslims in Europe”. Pequeno extrato: “Judeophobia in the Middle Ages led Christians to defeat in the Crusades. Anti-Semitism led Germany to self-destruction and moral shame. Today, anti-Semitism is a key ingredient in the p oisonous mix of ideas that has turned so much of the Middle East into a cruel state of nature, a war of “every man against every man,” as Thomas Hobbes memorably described it. Hate harms the hated, but it destroys the hater.”
  • No Washington Post, Richard Cohen escreve que Anti-Semitism is once again on the march in Europe. Um dos seus pontos é a contestação à ideia de que o anti-semitismo é uma consequência das políticas de Israel: “For at least 1,948 years, anti-Semitism both existed and thrived when Israel did neither. The pogroms of Europe — and the occasional ones of the Muslim Middle East — took place with no Israel in sight. (…) Anti-Semitism infected ancient Egypt, ancient Rome, the subtle mind of T.S. Eliot and the tinkering brain of Henry Ford way before any future Israeli had pushed around any future Palestinian. Anti-Semitism does not need a reason. It needs only an excuse.”
 
Guerra na Ucrânia e situação na Rússia
A situação na Ucrânia continua a agravar-se, como ainda sublinhou no Observador José Milhazes, num texto onde deixava a seguinte pergunta: A caminho de uma guerra grande ou de uma grande guerra? Dois historiadores que conhecem especialmente bem a Europa de Leste deixaram esta semana dois apelos angustiados aos líderes ocidentais:
  • Timothy Garton Ash escreveu no Guardian de forma muito clara: Putin must be stopped. And sometimes only guns can stop guns. O seu ponto é que “The time for diplomacy will come again, but it is not now: Ukraine urgently needs military support, and a counter to Russian propaganda”.
  • Anne Applebaum, escrevendo no Financial Times, deixa um apelo: Britain must hold Russia’s kleptocratic elite to account. Depois de recordar o assassinato de Litvinenko – um crime antigo, de há oito anos, mas que só agora está em fase de inquérito no Reino Unido –, defende a seguinte ideia: “If we are serious about halting the growth of a Russian regime (…), the best thing we can do is change this attitude. We should enforce our own laws, not only pursuing any alleged murder and treating Russian criminal cas es with the seriousness they deserve, but closing the loopholes and ending the accounting tricks that have helped enrich a kleptocratic elite”.
 
Decisões do Banco Central Europeu
Continuam a ser publicados textos muito interessantes sobre a decisão da semana passada do BCE. Um deles o de Nouriel Roubini, o guru que antecipou a crise 2008, no Project Syndicate,An Unconventional Truth. Eis uma parte dessa sua verdade: “In most advanced economies, for example, there is still a very large output gap, with output and demand well below potential; thus, firms have limited pricing power. There is considerable slack in labor markets as well: Too many unemployed workers are chasing too few available jobs, while trade and globalization, together with labor-sa ving technological innovations, are increasingly squeezing workers’ jobs and incomes, placing a further drag on demand.”
 
E, claro, o futuro da Grécia
Hoje apenas duas sugestões:
  • Há um trabalho para o qual gostaria de vos chamar especialmente a atenção: o especial de Nuno André Martins no Observador onde se procura responder a um dos paradoxos da actual situação: porquê que é que o preço da dívida grega é proporcionalmente baixo? É um texto que também ajuda a perceber tudo o que, apesar de todas as críticas, já foi feito para tornar mais leve o peso que Atenas tem de suportar. Trata-se de uma exposição com alguma tecnicidade, mas que ajuda a perceber porquê, apesar de de a Grécia “estar destacada na frente como o país com maior dívida pública, o custo para servir essa dívida (também em peso do PIB) não é proporcional. Segundo o Think Tank Bruegel, com uma dívida de 175% do PIB este ano, os encargos com essa dívida (juros principalmente) atingiriam os 4,3% do PIB grego, bastante abaixo dos 5% a pagar por Portugal para gerir uns eventuais 128% de dívida pública, e dos 4,7% da Itália também para uma dívida equivalente a 128% do seu PIB.”
  • Um outro texto a merecer referência é a análise de Gideon Rachman no Financial Times, Dangerous cracks at Europe’s centre. Eis o seu ponto de partida: “T here are three crises afflicting Europe. Two are on the borders of the EU: a warlike Russia and an imploding Middle East. The third emergency is taking place inside the EU itself — where political, economic and diplomatic tensions are mounting.”E o seu ponto de chegada: “Modern Europe has an economic and political resilience, as well as a bedrock of wealth, that was simply not there in the 1930s. All the same, the current atmosphere in the continent is as unstable and unpredictable as anything that I can remember in my adult lifetime.”
 
E agora algo totalmente diferente…
Quem segue a atualidade dos Estados Unidos e conhece um pouco da sua história sabe que o país, apesar de unido no patriotismo ou na forma como colectivamente vive uma Super Bowl, é imensamente diverso. É uma diversidade que vem da origem diferenciada dos emigrantes &n dash; mesmo misturados naquele imenso “melting pot” – mas também de tradições culturais, políticas e religiosas diferentes. As linhas divisórias não separam apenas o Norte e o Sul que se combateram na Guerra Civil, ou o Leste e o Oeste. São mais complexas e a Tufts Magazine resolveu propor uma leitura um pouco ao estilo das nações europeias, Up in Arms. O resultado está sintetizado neste mapa:



As novas nações teriam os seguintes nomes: YANKEEDOM; NEW NETHERLAND; THE MIDLANDS; TIDEWATER; GREATER APPALACHIA; DEEP SOUTH; EL NORTE; THE LEFT COAST; THE FAR WEST ; NEW FRANCE e FIRST NATION. Divirta-se a tentar perceber a lógica destas divisões, as quais ainda hoje explicam divisões como as da relações das opiniões públicas com as políticas de controlo do uso de armas.
 
Por hoje é tudo. Bom descanso e até amanhã.
 
 
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