Pessoa desaparecida
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Pessoa desaparecida é "todo ser humano cujo paradeiro é desconhecido, não importando a causa de seu desaparecimento, até que sua recuperação e identificação tenham sido confirmadas por vias físicas ou científicas" (definição dada pelo Inciso I do art. 2º da Lei brasileira nº 13.812,[1] de março de 2019).
Acerca do desaparecimento de pessoas ainda persiste uma máxima cultural errônea de que para que uma pessoa seja considerada desaparecida devem ser observadas 24 horas [ou 48 horas, 72 horas]. Essa noção foi nomeada pela Delegada Cristina Coeli, da Polícia Civil de Minas Gerais, como cultura perversa das 24 horas,[2] visto a grande importância das primeiras horas para a localização da pessoa desaparecida.
Causas de desaparecimento de pessoas
As causas do desaparecimento de pessoa são diversas, mas que podem ser agrupadas em dois grandes grupos: os desaparecimentos civis e os desaparecimentos criminosos.
O grupo dos desaparecimentos civis pode ser resumidamente definido como aqueles em quem a pessoa se ausenta do convívio social regular sem que haja a interferência de outrem. Exemplos de ocorrências deste tipo são:
- desaparecimentos voluntários - o ausente opta, deliberadamente, por romper os laços sociais regulares sem informar a ninguém acerca de suas intenções de fazê-lo;
- desaparecimentos involuntários - A ausência se dá por razões alheias à vontade do desaparecido, sem que tenha havido a ação deliberada de outro indivíduo. Enquadram-se nesta descrição os desaparecidos em razão de desastres naturais; os sujeitos com comprometimento cognitivo/psiquiátrico (deficientes, idosos em processo demencial, amnésicos, entre outros); perdas de destino e outras situações semelhantes.
Por sua vez, nos desaparecimentos criminosos há ação direta de um terceiro no desaparecimento, fazendo com que a ausência se dê contra a vontade da pessoa desaparecida. O agente que influi ativamente no desaparecimento não é o próprio ausente, nem condições psicológicas/orgânicas ou da natureza – é um outro sujeito que o faz deliberadamente. Grosso modo, os desaparecimentos criminosos também podem ser melhor especificados em duas formas:
- desaparecimento forçado ou político: definido pela Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado como "a prisão, a detenção, o rapto ou qualquer outra forma de privação de liberdade por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos agindo com a autorização, apoio ou aquiescência do Estado, e a subsequente recusa em admitir a privação de liberdade ou a ocultação do destino ou paradeiro da pessoa desaparecida, privando assim a pessoa da proteção da lei. Esta Convenção Internacional foi promulgada no Brasil pelo Decreto nº 8.767 de 11 de maio de 2016;[3]
- desaparecimento criminosos propriamente ditos, quando a ausência é causada por ação de agente civil – sequestros, ocultação de cadáver, cárcere privado, tráfico de pessoas, entre outros.
Impactos e consequências do desaparecimento de pessoas
Essa distinção entre os tipos de desaparecimento sustenta também uma distinção legal de sua ocorrência. Isto porque o desaparecimento de pessoa é, penalmente, fato atípico: a isto equivale dizer que não há tipo penal que defina sua ocorrência, havendo toda uma série de protocolos e prazos próprios para sua investigação, conclusão e prescrição. Naturalmente, a existência de crime modifica este status, conforme bem definido pela Polícia Judiciária Portuguesa[4]:
Este caráter “não-criminal” do desaparecimento de pessoas encontra-se entre os motivos apontados por diversos pesquisadores para a pouca atenção que as ausências civis recebem das instituições policiais e dos próprios agentes policiais. Exemplo típico é o esforço sempre presente, por servidores das mais diversas instituições, em protelar ao máximo o registro de desaparecimento de pessoa, por exemplo dizer ao “familiar [que] retorne apenas depois de 24 ou 48 horas, orientam que a própria família faça as buscas, ou mesmo dizem que isto não é problema da polícia e que já estão cheios de trabalhos ‘mais importantes’.”.[5] A despeito disso, o sofrimento causado pelo desaparecimento de um familiar ou amigo não é, sob nenhum aspecto, menos impactante por não existir indício prévio de crime:
Se consideramos a possibilidade de que um desaparecido seja uma pessoa morta, nossa atenção desloca-se para uma categoria inteira de indivíduos que, não estando diretamente atrelada à de pessoas desaparecidas, mantém com ela ligação muito próxima: a de pessoas desconhecidas. Trata-se de indivíduos, vivos ou mortos, cuja qualificação (nome, local de origem, familiares...) encontra-se prejudicada por qualquer motivo. Para o Conselho Nacional do Ministério Público,[7] ele é um:
Para o antropólogo Patrick Rezende,[8] cuja pesquisa de mestrado foi dedicada à relação entre pessoas desaparecidas e cadáveres não identificados (desconhecidos) em Belo Horizonte, a ligação entre uns e outros é ainda mais estreita:
Um corpo não identificado e que em vida foi dado como desaparecido é apenas uma possibilidade de solução de um caso de ausência, mas é uma solução (que será apenas o momento inicial de uma nova investigação, agora com o objetivo de esclarecer as condições que levaram o indivíduo a óbito). Entretanto, se os procedimentos de investigação de pessoas desaparecidas, principalmente no Brasil, ainda são precários, o cruzamento de informações com casos de pessoas desconhecidas ainda engatinham.
No Brasil
No Brasil, são principalmente seis os normativos legais que tratam do tema de pessoas desaparecidas:
- Lei nº 11.259, de 30 de dezembro de 2005,[9] determinou a obrigatoriedade da investigação imediata do desaparecimento de crianças e adolescentes;
- Lei nº 12.127, de 17 de dezembro de 2009,[10] que criou o Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Desaparecidos;
- Lei nº 12.393, de 04 de março de 2011,[11] que instituiu a Semana de Mobilização Nacional para Busca e Defesa da Criança Desaparecida (de 25 a 31 de março);
- Lei nº 13.812, de 16 de março de 2019.[1] Principal normativo nacional sobre a temática de pessoas desaparecidas. Deu contornos mais amplos ao tema, além de instituir a Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas e criar o Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas (sem recorte etário);
- Decreto nº 8.767, de 11 de março de 2016,[3] que promulgou no país a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado, assinada pela República Federativa do Brasil em 6 de fevereiro de 2007;
- Decreto nº 10.622, de 09 de fevereiro de 2021.[12] Responsável por operacionalizar a Lei nº 13.812, de março de 2019. Neste decreto, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) é designado, através da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), como Autoridade Central Federal (ACF) da Política; institui o Comitê Gestor da Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas (CG-PNBPDes), com a definição de seus participantes; descreve o rol de áreas de atuação da política; e estabelece as responsabilidade do MJSP para a implementação, coordenação e atualização do Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas, em cooperação com os entes federados.
A Lei nº 13.812, de 16 de março de 2019 define, no inciso I do artigo 2º, pessoa desaparecida como todo ser humano cujo paradeiro é desconhecido, não importando a causa de seu desaparecimento, até que sua recuperação e identificação tenham sido confirmadas por vias físicas ou científicas.
Ver também
- Desaparecimento forçado
- Lista de pessoas que desapareceram misteriosamente
- Desaparecidos políticos no Brasil
Referências
- ↑ ab «L13812». www.planalto.gov.br. Consultado em 12 de maio de 2021
- ↑ Maestro, Thiago Zacarias Del (2015). Perfil das crianças e adolescentes desaparecidas na região metropolitana de Belo Horizonte entre os anos de 2012 a 2014 (Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização lato sensu em Criminologia)). Belo Horizonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública - Universidade Federal de Minas Gerais
- ↑ ab «Decreto 8767». www.planalto.gov.br. Consultado em 6 de maio de 2021
- ↑ «Crianças e menores desaparecidos: Alguns procedimentos a adotar». Polícia Judiciária. 29 de setembro de 2008. Consultado em 7 de maio de 2021
- ↑ Oliveira, Dijaci David de (2007). Desaparecidos Civis: conflitos familiares, institucionais e segurança pública. Brasília: Departamento de Sociologia/ Instituto de Ciências Sociais/ Universidade de Brasília. p. 19
- ↑ COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA (2015). Convivendo com a ausência: Ajuda às famílias dos desaparecidos. Genebra: CICV. p. 6
- ↑ CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO (2018). Instruções gerais para a gestão do Sinalid. Brasília: CNMP. p. 8
- ↑ Rezende, Patrick Arley de (2012). Corpos sem nome, nomes sem corpos: Desconhecidos, desaparecidos e a constituição da pessoa. Belo Horizonte: Mestrado em Antropologia Social, Universidade Federal de Minas Gerais. p. 20
- ↑ «Lei 11.259». www.planalto.gov.br. Consultado em 6 de maio de 2021
- ↑ «L12127». www.planalto.gov.br. Consultado em 6 de maio de 2021
- ↑ «L12393». www.planalto.gov.br. Consultado em 6 de maio de 2021
- ↑ «D10622». www.planalto.gov.br. Consultado em 6 de maio de 2021
Ligações externas
Brasil
- Governo do Brasil - Serviços - Consultar pessoa desaparecida
- «Desaparecidos - Polícia Civil de Minas Gerais»
- «Pessoas desaparecidas». - São Paulo
- «Viver com a ausência: Ajuda às famílias dos desaparecidos»
- «É preciso esperar 24 horas para registrar um desaparecimento?»
- «Três ensaios sobre o desaparecimento de pessoas a partir de manifestações culturais»
- «Sobre desaparecimento de pessoas, adolescência e… machismo»