No próximo sábado, dia 27, quando muitos portugueses ainda estarão a digerir as rabanadas, entra em vigor a requisição civil que abrange 70% dos trabalhadores da TAP. Uma requisição civil que, soubemos este fim-de-semana, talvez não fosse inevitável. Talvez o acordo com os sindicatos tivesse sido possível. Mas não foi e é bom saber o que se passou.
A história começou por ser contada, no essencial, aqui no Observador. De facto, apesar de tudo aquilo
que os sindicatos exigiram para parar a greve, na noite de quarta para quinta-feira o governo esteve reunido com os sindicatos e, como aqui lhe contámos, o
acordo só foi foi travado no último minuto pelos pilotos. De facto, “
surpreendendo até outros representantes sindicais, os pilotos voltaram a exigir que 10 a 20% das ações da TAP ficassem nas mãos dos sindicatos”. A possibilidade de ter chegada a um acordo nessa noite foi hoje também referido no Público, onde se escreveu que o “
Governo aceitou esperar por acordo com sindicatos para aprovar caderno de encargos da TAP”.
Uma parte do extraordinário deste processo é o papel desempenhado pelo porta-voz dos sindicatos, Paulo Lino Rodrigues, piloto, consultor mas não sindicalizado, e que a TAP e o Governo culpam por não haver acordo. Também é
contestado, na sombra de várias polémicas, de que demos conta. Eis um exemplo:
Esta semana, já depois de quebradas as negociações entre a Plataforma sindical e o Governo, começou a circular na empresa uma carta perguntando, à cabeça, “quem é o estratega da plataforma sindical?”. O texto, que reproduz depois o comunicado de outubro da lista derrotada ao sindicato, respondia assim à sua própria pergunta: “Um jornal identificou como estratega da Plataforma Sindical o piloto Paulo Lino Rodrigues. O Comandante Lino, como é conhecido, não é dirigente do SPAC, nem sócio sequer” – deixou de o ser em 2012, segundo dizia a lista derrotada. “Subordina a sua actividade a um único objetivo: ganhar (muito) dinheiro à custa do colegas”. Mas independentemente da história do processo negocial e de uma greve que ainda não sabemos como vai acabar, várias controvérsias atravessaram os últimos dias. Uma delas foi a suscitada por mais um manifesto, o que já nem devia ser novidade num país de tantos manifestos, um
manifesto contra a privatização da TAP. Promovido por António-Pedro Vasconcelos, já conta entre os seus subscritores com nomes como Manuel Alegre, Mário Soares, Miguel Sousa Tavares, Pedro Abrunhosa e Tony Carreira. Eis um extrato:
A primeira obrigação de um Estado soberano é assegurar a união, a coesão e a defesa da comunidade. E a manutenção de uma linha aérea que nos una ao universo da língua portuguesa é uma actividade soberana, tal como a defesa nacional ou a administração da justiça, numa palavra, a salvaguarda dos interesses nacionais, quaisquer que eles sejam e onde quer que eles se encontrem.Na mesma linha deste texto, destaque-se uma coluna da deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua,
A greve que protege os emigrantes e o país. Ainda no Expresso Miguel Sousa Tavares afirma que
Não há uma só razão para entregar a TAP (link para assinantes), o que parece ser contrariado algumas páginas mais à frente por João Vieira Pereira, que dá
7 razões para a TAP ser vendida (link para assinantes), começando por defender que “a privatização da TAP não é uma questão de ‘se’, é uma questão de ‘quando e a quem’".
Mas houve alguns textos com alguma virulência contra o manifesto anti-privatização.
António Costa, no Diário Económico, foi duro:
O manifesto contra a privatização da TAP foi apenas o último, mas não será seguramente o último, e prova que está a fazer falta um manifesto contra manifestos, sobretudo contra os que são indigentes e não trazem nada de relevante para a discussão a não ser a visibilidade de alguns dos seus subscritores e que têm mais atenção do que deveriam ter da comunicação social. Basta ler os manifestos do último ano para descobrir os profissionais e até quem os assine sem saber o que está a assinar. (…) O último, o da TAP, é apenas risível. Henrique Monteiro, no Expresso, não ficou muito longe na acutilância da formulação:
Os abaixo-assinados contra a privatização são iguais a meter a cabeça na areia. Quando a tirarem cá para fora e olharem para o céu, verão que a ideia de cada país ter a sua companhia magestática, do Estado, há muito acabou. O mundo muda e nem sempre as avestruzes dão por isso. Aqui no Observador também houve uma controvérsia, mas sobre a decisão política de ordenar a requisição civil. André Azevedo Alves abriu as hostilidades no sábado passado, com toda a frontalidade: “
Contra a requisição civil na TAP”. O seu argumento não é em defesa de uma TAP nas mãos do Estado, antes o argumento liberal de quem, mesmo discordando das motivações de uma greve, entende que realizá-la é um direito:
Pela violação da liberdade individual e pela coerção que implica, o recurso à requisição civil deve ser um último recurso e estritamente circunscrito a casos extremos. Ora, sendo certo que a greve convocada pelos sindicatos da TAP para o final do ano acarreta prejuízos económicos significativos e demonstra um total desrespeito pelos clientes e pelos contribuintes portugueses, é inverosímil sustentar que se trate de uma situação limite. Alexandre Homem Cristo não concordou e ripostou, também no Observador, esta segunda-feira: “
A requisição civil na TAP justifica-se”. Depois de deixar uma pergunta pertinente – “
Os pilotos querem uma fatia maior das acções da companhia. Agora expliquem-me de que modo é que essa pretensão, que impediu o acordo, é parte da defesa do interesse público?” – segue a recordar as circunstâncias precisas desta greve e considera que, “
tratando-se de uma companhia aérea, se isto não é um caso extremo, ao ponto de justificar uma requisição civil, é difícil de imaginar o que seria de facto uma situação extrema.”
Quanto à TAP, à sua greve e à sua requisição civil, por hoje é tudo. De resto, como estamos na reta final para a consoada, queria fazer minhas as recomendações do crítico de vinhos do Wall Street Journal que, em “
Get in the Christmas Spirits - The best warming winter spirits to keep chills at bay this holiday season”, sugere três vinhos para ficar à espera do Pai Natal sendo que, dessas três sugestões, duas são de vinhos portugueses. Ora tome nota:
Primeiro, um Madeira, o
Henriques & Henriques 15-Year-Old Verdelho:Madeira’s trick is pulling off the balancing act between sweetness and bright, invigorating acidity. This Verdelho from Henriques & Henriques achieves it quite brilliantly. It has an intriguing nose of dried fruit with a rich, nutty and figgy festive finish. Depois, um Porto, o
Taylor’s 40-Year-Old Tawny:
Tawny ports are aged in the cask rather than the bottle. This is a very special example which can sit on the sideboard for Christmas teatime and be sipped on special occasions. Tea-stained brown, it has an intense nutty nose, with a powerful, spicy, honeyed finish. Com esta sugestão final e os habituais desejos de boas leituras, despeço-me até amanhã.